O plástico pode ser reciclado mais do que uma vez?

A reciclagem do plástico é importante para a economia circular. Mas há várias limitações neste processo dependendo do tipo de material e das condições da reciclagem.

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Antes de ser reciclado, o plástico passa por uma triagem Goncalo Portugues

A economia circular permite reduzir o uso de nova matéria-prima. A reciclagem é um dos meios para isso e o caso do plástico é paradigmático. Ao fabricarem-se objectos a partir de plástico reciclado evita-se o uso de plástico novo e o risco do plástico ser descartado para o ambiente, poluindo-o.

Mas esta nem sempre é uma equação fácil. Há muitos tipos de plástico e de objectos que contêm plástico, desde embalagens, passando pela roupa, até ao material de construção. Nem todos são recicláveis. Por outro lado, nem sempre o plástico reciclado pode ser usado para as funções originais.

Por isso, mesmo que um tipo de plástico seja reciclado mais do que uma vez, isso não impede que seja necessário introduzir nova matéria-prima no ciclo. Neste artigo, tentamos responder a algumas questões sobre o ciclo do plástico.

O que é a reciclagem de plástico?

Há diferentes formas de reciclar plástico, mas em Portugal a técnica que se usa é a reciclagem mecânica. Começa por um processo de triagem. “O plástico tem de ser reciclado polímero a polímero”, explica Susana Fonseca, que pertence à Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável. Ou seja, diferentes tipos de plásticos têm de ser reciclados separadamente para se obter o material puro.

Durante a triagem, são separados os diferentes objectos compostos por diferentes tipos de plástico. A seguir à triagem começa a reciclagem mecânica. “O plástico começa no processo de trituração e, já em flocos, passa para o processo de lavagem, muito semelhante ao lavar a roupa em nossas casas”, explica a Sociedade Ponto Verde, que respondeu a uma série de perguntas colocadas pelo PÚBLICO sobre este tema.

A lavagem é importante para remover substâncias que tenham contaminado o plástico desde que os objectos são descartados até chegarem aos centros de reciclagem e permite também a separação de plásticos por densidade.

A seguir à lavagem vêm as fases de centrifugação e secagem. Depois, o material passa para outro equipamento onde acontece a fase de extrusão. Ou seja, o plástico funde-se numa única pasta que se mistura e que, depois, é transformada num granulado. É este granulado que é embalado e vai para as fábricas onde pode voltar a ser usado.

Todos os tipos de plásticos podem ser reciclados?

“Na área das embalagens, todos os plásticos podem ser reciclados”, responde a Sociedade Ponto Verde. Mas como são reciclados e quais os fins dependem de cada um.

O polietileno (conhecido como PE), o plástico mais simples do ponto de vista da sua química, usado para fabricar sacos de plástico, o politereftalato de etileno (conhecido como PET), para fabricar as garrafas de bebida, o polipropileno (conhecido como PP), que se usa em recipientes, boiões e frascos, e o poliestireno (PS) expansível, vulgo esferovite, são quatro tipos de plástico que são reciclados isoladamente.

Os três primeiros tipos de plástico são muito consumidos, compõem vários produtos de uso rápido, que se descartam, o que torna vantajoso serem reciclados. O quarto tipo, a esferovite, como ocupa muito volume, é também reciclada isoladamente. Portanto, aqueles plásticos seguem a sequência descrita na resposta acima, obtendo-se de novo o material puro.

Por outro lado, o poliestireno, usado para fabricar capas de CD e copos de iogurte, o policloreto de vinilo (conhecido por PVC), usado em materiais de construção, e o plástico policarbonato não são reciclados separadamente. “É apenas por uma questão de quantidade, pois isoladamente, estes podem ser reciclados se houver quantidades mínimas que o justifiquem”, explica a Sociedade Ponto Verde.

Em vez disso, aquele material junta-se no plástico misto, juntamente com embalagens que têm várias camadas, como os pacotes de massas e pacotes de batatas fritas, e outros objectos como cabides e vasos de plantas.

O que acontece ao plástico misto?

