Descoberto estudo de Miguel Ângelo para a Capela Sistina
Desenho a giz vermelho mostra um homem de costas que coincide com uma das figuras representadas no famoso tecto do Vaticano.
Um desenho datado do século XVI, que mostra um homem nu visto de costas, pintado a giz vermelho, acaba de ser atribuído a Miguel Ângelo e identificado como um esboço feito pelo artista para o célebre fresco que pintou no tecto da Capela Sistina.
Comprado em 2014, numa transacção privada, por um coleccionador europeu que quis manter o anonimato, o desenho foi agora confirmado como um estudo preparatório de Miguel Ângelo para a sua monumental obra-prima por um dos mais reconhecidos especialistas na obra do pintor renascentista, Paul Joannides, professor emérito de História de Arte na Universidade de Cambridge.
O investigador irá em breve publicar as suas conclusões na revista académica Burlington Magazine, noticiou a jornalista Dalya Alberge no semanário dominical The Observer, título pertencente ao mesmo grupo que detém o The Guardian.
Joannides associou o desenho a uma secção final do fresco intitulada Adoração da Serpente de Bronze, na qual o artista representa várias figuras lutando com serpentes. Miguel Ângelo começou a trabalhar no tecto da Capela Sistina em 1508, mas este especialista está convencido de que o esboço poderá datar de 1512, tendo sido feito pouco antes de o artista concluir a sua gigantesca pintura, que cobre uma área superior a 500 metros quadrados e põe em cena mais de 300 figuras.
“Num artista com a grandeza de Miguel Ângelo, qualquer nova descoberta provoca alguma emoção, mas este é um estudo para uma das grandes obras-primas da arte ocidental”, comentou Joannides ao Observer. E a autora do artigo lembra que o pintor e arquitecto Giorgio Vasari, conhecido pelas suas biografias de artistas italianos, conta que Miguel Ângelo, com quem privou, destruiu pouco antes de morrer um grande número de desenhos e esboços para evitar que outros vissem os trabalhos que passou e as provas a que teve de submeter o seu talento até chegar a um resultado que considerasse satisfatório, “receando que pudesse parecer menos do que perfeito”.
O homem representado no esboço é mostrado a partir de uma perspectiva diferente na versão final pintada no tecto da Capela Sistina, explica Joannides ao Observer: “Olhando para o desenho, tenderíamos a assumir que a intenção era que víssemos a figura na horizontal. Mas não é assim. Deve ser vista rodando o papel 90 graus no sentido dos ponteiros do relógio”. Assim fazendo, e colocando lado a lado o esboço e a figura correspondente no fresco, “torna-se óbvio” que o primeiro é um estudo preparatório, diz ainda o especialista.
O desenho de 15,7 por 19,3 centímetros foi adquirido em 2014 como sendo da provável autoria do pintor maneirista Rosso Fiorentino. Mas o comprador, suspeitando de que pudesse tratar-se de um estudo para o fresco da Adoração da Serpente de Bronze, de Miguel Ângelo, fez chegar uma fotografia a Paul Joannides, que lhe atribui o crédito de ter sido o primeiro a intuir essa associação. Uma associação que ele próprio depois confirmou e precisou, identificando a figura em causa.
Desde sempre em mãos privadas, e por isso até agora desconhecido do público, o desenho ostenta marcas de alguns coleccionadores, que ajudam a rastrear o seu paradeiro, sobretudo ao longo do século XIX. Um carimbo atesta que pertenceu a dada altura ao coleccionador e mecenas inglês Chambers Hall (1786-1855), e as iniciais JCR sugerem que terá também passado pelas mãos do pintor e gravador John Charles Robinson (1824-1913), mais conhecido como coleccionador, professor de arte e curador.