Parlamento recebeu 163 pedidos para repor freguesias. Calendário por clarificar
Período especial para reverter “Lei Relvas” pode acrescentar 206 freguesias às 3091 actuais. Comissão parlamentar criou grupo de trabalho para verificar critérios.
A Assembleia da República (AR) recebeu 163 pedidos de separação de freguesias no âmbito do período especial de reversão da “Lei Relvas”, que em 2013 fundiu centenas destas pequenas autarquias. Se todos os processos forem aprovados, haverá um acréscimo de 206 freguesias à lista de 3091 actuais. Mas ainda não é claro que todos passem o crivo do parlamento, a começar pelo prazo de entrega, sobre o qual ainda há dúvidas.
A lei 39/2021, que desenha a criação, modificação e extinção de freguesias, estabeleceu um período especial para desagregar as uniões criadas pela reforma dos tempos da troika. Essa janela, que se abria durante um ano, tinha data para fechar a 21 de Dezembro de 2022. Foi nesse âmbito que chegaram os 163 processos à Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local, na AR, embora nove dos pedidos tenham já chegado depois do prazo.
No entanto, há leituras diferentes da lei e desse mesmo prazo. O presidente da Associação Nacional de Freguesias (Anafre), Jorge Veloso, levantou a dúvida mesmo antes do fim do prazo: 21 de Dezembro poderia ser a data para começar o respectivo processo na junta de freguesia e não a data para que ele dê entrada no parlamento. O também presidente da União de Freguesias de São Martinho do Bispo e Ribeira de Frades, em Coimbra, mantém a dúvida e diz ao PÚBLICO que está à esperar que a comissão parlamentar forneça dados à Anafre para que a associação decida que passos dar a seguir.
É que, a pedido da União de Freguesias Bustos, Troviscal e Mamarrosa (Oliveira do Bairro), a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) debruçou-se sobre o diploma e respectivo período especial. No parecer, a CCDR conclui que “resulta claro da lei que este procedimento especial tem de ser iniciado necessariamente até 21 de Dezembro de 2022, mas não que o mesmo tenha de ser concluído até essa data”.
Caso esta interpretação vingue, a comissão parlamentar presidida por Isaura Morais (PSD) poderá admitir os 9 processos que chegaram à AR já depois de 21 de Dezembro. As portas também estarão abertas aos casos que ainda não chegaram à AR e que foram desencadeados antes desse dia, como o da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho, em Loures, que, no dia 29 de Janeiro, organizou uma consulta popular que estava já marcada desde 6 de Dezembro. A separação ganhou com 87% dos votos. Este foi o segundo referendo, depois de, em Agosto, o “sim” à separação também ter ganhado na União de Freguesias de Barroselas e Carvoeiro, em Viana do Castelo.
Grupo de trabalho criado
Para já, explica a deputada Isaura Morais ao PÚBLICO, foi criado um grupo de trabalho que vai filtrar os processos que chegaram ao parlamento. A presidente da Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local reconhece que o prazo estabelecido na lei levanta dúvidas e aguarda uma proposta do grupo de trabalho para tomar uma decisão. “Tudo o que não estiver clarificado e que levante dúvidas terá que ser esclarecido e clarificado”, nota.
O grupo, que começou o trabalho na semana passada, é dirigido pelo deputado Pedro Cegonho (PS) e formado por um membro de cada partido. Cegonho explica que essa primeira reunião serviu apenas para solicitar recursos humanos para “começara a fazer a verificação” dos pedidos que deram entrada e ver se se encaixam nos critérios da lei. “Quando os técnicos estiverem a fazer o saneamento dos quesitos dos pedidos, suscitarão essa questão” dos prazos, refere.
Independentemente da decisão sobre o período especial, recorda Isaura Morais, há um outro prazo à vista. A lei determina que não se pode criar freguesias durante os seis meses que antecedem quaisquer eleições a nível nacional. O próximo acto eleitoral é já em 2024, para o Parlamento Europeu.
Uma vez que há várias dúvidas, o governo tem falado em “afinar” a lei, mas isso ainda não aconteceu. No entanto, o Ministério da Coesão Territorial ainda não deixou cair a ideia e “mantém a intenção de propor à AR a introdução de diversas alterações ao diploma”, refere ao PÚBLICO.
Quem já avançou foi o PCP, que, logo em Dezembro, apresentou um projecto de lei para simplificar o processo e alargar o prazo em um ano. No entanto, a proposta continua a não ter qualquer data agendada para debate em plenário da AR.
Para já, estão em causa 163 processos. Olhando para o mapa do país, Porto (27) e Braga (25) são os distritos com mais processos desencadeados. Na outra ponta da tabela estão Bragança (1), Vila Real e Portalegre (ambos com 2).