Encenador António Pires dedica estreia de Pentesileia a Rogério de Carvalho
Com Pentesileia, encenador António Pires e a escritora e tradutora Luís Costa Gomes regressam ao universo dramatúrgico de Heinrich von Kleist.
O encenador António Pires dedica a tragédia Pentesileia, do autor alemão Heinrich von Kleist, que esta quarta-feira se estreia no Teatro do Bairro, em Lisboa, ao encenador Rogério de Carvalho, seu professor, nome para mais de 50 anos do teatro português.
António Pires recordou o mestre com quem começou a fazer teatro, em declarações à imprensa no final de um ensaio da peça, e frisou que a ideia inicial era dividir esta versão da tragédia em duas partes, repartindo a encenação com o encenador luso-angolano, professor durante décadas do Conservatório Nacional e da Escola Superior de Teatro e Cinema, com uma carreira premiada, assente em mais de uma centena de espectáculos estreados em palcos portugueses.
"Acabou por não acontecer, embora Rogério de Carvalho ainda tenha acompanhado durante uma semana os primeiros ensaios, as leituras", o que leva António Pires a afirmar: "Para mim, isto é um bocadinho uma peça para ele. Comecei a fazer teatro com o Rogério e teria sido muito prazeroso ter feito esse trabalho" com ele.
A tragédia do autor alemão (1777-1811) que agora se estreia a partir de uma nova tradução de Luísa Costa Gomes, é um projecto que a escritora, tradutora e dramaturga tem "há muitos, muitos anos", diz a autora de Educação para a tristeza aos jornalistas. "Li a peça e achei que era completamente extraordinária. Havia uma tradução dos anos 2000, mas não me pareceu que estivesse muito adequada ao palco", observou.
Traduzida pela escritora em 2020, Pentesileia (que será editado em livro, com a chancela Ar de Filmes/Teatro do Bairro) já era para ter sido representada, mas a pandemia de covid-19 obrigou a que as programações fossem refeitas, tendo atirado a estreia do espectáculo para agora, acrescentaram Luísa Costa Gomes e António Pires.
Tratado de psicanálise
Com Pentesileia, encenador e tradutora regressam ao universo dramatúrgico do autor alemão depois de, em 2010, terem trabalhado juntos em O príncipe de Homburgo, estreado no Centro Cultural de Belém.
Por ser uma peça muito longa, e de "descrições que se eternizavam e eram muito pormenorizadas", como a definiu Luísa Costa Gomes, António Pires teve de ir cortando, num espectáculo que a escritora considera "muito bem resolvido" na encenação, e que explica o porquê de as amazonas "virem por aí fora fazer a guerra e meterem-se no meio da guerra de Tróia".
"Obviamente, era uma explicação que tinha de se manter, são dez páginas", sustentou.
Para Luísa Costa Gomes, Pentesileia é uma tragédia clássica e Kleist tem "pouco talento para os enredos mas muito fascínio pelas pessoas intriguistas". Kleist "é um natural intriguista", acrescenta. "Tem umas intrigas sempre completamente surpreendentes e é tudo inesperado, como a realidade". A ideia do autor, continua a tradutora, é a de que "nós não controlamos coisa alguma e as coisas vão acontecendo como alucinações, como visões", argumentando com o facto de a protagonista da peça, interpretada por Rita Durão, "sonhar a realidade".
E foi muito difícil na encenação dar a ideia de que o sonho é a realidade e a realidade é o sonho. A ideia é a indistinção, sublinha Luísa Costa Gomes, a propósito da personagem Pentesileia que, a determinada altura da peça, acorda e diz "eu sonhei aquilo que se passou". "Do ponto de vista literário, é um texto tão rico... É um tratado de psicanálise", assegura a escritora.
A interpretar Pentesileia estão também Alexandra Sargento, Carolina Serrão, Francisco Vistas, Graciano Dias, Iris Tuna, Jaime Baeta, João Barbosa, Tiago Negrão e Vera Moura.
Com cenário de Alexandre Oliveira, figurinos de Luísa Pacheco, desenho de luz de Rui Seabra, e desenho de som de Paulo Abelho, o espectáculo estará em cena até 5 de Fevereiro (de quarta a sexta-feira, às 21:30; sábado e domingo, às 18h).
No dia 29, a récita terá tradução em Língua Gestual Portuguesa.