Congresso peruano rejeita antecipação das eleições gerais

Medida é exigida pelos manifestantes, mas foi chumbada pela esquerda, que quer também um referendo constitucional. Morreram mais de 50 pessoas em menos de dois meses de protestos

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Maioria dos deputados chumbou proposta para antecipar eleições para este ano EPA/Congress of Peru HANDOUT

O Congresso peruano chumbou na sexta-feira à noite a proposta de antecipação das eleições gerais para Outubro de 2023, frustrando os esforços da Presidente interina, Dina Boluarte, para tentar satisfazer uma das principais exigências dos manifestantes que não têm abandonado as ruas das cidades do país.

A sessão de sexta-feira à noite ficou marcada por uma forte divisão. A proposta de antecipação das eleições recebeu o apoio da direita, incluindo o partido fujimorista Força Popular, mas teve os votos contra das forças de esquerda, como o Peru Livre, pelo qual o ex-Presidente Pedro Castillo foi eleito. Em causa está a insistência dos partidos de esquerda em incluir, para além das eleições legislativas e presidenciais, um referendo para a marcação de uma Assembleia Constituinte, algo que é também exigido pelos manifestantes.

Boluarte lamentou a rejeição da proposta de marcação de eleições antecipadas. “Apelamos às bancadas para que ponham de lado os seus interesses partidários e de grupo e ponham os interesses do Peru à frente”, afirmou a Presidente interina.

Há cerca de um mês, o Congresso já tinha aprovado a antecipação das eleições para Abril de 2024, mas os manifestantes antigovernamentais exigem uma data mais próxima. Para segunda-feira ficou marcada uma nova sessão parlamentar, para reavaliar a proposta de marcação das eleições, mas parece improvável um desfecho diferente.

O Peru está submerso numa crise política e social profunda desencadeada no início de Dezembro, quando Castillo decidiu dissolver o Congresso e passar a governar por decreto. A iniciativa foi rejeitada até pelos seus aliados e os parlamentares votaram de imediato o seu afastamento. Em poucas horas, Castillo foi detido e acusado de tentativa de golpe de Estado.

Desde então, milhares de apoiantes do ex-Presidente não mais abandonaram as ruas, sobretudo nas regiões rurais do Sul do país. Exigem a demissão de Boluarte, que como vice-presidente assumiu a presidência interina, e a marcação imediata de eleições gerais e a abertura de um processo constituinte.

As manifestações têm sido reprimidas com bastante violência e já se registaram mais de 50 mortos, a maioria dos quais em confrontos com as forças de segurança. Ainda esta semana, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas emitiu uma série de recomendações para as autoridades peruanas, com especial incidência para que “evitem o uso desproporcionado da força”.

Com o país ingovernável, Boluarte, que inicialmente afastou a hipótese de antecipar as eleições para este ano, defende agora uma chamada às urnas ainda em 2023 para tentar aplacar a fúria dos manifestantes. A pressão sobre a Presidente interina chega de todos os lados. Uma sondagem do instituto CID-Gallup divulgada esta semana mostrava que mais de 70% dos peruanos desaprovam a sua governação e 83% dizem não se sentir representados por ela.

Há poucos dias, um grupo de deputados apresentou ao Congresso uma proposta de destituição de Boluarte, alegando a sua “incapacidade moral permanente” para se manter no cargo. O historial recente do Peru mostra que é altamente provável que Boluarte, a primeira mulher na presidência do país sul-americano, seja afastada pelo Congresso: dos últimos cinco presidentes, três foram destituídos e um demitiu-se antes de o ser.

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