Abusos sexuais na Igreja: comissões diocesanas vão fazer balanço
Relatório da comissão independente liderada por Pedro Strecht vai ser divulgado no dia 13 de Fevereiro. Papa reconheceu “sanções secretas” do Vaticano a D. Ximenes Belo.
Numa altura em que se aguarda pela divulgação do relatório retrospectivo dos casos de abuso sexual ocorridos no seio da Igreja Católica desde 1950, as comissões diocesanas para a protecção de menores e adultos vulneráveis criadas em cada uma das 22 dioceses portuguesas vão reunir-se em Fátima, no dia 4 de Fevereiro, para um encontro destinado a avaliar a resposta aos abusos sexuais de menores e adultos vulneráveis ocorridos no seio da instituição.
A psicóloga Rute Agulhas foi convidada para falar sobre as dificuldades no processo de denúncia destes casos, a par das “boas práticas de prevenção”, segundo a agência Ecclesia. De acordo com o último balanço, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI), coordenada por Pedro Strecht, recebeu um total de 424 denúncias, que corresponderão “no mínimo” a 1500 vítimas, segundo o pedopsiquiatra.
Em Outubro, e já depois de Marcelo Rebelo de Sousa se ter referido àquele número como não sendo “particularmente elevado”, Pedro Strecht lembrou que apenas entre 20% a 25% dos casos deverão ser conhecidos, no âmbito deste esforço que a comissão independente vem fazendo para apelar à denúncia destes casos (através do sítio darvozaosilencio.org, por exemplo, ou ligando para o número +351 91 711 00 00).
Aquela comissão independente, cujo relatório final vai ser apresentado no dia 13 de Fevereiro, reencaminhou 17 denúncias para o Ministério Público, que têm em boa parte dos casos sido arquivadas, por terem prescrito ou por dificuldades na obtenção de meios de prova.
Entre as 424 denúncias inscrevem-se as relativas aos oito padres jesuítas que terão abusado sexualmente de menores, entre 1950 e o início dos anos 1990, conforme divulgou a própria Província Portuguesa da Companhia de Jesus, num comunicado divulgado em Setembro e onde acrescentava que os oito visados já morreram.
"Sanções secretas" a Ximenes Belo
Mais recentemente, a diocese de Viana do Castelo confirmou as acusações contra o padre André Filipe da Costa Gonçalves, que terá abusado de um rapaz agora com 16 anos de idade, entre Outubro e Dezembro do ano passado. O padre foi entretanto suspenso de funções e o bispo de Viana do Castelo, D. João Lavrador, anunciou anteontem que o caso já seguiu para o Ministério Público e que vai escrever uma carta aos paroquianos “pedindo desculpa e perdão”.
O último escândalo envolveu o ex-administrador apostólico de Díli, D. Ximenes Belo, que se encontrava em Portugal quando a revista neerlandesa De Groene Amsterdammer publicou uma reportagem implicando-o em vários casos de aliciamento e abuso de menores nas décadas de 1980 e 1990. O Nobel da Paz justificou na altura o pedido de resignação com o “profundo cansaço físico e psicológico” que dizia sentir, tendo a partir daí passado a viver em Portugal, em instalações da Província Portuguesa da Sociedade Salesiana.
Quando a notícia foi divulgada, os salesianos reagiram “com perplexidade e tristeza”, argumentando que se limitaram a recebê-lo como hóspede, sem quaisquer cargos ou responsabilidades pastorais. Mas na quarta-feira o Papa Francisco admitiu, numa entrevista à Associated Press, que o Vaticano impusera sanções “secretas” a Ximenes Belo. “Isto é um caso muito antigo. Não existia a consciência de hoje”, admitiu Francisco, explicando que quando em Setembro surgiram as revelações públicas sobre o caso, disse: “Sim, deixem-no ficar às claras. Não o vou encobrir”. O bispo desapareceu entretanto para parte incerta.