Encontrada sétima piroga no rio Lima
Embarcação localizada em Viana do Castelo é semelhante a outras seis consideradas tesouros nacionais. Transportada para a marina da cidade aguarda a vista dos técnicos do CNANS, esta quarta-feira.
Foi encontrada mais uma piroga antiga no Lima, em Viana do Castelo. Retirada do rio no sábado, a embarcação foi levada para a marina da cidade e aguarda agora a visita dos técnicos do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática (CNANS), que deverão deslocar-se a Viana esta quarta-feira.
Em declarações à agência Lusa, o vereador da Cultura da Câmara de Viana do Castelo, Manuel Vitorino, explicou que a piroga monóxila, embarcação construída a partir de um único tronco de árvore, foi resgatada com o apoio dos bombeiros sapadores, acompanhados pelos técnicos de arqueologia da autarquia.
"Estamos a articular com a Câmara de Esposende [distrito de Braga] a cedência de um tanque próprio para este tipo de estruturas que têm de ser conservadas em ambiente salino para não se degradarem", explicou Manuel Vitorino.
A embarcação foi encontrada na sexta-feira no areal do camalhão de São Simão pelo presidente da União de Freguesias de Mazarefes e Vila Fria, na margem esquerda do rio. "Foi realizado o registo da embarcação e dos elementos que se encontravam dispersos pelo areal", acrescentou o vereador, explicando em seguida que a piroga foi colocada sobre uma estrutura rígida construída para o efeito, posta a flutuar com o auxílio de bóias e posteriormente rebocada para a marina da cidade, onde agora se encontra à espera dos técnicos.
Ainda segundo Manuel Vitorino, "o CNANS foi informado do achado e deverá prestar o apoio técnico para transferência da embarcação para o tanque que a Câmara de Esposende disponibilizará".
Período castrejo
Trata-se da sétima embarcação deste género que é descoberta no rio Lima, sendo que as seis anteriores encontradas em Lanheses e Lugar da Passagem, em Geraz do Lima, também no concelho de Viana do Castelo, estão classificadas como Conjunto de Interesse Nacional (CIN), tendo-lhes sido atribuída a designação de "tesouro nacional", segundo decreto publicado em Diário da República, em Junho de 2021.
As seis pirogas foram recolhidas do rio Lima entre 1985 e 2008. Estes bens arqueológicos encontram-se à guarda da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), nas reservas do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática.
"Trata-se de um conjunto que, no contexto da Península Ibérica, não possui paralelo tendo em conta o número de embarcações envolvidas, constituindo um testemunho notável da navegação que se praticava no rio Lima desde a Idade do Ferro, até à Baixa Idade Média, datações estas obtidas por radiocarbono", refere o documento que confirma a classificação do conjunto, proposta ao Governo em 2020. A "maior parte das pirogas foi encontrada perto de um local onde, curiosamente, persiste até hoje o topónimo Lugar da Passagem", pode ler-se no mesmo decreto. "Esta tradição, historicamente comprovada por uma inscrição gravada num bloco de granito com a data de 1742, que ainda hoje se conserva, refere-se ao local onde pessoas e mercadorias eram transportadas e onde, mais tarde, surgira uma ponte de ligação entre as duas margens do Lima".
Segundo informação disponibilizada pela Câmara de Viana do Castelo, as pirogas monóxilas, escavadas num tronco de árvore, eram usadas na Europa desde a pré-história, mais precisamente desde o neolítico. Entre as seis encontrada no Lima - a sétima não foi ainda datada, naturalmente - há duas com mais de dois mil anos, dos séculos IV/III a.C. "Datam, assim, da plena Idade do Ferro, também conhecida entre nós por período castrejo", refere a autarquia. A mais recente deste conjunto já classificado remonta ao século XI.
"Por serem embarcações construídas através de uma tecnologia muito particular e, por terem sido utilizadas por tão longo período de tempo, no rio Lima, estas merecem um grande relevo e assumem uma enorme importância para a comunidade científica portuguesa e internacional", acrescenta o município.
Contactado pelo PÚBLICO, António Matias, chefe da Divisão do Património Arqueológico e das Arqueociências da DGPC, departamento que engloba o CNANS, não quis pronunciar-se sobre os passos que se seguem no processo de salvaguarda e valorização desta sétima piroga. "Sem a visita técnica de amanhã [quarta-feira] é prematuro falar", disse.
Entre a equipa que se deslocará a Viana do Castelo estará José António Gonçalves, o conservador-restaurador que é coordenador do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática.