Costa recusa qualquer inconstitucionalidade na posse administrativa de casas

Em entrevista à TVI, garantiu que os professores nunca terão a devolução de todo o tempo de serviço congelado porque o país não aguenta uma despesa anual permanente de mais 1300 milhões de euros.

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António Costa em entrevista ao Jornal das 8 da TVI Rui Gaudêncio

O primeiro-ministro recusa a existência de qualquer inconstitucionalidade na regra de o Estado poder tomar posse administrativa das casas que os senhorios não queiram colocar, por livre vontade, no mercado do arrendamento. "Não creio que haja inconstitucionalidade. As obras coercivas estão na lei há muitos anos e nunca foram consideradas inconstitucionais", apontou António Costa em entrevista ao Jornal das 8 da TVI sobre uma das medidas do pacote da habitação.

"Há falta de oferta de habitação. Não é legítimo ter casas vazias", argumentou o chefe do Governo, salientando que o Estado só pode tomar posse administrativa de um imóvel se o proprietário recusar arrendar a casa e ao fim de alguns anos não a tiver ainda colocado no mercado de arrendamento. "O Estado não lhe rouba a casa (...) Faz as obras, paga as rendas [ao dono], mas desconta-lhe as obras na renda", descreveu António Costa. “O Estado não lhe entra pela casa adentro sem mais”, exemplificou.

"Haveria inconstitucionalidade se o Estado ocupasse a casa, cobrasse a renda ao inquilino e não pagasse ao proprietário. Mas se fez obras tem que descontar no valor das rendas que lhe paga. Isso é legítimo."

Haverá mais de 700 mil casas desocupadas em Portugal e em muitos casos isso acontece porque os senhorios "não têm confiança para colocar a casa no mercado". "Nós arrendamos ao senhorio e subarrendamos, e as casas são atribuídas por sorteio", como acontece actualmente com a EPUL, em Lisboa.

Outra medida de apoio aos senhorios é a do pagamento da renda, pelo Estado, quando o inquilino falhar ao fim do terceiro mês consecutivo. "O senhorio vai ao Balcão [do Arrendamento] comunicar o caso" e o Estado passa a pagar ao senhorio e "entende-se com o inquilino" para cobrar esse valor. ​

Sobre medidas de combate à inflação como a fixação de preços defendida pelo PCP e Bloco, Costa disse não ser possível ao Governo, actualmente, determinar o preço máximo dos alimentos. A sua expectativa é que a taxa sobre os lucros excessivos acabe por obrigar a grande distribuição, que fica com uma considerável fatia do valor do que o consumidor paga, a baixar os preços. "Procurámos agir sobre as causas dos preços", vincou, lembrando as medidas sobre a energia, por exemplo.

Questionado sobre a possibilidade de haver IVA zero sobre os bens essenciais, o primeiro-ministro diz não ser "adepto" de tal solução uma vez que o exemplo espanhol mostrou que essa baixa foi acompanhada pelo aumento das margens da distribuição.

Perguntado sobre a possibilidade de uma repetição, este ano, dos cheques de apoio às famílias, António Costa conseguiu fugir à questão enumerando longamente os diversos subsídios dados pelo Governo em 2022, assim como os aumentos do salário mínimo e da função pública deste ano e ainda defendendo que "os aumentos deste ano já cobriram a inflação" do ano passado e que "nos últimos três meses a inflação tem vindo a desacelerar".

Contestação é compreensível

Sobre o aumento da contestação ao Governo nas ruas, Costa assumiu que a compreende porque a crise inflacionista perturba a vida de todos os sectores da sociedade. "Mesmo que haja esta ou aquela tentativa de aproveitamento partidário, as pessoas manifestam-se" porque têm sentido mais dificuldades na sua vida devido à inflação, admitiu, desvalorizando que os agitadores sejam o PCP e o Bloco. Aproveitou, no entanto, para dar uma "bicada" ao STOP, cujos dirigentes "foram expulsos do Bloco por radicalismo".

No caso específico dos professores, disse que estes profissionais "acumularam um caldo de frustração pelos motivos mais diversos" ao longo de muitos anos. Sobre o tempo de serviço congelado aos docentes de 2005 a 2007 e de 2011 a 2018, foi directo: "Não fui eu nem o meu Governo que congelámos a carreira dos professores. Nós descongelámos; pusemos o relógio a contar. (...) O que contámos para os professores foi o que contaram para os outros."

País não aguenta factura anual de mais 1300 milhões

À pergunta sobre se vão ou não reaver todo o tempo de serviço congelado disse que essa resposta "não é de sim ou não". "E, se tiver que ser, então é não." Porque a factura é demasiado elevada: "Eu não vejo que o país tenha condições para acrescentar 1300 milhões de euros de despesa anual permanente para todo o sempre", argumentou. E já faz contas: "No final deste ano temos que tomar a decisão se para o aumento dos pensionistas o país consegue incluir mil milhões de euros..."

Costa não respondeu ao desafio de Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, para se sentar, pessoalmente, à mesa das negociações. "Quando o ministro da Educação se senta com os sindicatos, sou eu e o ministro das Finanças e todo o Governo que nos sentamos ali também", afirmou, desvalorizando o facto de as tentativas de acordo terem falhado sucessivamente. "A minha obrigação não é chegar a acordo com os sindicatos; é resolver os problemas dos professores", afirmou o primeiro-ministro.

Ainda sobre as polémicas que têm assolado o executivo nos últimos meses, Costa recusa que tenha perdido a mão no Governo ou que se tenha deixado relaxar com a maioria absoluta. Mas também não garante que o executivo esteja "blindado" a novos "casinhos". "Nem um tanque com o maior grau de blindagem está a salvo de incidentes."

Daí que também admita que "seria milagre que [os portugueses] fizessem apreciação muito positiva" nas sondagens tendo em conta a crise e as imagens de contestação na rua. Mas recusou que se possa usar o termo "desorientação" para falar do Governo porque a mudança de ministros não tem correspondido à mudança de políticas, dando como exemplo a Saúde. Ou que o nível de contestação possa ser "perigoso" para o seu futuro político.

"Não gosto de greves nem gosto de me ver com um lápis espetado num olho, mas o direito à greve é legítimo." Admite-se, no entanto, "preocupado" com os movimentos da extrema-direita e a acção do Chega. "Acho perigosa (...) a forma como esses movimentos condicionam a direita democrática. Mas acredito que o eleitorado de base do PSD não admita uma deriva.”

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