O cientista chinês que caiu em desgraça está proibido de entrar em Hong Kong

He Jiankui anunciou que tinha autorização para entrar em Hong Kong, onde iria investigar terapias genéticas para doenças raras. Mas o visto acabou por ser recusado devido a “falsos testemunhos”.

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O investigador He Jiankui alterou o ADN de duas bebés que nasceram em 2018 CHINA STRINGER NETWORK

O investigador He Jiankui, conhecido por ter editado os genes de dois embriões humanos em 2018, tinha anunciado no fim-de-semana que estava a considerar fazer investigação em Hong Kong. Tinha dito que lhe tinha sido concedido um visto de entrada no país, mas esta terça-feira foi revogado. O cientista chinês é acusado de ter mentido nos formulários de pedido de entrada no território, de acordo com o jornal South China Morning Post.

Em Novembro de 2019, o cientista surpreendeu todo o mundo com o anúncio dos primeiros bebés geneticamente modificados para resistir à infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH). He Jiankui foi condenado a três anos de prisão por falsificação de documentos sobre a ética da investigação e pela experiência científica com dois embriões (as gémeas Lulu e Nana, que nasceram em Novembro de 2018).

O anúncio dos primeiros bebés geneticamente modificados motivou um longo debate sobre a ética da modificação genética em humanos, considerada “absurda e altamente irresponsável” por Lluis Montoliu, investigador do Centro Nacional para a Biotecnologia espanhol (em Madrid) e presidente fundador da ARRIGE – Associação para a Investigação Responsável e Inovação na Edição do Genoma.

No início deste ano, He Jiankui anunciou a criação do Instituto de Investigação em Doenças Raras – nomeado como Laboratório He Jiankui –, um laboratório sem fins lucrativos que estará localizado num escritório em Pequim (China). O cientista chinês dizia que o intuito é desenvolver tratamento para doenças raras com origem genética em crianças e adultos (e não em embriões).

A entrada em Hong Kong tinha sido anunciada como parte de um programa local de atracção de trabalhadores qualificados estrangeiros para esta região administrativa da China, onde também pretendia investigar terapias genéticas para doenças raras. De acordo com declarações das autoridades locais, citadas pelo jornal The Guardian, foi lançada uma investigação criminal relativamente aos “falsos testemunhos” dados no formulário.

O secretário do Trabalho de Hong Kong, Chris Sun Yuk-han, referiu, segundo o jornal The Standard, que “os candidatos a este concurso para talentos não têm de declarar os seus antecedentes criminais”, pelo que ainda não existe uma informação oficial sobre o motivo desta recusa ou em que ponto He Jiankui terá mentido.

Silêncio no regresso à ribalta

Este ano, He Jiankui regressou às aparições públicas. Além da criação do seu instituto de investigação, o cientista chinês esteve também presente, via online, num encontro sobre bioética a 11 de Fevereiro, organizado pela Universidade de Kent (Reino Unido). Mas recusou aí a falar sobre as experiências realizadas em 2018 em embriões humanos, apesar de ter prometido que o faria.

O investigador chinês, como relata a revista Nature, tinha concordado em discutir questões relacionadas com a técnica de edição genética utilizada (CRISPR-9) e com a ética destas experiências. Ainda assim, numa publicação na rede social Twitter, He Jiankui afirmou que “não está pronto para falar da sua experiência nos últimos três anos”. No mesmo texto, o cientista cancelou a sua presença, em Março, na Conferência Internacional de Edição Genética.

Em Janeiro deste ano, numa entrevista ao jornal El País, He Jiankui não respondeu directamente às perguntas sobre as experiências realizadas em embriões humanos: “Aprendi que fiz as coisas muito depressa. As minhas próximas investigações serão transparentes e abertas a todo o mundo. Os avanços serão publicados nas redes sociais e existirá uma equipa internacional de cientistas que vai rever o nosso trabalho.”

Ainda na mesma entrevista, o investigador chinês afirmava que daria explicações sobre estas experiências que o tornaram famoso em congressos científicos ao longo deste ano – algo que não aconteceu na primeira oportunidade, na Universidade de Kent.

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