Alpine A110 R: uma “pena” que se cola ao alcatrão
Com 300cv a puxar por apenas mil quilos de peso, a versão mais radical da marca desportiva do Grupo Renault chega a Portugal em Abril por 105 mil euros.
Chegar a um autódromo que não se conhece, entrar num desportivo pela primeiríssima vez e receber a ordem: “Prego a fundo.” A confiança na Alpine é grande para valer a pena correr o risco.
Foi exactamente assim o nosso primeiro contacto com a nova versão A110 R, apresentada aos jornalistas na semana passada no circuito de Jarama, nos arredores de Madrid. Umas voltas na pista e uma hora e meia em estrada serviram para dar a conhecer a quarta versão do desportivo francês, um carro potente com motor de 1,8 litros turbo a debitar 300cv e 384Nm de binário máximo para apenas 1082 quilos de peso, combinação que permite ao Alpine A110 R fazer 3,9 segundos dos 0-100km/h e atingir uma velocidade máxima de 285km/h.
Este é um carro feito para ser um brinquedo de pista, capaz de curvar com a rapidez com que acelera. Para isso contribui uma generosa asa, que aplica a força descendente necessária para que a tracção traseira faça o resto. E esse “resto” resulta num carro muito fácil de conduzir, inclusivamente em pista. O Alpine A110 R é um automóvel equilibrado que não precisa de um piloto para ser divertido.
Boa parte do segredo está na rigidez do chassi, que permite atirar o carro para a curva com a confiança de que vamos sair dela na trajectória definida. A direcção é precisa, também graças à distribuição de peso e ao equilíbrio aerodinâmico. Os pneus Michelin Pilot Sport CUP 2 e os poderosos travões da italiana Brembo reforçam a confiança e perdoam abusos.
A Alpine cortou no que conseguiu para tornar o carro muito leve, nomeadamente usando e abusando da fibra de carbono. Um exemplo: as jantes de 18 polegadas, totalmente feitas neste material, levantam-se sem dificuldade com uma mão — pesam menos 12,5kg face as que equipam o modelo A110 S.
Por dentro, o novo Alpine é espartano, mas com um toque luxuoso. Inteiramente revestido em tecido microfibra, não tem comodidades habituais, como compartimento nas portas ou porta-luvas — existem uma rede e uma bolsa fechada atrás, onde cabe pouco mais que uma garrafa de água. Puxadores nas portas também não há; no seu no lugar, cintas vermelhas. Outro pequeno (grande) pormenor: não existe espelho retrovisor.
Os dois bancos são feitos numa só peça de fibra de carbono, não têm ajuste em altura (para poupar peso) e os cintos de segurança da Sabelt têm seis pontos de fixação — muito pouco práticos para trocas de condutor.
A caixa automática de sete velocidades permite uma condução suave em baixas rotações, mas mesmo em modo normal (Drive) a resposta do acelerador é pronta e rápida.
Tal como em pista, o Alpine A110 R porta-se muito bem em estrada, mas não é um automóvel confortável para fazer longas distâncias. A suspensão é rija e as dores lombares aparecem ao fim de algum (pouco) tempo. Além disso, é ruidoso, não tanto pela localização do motor (central, posicionado mesmo atrás das costas), mas pelo rolamento, que obriga a projectar a voz para manter a conversa, mesmo a velocidade moderada.
Quem compra um A110 R não o fará a pensar em viagens, nem tão-pouco terá grandes preocupações com o preço da gasolina, mas a verdade é que o consumo em estrada, apesar de superior ao anunciado, não nos pareceu excessivo: conseguimos uma média de 8,5l/100 em trajecto misto.
Este desportivo francês não é um carro para massas, antes um brinquedo para quem gosta de curvas rápidas e, de preferência, para quem tem oportunidade de desfrutar do alcatrão liso de um autódromo.
A Alpine já vendeu 78 carros em Portugal e tem duas encomendas feitas para o novo A110 R, que chega em Abril por 105 mil euros.
A beleza do ruído
O som de um automóvel não é, nos dias que correm, produto directo da combustão do motor; ele é “desenhado” para servir um propósito, um compromisso entre a legalidade (o nível de ruído está regulamentado) e a sensação de conforto e presença. É aquilo a que se chama “assinatura sonora”.
O PÚBLICO conversou com Louis Jeane, especialista em acústica da Alpine e um dos responsáveis pela concepção do som do A110 R — foi um dos vários engenheiros que estiveram presentes no autódromo para a apresentação internacional —, que nos explicou que foram adicionados elementos para robustecer o som natural do bloco 1,8 de quatro cilindros.
Dois exemplos: a ponteira de escape de dupla saída em aço inoxidável é impressa em 3D e tem uma curvatura precisa para afinar o som grave e poderoso do desportivo (que faz “pops”); além disso, tem duas camadas para permitir o arrefecimento da parte externa que se encontra mais próxima dos elementos em fibra de carbono.
O outro exemplo é a conduta de ar que sai da admissão do motor directamente para o habitáculo, uma passagem directa de vibrações de baixa frequência que ajudam o condutor a “perceber” o desempenho do motor. Atestámos a conveniência e sobretudo o quanto esses pormenores contribuem para o prazer de condução deste automóvel. Talvez por isso o sistema de som da Focal, instalado de origem, de pouco deva servir.