EUA dizem que balões chineses sobrevoaram alvos militares em todo o mundo

Programa de espionagem com balões de grande altitude foi lançado “há vários anos”, segundo o Pentágono. EUA já começaram a partilhar a informação de que dispõem com dezenas de países aliados.

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O balão foi abatido ao largo da costa Este dos EUA EPA/US Navy/Mass Communication Specialist 1st Class Tyler Thompson

O balão chinês que atravessou grande parte do território dos Estados Unidos na semana passada — e que sobrevoou instalações de mísseis balísticos intercontinentais no estado do Montana — faz parte de um programa mais vasto, em curso "há vários anos", que a China lançou para melhorar a sua capacidade de recolha de informação sobre alvos militares em todo o mundo, avança o Pentágono.

Numa conferência de imprensa, o porta-voz das Forças Armadas dos EUA, o brigadeiro-general Patrick S. Ryder, confirmou notícias, avançadas nos últimos dias pelos principais jornais norte-americanos, sobre a verdadeira dimensão do programa chinês de espionagem com balões de grande altitude — ao qual o Governo de Pequim estará a dedicar mais atenção do que se pensava nos EUA antes de 2021, segundo o Departamento de Defesa e a Casa Branca.

No início da semana, o responsável militar pela segurança do espaço aéreo no Norte dos Estados Unidos, o general Glen D. VanHerck, disse que identificou "uma falha na consciencialização" das Forças Armadas norte-americanas para a presença de balões de espionagem chineses em território dos EUA até 2020.

Segundo o conselheiro de Segurança Nacional norte-americano, Jake Sullivan, foi um investimento feito pela Administração Biden no estudo dos balões chineses — a partir de Janeiro de 2021 — que permitiu perceber, nos últimos dois anos, que pelo menos três balões de espionagem chineses sobrevoaram território dos EUA durante a Administração Trump sem terem sido detectados pelo Comando de Defesa Aeroespacial da América do Norte (o NORAD, na sigla em inglês), como reconheceu, na terça-feira, o brigadeiro-general Patrick S. Ryder.

Nesta quinta-feira, o jornal New York Times avança que os balões de espionagem chineses já sobrevoaram instalações militares de vários países em múltiplos continentes, com um foco nos aliados dos EUA na Ásia-Pacífico — incluindo o Japão e as Filipinas —, mas também a Índia e países em outros pontos do globo.

Na segunda-feira, o Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês reconheceu que um segundo balão, detectado a sobrevoar a América Latina no fim-de-semana passado, também é seu; tal como no caso do balão que sobrevoou os EUA entre 28 de Janeiro e 4 de Fevereiro, Pequim afirma que se trata de um aparelho de uso civil para investigação meteorológica, desviado da sua trajectória por efeito dos ventos.

Na terça-feira, o Washington Post noticiou que o epicentro do programa de espionagem com balões de grande altitude é a província chinesa de Hainan — uma ilha situada no Mar do Sul da China, do tamanho aproximado da região do Alentejo e com dez milhões de habitantes. Segundo o Post, o programa é gerido pelo Exército da Libertação do Povo.

"Os chineses pegaram numa tecnologia incrivelmente antiga e casaram-na com comunicações e métodos de observação modernos para tentarem recolher os segredos da capacidade militar de outros países", disse um dos responsáveis do Governo norte-americano que são citados, sob anonimato, pelo jornal.

Aliados informados

O impacto do programa chinês levou a vice-secretária de Estado dos EUA, Wendy Sherman, a convocar uma reunião por vídeo-conferência, na segunda-feira, com 150 responsáveis de quatro dezenas de embaixadas. Ao mesmo tempo, o Departamento de Estado enviou informação nova sobre os balões chineses a todas as suas embaixadas, para que possa ser partilhada com os aliados e parceiros dos EUA a qualquer momento.

"Fazemos isto [a partilha de informações] porque os Estados Unidos não foram o único alvo deste programa mais abrangente, que violou a soberania de países em cinco continentes", disse o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, numa outra conferência de imprensa na quarta-feira.

O New York Times avança também, nesta quinta-feira, que o jornal do Exército chinês já fazia referência ao potencial uso militar de balões de grande altitude no início de 2020.

Num dos artigos publicados nessa altura, em Fevereiro de 2020, lia-se que a altitude a que estes balões podem voar — a mais de 20 quilómetros da Terra, muito acima do tráfego aéreo, e de forma muito mais lenta do que os satélites — tornou-se "num novo campo de batalha na guerra moderna".

Os balões de grande altitude "são um poderoso olho nos céus que alcança alvos a baixa altitude e no solo", lê-se num outro artigo publicado no jornal chinês em Dezembro de 2021. "No futuro, estes balões poderão tornar-se num assassino silencioso e cruel, à semelhança dos submarinos."

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