Afinal, as cápsulas de café descartáveis têm um lado amigo do ambiente?

A maioria das emissões de uma chávena de café são provenientes da preparação e não da embalagem. O café de filtro tem uma pegada carbónica maior, mas o segredo está em evitar o desperdício.

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Há casos em que as cápsulas são uma das melhores escolhas ambientais Reuters/REGIS DUVIGNAU

Embora convenientes e populares, as cápsulas de café de uso único são vistas por muitos como um pesadelo ambiental. Mas, apesar dos montes de cápsulas descartadas que este método de preparação deixa para trás, ele pode não ser tão prejudicial para o planeta como se pensa.

Em certos casos, fazer uma chávena de café numa cafeteira de filtro da velha guarda pode gerar aproximadamente 1,5 vezes mais emissões do que utilizar uma máquina de cápsulas, de acordo com uma análise feita por investigadores da Universidade de Quebeque, em Chicoutimi, no Canadá.

O estudo acrescenta a um corpo crescente de investigação mais uma prova que mostra que partir do princípio que a embalagem é a componente mais prejudicial para o ambiente é, muitas vezes, enganador.

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Evitar o desperdício de café e água é a melhor forma de reduzir a pegada ambiental de uma chávena Nao Triponez/Pexels

Em vez disso, dizem os especialistas, é importante olhar para toda a vida útil de um produto – desde que é feito até ao momento em que atinge o aterro – para descobrir quais as mudanças que podem ter o maior efeito na melhoria da sustentabilidade. No caso do café feito em casa, este último estudo mostra que este se resume, em grande parte, a não desperdiçar água ou café.

"Como consumidor, o que nos resta são os resíduos visíveis à nossa frente, e que muitas vezes tendem a ser embalagens e plásticos", afirma Shelie Miller, professora de sistemas sustentáveis na University of Michigan School for Environment and Sustainability, que não esteve envolvida na nova análise. "Mas o impacto das embalagens, em geral, é muito, muito menor do que o do próprio produto.” A investigação mostra que é possível reduzir a pegada de carbono do consumo de café.

Menos café = menos emissões

O estudo recente, que analisou quatro técnicas comuns de fazer café, concluiu que o café instantâneo parece produzir a menor quantidade de emissões quando são utilizadas as quantidades recomendadas de água e café.

Isto deve-se, em parte, ao facto de haver tipicamente uma pequena quantidade de café instantâneo utilizada por chávena e a água a ferver numa chaleira tende a utilizar menos electricidade em comparação com uma cafeteira tradicional. Além disso, o método não produz borras de café que têm de ser deitadas fora, de acordo com os investigadores do estudo.

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Grãos de café Daniel Rocha

O café com filtro tradicional, por outro lado, tem a maior pegada de carbono, principalmente porque são utilizados mais grãos moídos para produzir a mesma quantidade de café, escreveram os investigadores. Este método, observaram os cientistas, também tende a consumir mais electricidade para aquecer a água e mantê-la quente.

"Ao nível do consumidor, evitar o desperdício de café e água é a forma mais eficaz de reduzir a pegada de carbono do consumo de café", recomenda Luciano Rodrigues Viana, doutorando em ciências ambientais em Chicoutimi e um dos investigadores que realizou a análise.

A forma como prepara o seu café importa

O impacto ambiental do café é fortemente influenciado pela forma como as pessoas preparam as suas bebidas, diz Rodrigues Viana.

Por exemplo, no caso do café instantâneo, se se usar mais 20% de café e aquecer o dobro da quantidade de água, o que acontece frequentemente, então os dados sugerem que as cápsulas de café podem ser a melhor escolha.

Entretanto, as máquinas de cápsulas de café são tipicamente concebidas para utilizar a quantidade ideal de café e água, levando a que se desperdice menos de ambas. Em comparação com o café com filtro tradicional, beber cerca de uma chávena da bebida preparada a partir de uma cápsula poupa entre 11 e 13 gramas de café, mostram os dados.

"Às vezes, é realmente contra-intuitivo", diz Andrea Hicks, uma especialista em engenharia ambiental da Universidade de Wisconsin em Madison. A investigadora conduziu uma análise semelhante, comparando diferentes métodos de preparação, e também descobriu que as cápsulas tinham menos impacto ambiental do que o método convencional de filtro gota-a-gota e, em alguns casos, eram melhores do que a utilização de uma prensa francesa.

"Muitas vezes as pessoas assumem que algo reutilizável é sempre melhor, e por vezes é", disse Hicks. "Mas, muitas vezes, as pessoas não pensam realmente no comportamento humano.”

Por exemplo, a última análise descobriu que os benefícios das cápsulas podem ser perdidos se a sua conveniência encorajar as pessoas a beber duas chávenas em vez de uma.

Há outros factores a considerar: a forma como a sua electricidade é gerada desempenha um papel importante, acrescenta Rodrigues Viana. Uma chávena de café de filtro tradicional preparado com electricidade gerada principalmente por combustíveis fósseis pode produzir cerca de 48 gramas de carbono equivalente, revela a análise. Em comparação, uma chávena fabricada utilizando principalmente energia renovável pode emitir cerca de 2 gramas de CO2 equivalente.

E outras investigações demonstraram que a adição de leite pode também "aumentar drasticamente" a pegada global de carbono por porção.

Não se foque apenas na embalagem

É certo que produzir e descartar cápsulas pode ter um impacto sobre o planeta. Mas estudos mostram que a maior parte dos efeitos ambientais do consumo de café provêm da produção dos grãos e da energia necessária para a sua preparação.

"Independentemente do tipo de preparação do café, a produção de café é a fase mais emissora de gases com efeito de estufa", escreveram Rodrigues Viana e os seus colegas. "Contribuiu para cerca de 40 a 80 por cento do total das emissões.”

A embalagem é responsável por uma quota muito menor, mostram os dados. Aqui está a matemática para as cápsulas: fabricá-las e enviar as usadas para um aterro gera cerca de 33 gramas de carbono equivalente. Produzir 11 gramas de café arábico no Brasil – a quantidade que pode ser poupada utilizando uma cápsula em vez de preparar café com filtro – emite perto do dobro dessa quantidade: cerca de 59 gramas de carbono equivalente.

Mas se quiser ajudar a reduzir o impacto da embalagem, pode reciclar as cápsulas usadas ou mudar para as reutilizáveis.

Resumindo: esteja atento

Tendo tudo isto em conta, a primeira coisa a fazer pode ser perguntar a si mesmo se quer realmente esse café e se o vai beber todo, afirma Miller.

"Não há necessariamente uma regra de ouro fácil de dizer aos consumidores, 'Aqui está a melhor opção ambiental'", admite. Em vez disso, a investigadora recomenda que se concentre na redução do desperdício e do consumo em geral e que tente ser tão eficiente quanto possível com os recursos de que dispõe.

"Resume-se realmente a estar atento aos produtos que consome e a tentar não desperdiçar", acrescenta.

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