Eutanásia: Marcelo afasta referendo e diz que o TC “abriu caminhos para a solução”
Presidente reagiu ao chumbo do Tribunal Constitucional, afirmando que “é soberano”. Quanto a um referendo sobre a eutanásia, diz que a decisão ja foi recusada pela Assembleia da República.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, afastou a realização de um referendo à eutanásia, como defendem os líderes partidários do PSD e do Chega, por entender que a Assembleia da República já recusou esse cenário, e considerou que o Tribunal Constitucional (TC) “abriu caminhos para a solução”.
“A Assembleia da República recusou já uma vez o referendo [sobre a morte medicamente assistida] e não apreciou o pedido da outra vez. É uma decisão que foi tomada. Está tomada”, decretou esta terça-feira o Presidente da República, em declarações aos jornalistas, a meio de uma sessão do programa Músicos no Palácio de Belém, no antigo picadeiro real, em Lisboa.
Um dia depois de o TC ter voltado a declarar inconstitucional a eutanásia devido a “intolerável indefinição”, Marcelo Rebelo de Sousa pronunciou-se sobre o veto, desvalorizando o facto de os juízes do Palácio Ratton não terem dado razão às suas dúvidas sobre os conceitos de “doença grave e incurável” e de “lesão definitiva de gravidade extrema”, tendo apenas acolhido a definição de “sofrimento intolerável”.
“Uma das vezes, o Tribunal [Constitucional] dá razão, outras vezes não dá (…). Por exemplo, não encontrou maneira de dar razão a nenhum dos fundamentos do Presidente, aqui deu a um dos fundamentos”, afirmou, declarando que a Assembleia da República ponderará agora qual é a decisão que quer tomar.
Ainda a propósito dos fundamentos que defendeu, Marcelo referiu que o Tribunal Constitucional “é soberano e se o Tribunal Constitucional entende que determinados fundamentos apresentados pelo Presidente não têm cabimento, o Presidente aceita”, sublinhou. Revelou que admite pedir novamente nos próximos dias ao Tribunal Constitucional que se pronuncie em fiscalização preventiva sobre o decreto do Parlamento que altera o regime jurídico das associações públicas profissionais.
“Processo natural, sem dramas e sem crispações”
Nas declarações aos jornalistas, Marcelo destacou o “esforço muito grande” que tem sido feito pelo Tribunal Constitucional “para facilitar a tarefa da Assembleia da República, quer no primeiro acórdão, quer neste, sobretudo neste, que de alguma maneira explicita qual é o caminho que deve ser seguido”. “Vamos esperar para ver”, disse. O Presidente realçou, por outro lado, o “diálogo institucional muito rico que tem existido ao longo de cinco anos e das duas vezes em que o Tribunal Constitucional foi chamado a intervir não se limitou a considerar inconstitucional um ou dois pontos do diploma e abriu caminhos para a solução”, acrescentou.
“Penso que tem havido aquilo que é próprio de um sistema democrático e que desse diálogo tem surgido um processo que é um processo natural, sem dramas e sem crispações, num tema que é sensível em que tem havido a preocupação de não o dramatizar e parece-me que é assim que deve ser e assim deve continuar”, vaticinou Marcelo Rebelo de Sousa.
O chefe de Estado, que já devolveu o decreto ao Parlamento, vai agora aguardar pela decisão “soberana” da Assembleia da República, para depois “agir em conformidade com a solução encontrada pela Assembleia”.
Esta segunda-feira, o Tribunal Constitucional voltou a declarar inconstitucional regras do regime da despenalização da morte medicamente assistida por causa de um conceito: o de “sofrimento de grande intensidade” que afecta o doente que pede acesso à eutanásia. Os juízes consideram que o Parlamento criou uma “intolerável indefinição” sobre o “exacto âmbito de aplicação da nova leie”, porque o texto não explicita se as três características de sofrimento – “físico, psicológico e espiritual” – devem ser lidas cumulativamente ou podem ser interpretadas de forma individual.
A decisão foi tomada por uma maioria de sete juízes contra seis e o Presidente da República já anunciou a devolução, de novo, do diploma à Assembleia da República sem promulgação.