Colocar a árvore bebé num buraco previamente aberto, voltar a enchê-lo de terra “dando aconchego à árvore”, colocar duas estacas com um protector de cartão biodegradável, e passar à seguinte. A acção repete-se tantas vezes quanto forem necessárias – neste caso, foram 3348 vezes no sábado, dia 7, na Terramay, junto ao Alandroal, nas margens do Alqueva.
O objectivo de David e Anna de Brito, os proprietários da Terramay, é que, durante este Inverno, sejam plantadas, no total, 5014 árvores, o que tem o valor simbólico de ser o número de habitantes registados no concelho no Censos de 2021.
Esta é, explica David, a terceira fase da reflorestação da Terramay, depois de no Inverno passado terem já sido plantadas mais 2500 numa nova zona de agrofloresta, de oito hectares, que irá continuar a crescer.
As cerca de 100 pessoas que no dia 7 se juntaram às vinte da equipa da propriedade revelaram-se de uma enorme eficácia – bastou uma hora e meia para plantar as mais de 3300 árvores, junto às linhas de água da propriedade, que foram assim requalificadas. “Se tivemos preparado as coisas para isso, poderíamos ter plantado as 5000”, comenta David, satisfeito com o resultado.
A iniciativa teve o apoio da Câmara Municipal do Alandroal, que disponibilizou transporte gratuito, e todos os que participaram tiveram a oferta de um almoço, um certificado de participação e um passeio de pónei para os mais pequenos.
As árvores e arbustos autóctones – quercus de vários tipos, loendros, salgueiros, choupos e freixos – foram doados pelos projectos Life Terra (que tem como missão reunir esforços para que sejam plantadas 500 milhões de árvores na Europa e avaliar o impacto disso em termos de sequestro de carbono) e Desert Adapt (que promove modelos de adaptação à desertificação em Itália, Espanha e Portugal) e pela associação Além Risco, centrada na divulgação dos problemas da desertificação no território alentejano, promotora de soluções de base natural para minimizar os impactos da crise climática, e que, nesse contexto, pretende apoiar a plantação de 50.000 árvores no distrito de Évora.
Os proprietários da Terramay, que praticam a agricultura regenerativa, têm uma dupla preocupação: combater a erosão da natureza, dos solos e a perda da biodiversidade, mas também contribuir para o combate à desertificação humana, que afecta profundamente a região.
O português David e a alemã Anna de Brito trocaram a vida urbana que tinham na Alemanha por esta propriedade de 560 hectares, à beira do Alqueva, para onde se mudaram com os três filhos. A mudança de vida aconteceu depois de terem despertado para o problema das alterações climáticas e terem começado a procurar soluções práticas para combater a desertificação dos territórios. "Um dos nossos objectivos é criar postos de trabalho, e já somos 30 na nossa equipa", diz David.
Hoje, quatro anos depois e com um investimento inicial de perto de três milhões de euros, posicionam-se como uma das herdades de referência na agricultura regenerativa, com uma componente turística (alojamento e restaurante), mas também uma aposta na educação e formação – para isso criaram o festival Soil to Soul Alandroal, que teve a sua primeira edição em Maio do ano passado, partindo de um modelo criado em Zurique, na Suíça.
Quando, no início de 2022, o PÚBLICO visitou pela primeira vez a Terramay para conhecer o projecto, David e Anna contaram que quando chegaram os solos estavam secos, esgotados e pouco saudáveis. A pouco e pouco, aplicando as técnicas da agricultura regenerativa, foram mostrando que é possível recuperá-los e devolver-lhes a fertilidade.
Pelo trabalho que têm vindo a fazer e as cumplicidades que já encontraram, ambos acreditam que Portugal “é hoje uma meca da agricultura regenerativa”. No Alandroal, David e Anna vão continuar a reflorestar, a manter o montado, a aumentar a agrofloresta – e todos os Invernos, quem quiser juntar-se a eles para plantar novas árvores, será recebido de braços abertos.