Quem é Roberto Martínez? Da base no futebol inglês até ao topo nas selecções
Nascido em Espanha, foi em Inglaterra que fez escola como treinador. Depois de orientar a Bélgica durante seis anos, sem conquistar qualquer troféu, chega agora a Portugal.
Dia 11 de Maio de 2013, final da Taça de Inglaterra, a competição nacional mais antiga do mundo. O Manchester City entra em campo como amplamente favorito, mas a equipa de Sergio Aguero e de Carlos Tévez, treinada por Roberto Mancini, perde por 1-0 com o Wigan, de Roberto Martínez. Foi a tarde em que o mundo do futebol acordou verdadeiramente para a carreira do treinador espanhol.
Foi a primeira (e até agora única) Taça de Inglaterra da história do Wigan, e o segundo troféu da carreira de Martínez, que vencera a League One (III divisão inglesa) com o Swansea, cinco anos antes, numa primeira aventura como técnico principal que deixava indicadores positivos.
Essa pedrada no charco aconteceu num contexto de alguma instabilidade (de 2009 a 2013), num Wigan que todos os anos sofria até à recta final da Premier League para procurar manter-se entre a elite. Nesse sentido, a época de 2013 foi agridoce, porque ao surpreendente triunfo na Taça juntou-se a descida de divisão, materializada com uma derrota por 4-1, com o Arsenal, três dias apenas após aquela tarde de glória diante do City.
Interesse do Liverpool, contrato com o Everton
Ainda assim, a conquista da FA Cup valeu a Roberto Martínez o interesse de muitos clubes, inclusive do Liverpool. Chegou a haver uma reunião entre a direcção dos “reds” e o técnico catalão (nasceu em Balaguer, província de Lérida, em 1973), mas os contactos não deram fruto.
Nesse ano, Martínez acabaria por ficar mesmo em Liverpool, mas do outro lado da cidade, ao leme do Everton. Na primeira época no clube, terminou o campeonato no 5.º lugar (a melhor classificação desde 2010), bateu o recorde de pontos (72) do clube na Premier League (que apenas engloba os campeonatos desde 1992) e qualificou-se para a Liga Europa.
No ano seguinte, seguiu-se um 11.º lugar no campeonato e uma eliminação surpreendente da Liga Europa às mãos do Dínamo Kiev (6-4 no conjunto da eliminatória), repetindo-se a classificação na Premier League em 2015-16. Nessa época, nem a chegada às meias-finais da Taça de Inglaterra, fase em que o Everton foi eliminado pelo Manchester United, impediu a saída de Roberto Martínez, um ano antes do fim do contrato.
O desafio na Bélgica
Apenas com 43 anos, mas já com alguma experiência no futebol inglês e responsável por algumas campanhas de sucesso, Roberto Martínez via alargar-se o leque dos interessados, com o Hull City e o Anderlecht a figurarem entre os clubes que fizeram abordagens directas ao técnico.
Assim, quando em Agosto de 2016, foi anunciado como o novo seleccionador da Bélgica, a contratação foi vista como algo surpreendente, como reportaram o The Times e a Fox Sports. Até porque o mais expectável, naquele momento, era que continuasse a construir a carreira debaixo da exigência do treino diário e das competições regulares do calendários dos clubes.
A opção foi outra e o desafio aliciante. Os “diabos vermelhos” tinham uma das selecções mais talentosas do mundo (com jogadores como De Bruyne, Hazard, Courtois e Lukaku, que havia sido treinado por Martínez no Everton), mas foram eliminados do Euro 2016 pelo País de Gales.
Com um estilo de jogo baseado numa ideia de posse, construção paciente desde trás e com três centrais, a astúcia táctica de Roberto Martínez foi (e é) uma das suas imagens de marca. De certa forma, o catalão foi implementando uma forma diferente de abordar o jogo, num país mais habituado ao 4x4x2 e a um futebol mais directo.
Terceiro lugar na Rússia
A relação entre o treinador e a selecção da Bélgica começou da melhor maneira, com uma campanha de qualificação para o Mundial 2018 practicamente perfeita (28 pontos de uns possíveis 30).
Essa boa forma continuou no Mundial da Rússia, com a equipa a terminar em primeiro um grupo que incluía ainda Panamá, Tunísia e Inglaterra. Disposta em 3x4x2x1 e pondo em prática um futebol atractivo e que melhor demonstrava toda a sua qualidade atacante, esta era uma Bélgica que ameaçava ir longe no torneio.
Seguiu-se uma vitória sofrida frente ao Japão (3-2), em que deu a volta ao resultado depois de estar a perder 0-2, e uma vitória convincente sobre o Brasil (2-1). A equipa só caiu aos pés da França (que se sagraria campeã), antes de conquistar o terceiro lugar, vencendo a Inglaterra, confirmando aquela que é, até hoje, a melhor prestação de sempre dos belgas em Campeonatos do Mundo.
Depois veio a qualificação para o Euro 2020, com a equipa a vencer todos os jogos da fase de grupos (com Rússia, Dinamarca e Finlância), antes de eliminar Portugal nos oitavos-de-final e de perder, na eliminatória seguinte, com a Itália (2-1), que haveria de erguer o troféu.
No Qatar, no Mundial 2022, veio a desilusão maior. Com uma equipa já demasiado madura e com a dúvida instalada mesmo dentro do balneário (Kevin de Bruyne assumiu publicamente que considerava que a selecção belga era "demasiado velha" para chegar ao título), a eliminação deu-se logo na fase de grupos.
A caminhada começou com uma vitória pouco convincente sobre o Canadá, a que se seguiu um empate com a Croácia e uma derrota com Marrocos - que haveria também de afastar Portugal nos quartos-de-final.
Após o adeus ao Mundial, na conferência de imprensa, um Martínez emocionado anunciou a saída da selecção: “Foi espectacular, foram seis anos em que conseguimos fazer tudo o que se quer fazer num clube, mas nós fizemo-lo numa selecção. Isso deixa-me muito orgulhoso. Adorámos a forma como a equipa jogou”.
Apesar da ausência de troféus, a Bélgica liderou o ranking de selecções da FIFA entre Setembro de 2018 e Março de 2022 – o maior período de tempo que uma equipa esteve no topo do ranking desde o Brasil, entre 2002 e 2007.
Texto editado por Nuno Sousa
Notícia corrigida às 13h, com a introdução da frase: A equipa só caiu aos pés da França (que se sagraria campeã).