Governo justifica contratação de activista pela sua experiência em inovação social
Inês Franco Alexandre foi contratada para técnica especialista do Ministério do Trabalho já depois de defender uma manifestação na Ponte 25 de Abril para alertar para os problemas da habitação.
O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) contratou Inês Franco Alexandre como técnica especialista junto do ministério tutelado por Ana Mendes Godinho, sabe o PÚBLICO, já depois de a assumida activista e empreendedora social ter defendido publicamente a ocupação da Ponte 25 de Abril como forma de protesto contra os problemas da habitação em Portugal. A sua nomeação pelo Governo não foi ainda publicada em Diário da República (sendo que a publicação pode demorar cerca de 10 dias após a nomeação) nem consta das nomeações feitas pelo MTSSS no site do executivo.
Inês Alexandre revelou esta semana na sua conta de Linkedin que ocupa agora o cargo de assessora para a Inovação no gabinete da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, acrescentando ter iniciado funções já no presente mês de Fevereiro. Porém, o PÚBLICO apurou que Inês Alexandre foi contratada como técnica especialista (com direito a um salário bruto mensal de 3732 euros), sendo que o despacho para início de funções é de 1 de Fevereiro. Ao que foi ainda possível apurar, a escolha baseou-se na sua experiência na área da inovação social.
Em entrevista ao programa A Minha Geração, da Antena 3 e RTP, realizada a 13 de Janeiro, Inês Alexandre, apresentada como "activista e empreendedora social", questionada sobre uma eventual manifestação na Ponte 25 de Abril, começa por dizer "de todo que não". Mas depois admite a hipótese: “Isso pode ser parte da resposta, claramente. Acho sempre que fazer barulho é parte das respostas”, responde, acrescentando que é preciso ser "inteligente" e “fazê-lo de forma organizada, segura”.
Já depois desta resposta pouco clarificadora, num vídeo promocional do programa, Inês Alexandre sugere que seja feita uma ocupação da ponte de 25 de Abril, em Lisboa, como forma de protesto para chamar a atenção para o problema da habitação: “Temos de ir todos para a Ponte 25 de Abril, fechar a ponte. Acampamos todos e fechamos a ponte até sermos ouvidos.”
A este propósito, a auto-intitulada assessora de Ana Mendes Godinho sugere que uma grande superfície comercial especializada em artigos desportivos patrocine tal manifestação, garantindo tendas para os manifestantes que, segundo disse, não se ficariam só à entrada da ponte. Assume ainda querer ser "empreendedora no mundo da política” por considerar que a "mudança se faz dentro do sistema”. E à pergunta sobre se um dia será ministra, responde: "Não sei."
O PÚBLICO questionou o ministério de Mendes Godinho sobre se a ministra se revê naquelas declarações mas não obteve resposta.
Licenciada em Psicologia do Desporto e com mestrados em Psicologia pela Universidade de Lisboa e em Desporto Adaptado pela Universidade do Porto, a agora técnica especialista em inovação social considerou também que “é muito mais interessante a mudança ser de dentro para fora” ou que, pelo menos, assim “é muito mais efectiva".
"Acho que tenho de passar por esta experiência para perceber se este contexto é a minha praia ou não.” “Quero continuar a ser empreendedora dentro do mundo da política. Isso é mega importante e continuar a ter voz”, continuou Inês Alexandre, que liderou a associação juvenil do Movimento Transformers entre 2019 e 2021.
No seu percurso profissional, Inês Alexandre conta foi gestora de projecto da Conferência Europeia de Juventude da Presidência Portuguesa da União Europeia, formadora do IES – Social Bussiness School e fundadora e CEO da consultora They-Lab. Foi ainda considerada uma das 100 jovens portuguesas mais influentes no projecto 100 oportunidades dos Global Shapers.
Aquelas declarações surgem a poucos dias de o Governo de António Costa apresentar um novo pacote legislativo sobre habitação que será aprovado na próxima quinta-feira, num Conselho de Ministros exclusivamente destinado ao tema e já depois de, na sequência da demissão de Pedro Nuno Santos, o primeiro-ministro ter autonomizado o Ministério da Habitação.
O semanário Expresso adianta na edição desta sexta-feira que uma das medidas que fará parte deste pacote legislativo é um “mecanismo permanente de apoio à renda” para jovens e famílias com uma quebra abrupta de rendimentos seja por desemprego, divórcio ou doença.
Em Junho de 1994, o bloqueio à Ponte 25 de Abril por camionistas ficou para a história como um dos momentos de maior contestação social no pós-revolução e que contribuiu para desgastar o Governo de Cavaco Silva na sua fase final.