Este material é reciclado em conjunto e pode ser usado para várias finalidades: a produção de mobiliário urbano, em madeira plástica, em passadiços e bancos de jardim.

Apesar de este material ser de facto reciclado, perde valor enquanto matéria-prima, já que não se obtém o material puro e dificilmente volta a ser usado para a sua função original.

Quais os plásticos que podem ser reciclados mais do que uma vez?

“Todos os termoplásticos, como o PE, PET, PVC ou PS, podem ser novamente fundidos e remoldados. São os tipos de plásticos mais consumidos”, explica a Sociedade Ponto Verde. Mas a questão é mais complexa.

No caso do material usado para produzir garrafas de plástico, o famoso PET, há marcas como a Vitalis e a Serra da Estrela que utilizam 100% de PET reciclado na produção de novas garrafas, o que faz com que o ciclo se feche neste caso. A garrafa de plástico é usada, é descartada, é reciclada e o plástico volta a ser usado para produzir a garrafa reiniciando o ciclo.

No entanto, nem todo o PET reciclado volta a ser usado para as garrafas. Muitas vezes acontece um “downsizing”, explica por sua vez Andreia Sousa, investigadora na área da química dos polímeros do Ciceco – Instituto de Materiais de Aveiro. Ou seja, há uma depreciação do material. O plástico “passa de uma garrafa para um têxtil e isto já não vai acontecer mais nenhuma vez porque a camisola não vai ser reciclada”, explica a investigadora. Aqui batemos contra uma parede: os limites da tecnologia actual de reciclagem. Neste caso, o plástico não pode ser mais reciclado.

Mas, em teoria, o plástico pode ser reciclado para sempre?

Há um problema. O processo de reciclagem mecânica tem limites. “Em cada ciclo de reciclagem há perda de propriedades”, explica Andreia Sousa. Ao aquecer-se e fundir-se o material, este perde peso molecular. Ou seja, as cadeias de polímeros constituintes do plástico quebram-se, o que altera as suas propriedades mecânicas.

O plástico pode perder resistência, alterar a cor por causa dos aditivos que existiam e deixar de cumprir a sua função a 100%. “Há estudos que dizem que a partir de um determinado número de ciclos, deixa de ser possível reciclar-se”, adianta Andreia Sousa.

E há mais algum tipo de limitação?

Sim. É preciso não esquecer que no caso das embalagens de plástico o material entra em contacto com os alimentos. Por isso, o cuidado é redobrado. O PET é “o único plástico autorizado a ser reciclado e a voltar a ser usado para alimentos”, adianta Susana Fonseca. Os outros tipos de plástico podem ter estado em contacto com substâncias nocivas para a saúde, durante o ciclo de reciclagem que viveram. Só no caso do PET é que se consegue garantir que não haja nenhuma contaminação.

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Separação do plástico em Pequim, na China KIM KYUNG-HOON/REUTERS

Este factor obriga, mais uma vez, a direccionar plásticos como o polipropileno, com que se produz boiões e frascos, para outros usos. Mais uma vez, recicla-se, mas não se fecha o ciclo, obrigando ao uso constante de matéria-prima virgem para se fabricarem aqueles objectos. “A gestão de plásticos na pós-vida é um processo complexo. Tem que ser pensado a montante, desde o design, o material e a cor do produto, e a jusante, quem separa, como se separa, que energia é gasta na separação”, defende por sua vez Andreia Santos.

No caso dos plásticos mistos, também podem ser reciclados de novo?

“Sim, o objectivo é reforçar esta circularidade”, responde a Sociedade Ponto Verde. “É o que sucede com este plástico misturado que pode voltar a ser incorporado em nova madeira plástica.”

Quais são os plásticos que não podem ser, de todo, reciclados?

Os plásticos termoendurecíveis não podem ser nunca reciclados. Estes plásticos são fabricados num único ciclo térmico e atingem uma forma definitiva. Se voltam a ser aquecidos, degradam-se. As melaminas de plástico, usadas para as bancadas de mesa, são um exemplo de plásticos termoendurecíveis.