EUA querem limitar poluição por partículas para menos de metade do valor máximo na UE

Passar os valores máximos das partículas PM2,5 por m3 na atmosfera de 12 microgramas para nove ou dez microgramas é a proposta da Administração Biden. Na Europa, são permitidos 25 microgramas por m3.

Foto
Só a poluição atmosférica provocou 238 mil mortes no ano de 2020 na União Europeia EPA/ABEDIN TAHERKENAREH

A Administração Biden propôs reduzir em 25% os limites de um dos mais importantes poluentes atmosféricos, as partículas PM 2,5 (partículas que não ultrapassam 2,5 micrómetros de diâmetro e provêm de várias fontes, como os veículos com motores de combustão), que estão relacionadas com ataques de coração, AVC e doenças respiratórias.

A proposta está em consulta pública durante os próximos 60 dias e seria a primeira revisão desta regulamentação da Agência de Protecção Ambiental (EPA) em mais de uma década. Apesar de não sofrer alterações há tanto, tempo, os valores máximos permitidos hoje nos Estados Unidos já são mais reduzidos do que na União Europeia.

A proposta avançada agora pela Administração Biden é de que os valores máximos das PM2,5 por metro cúbico (m3) passem dos 12 microgramas actuais para um nível entre nove e dez microgramas por m3. Consoante os resultados da consulta pública, diz o New York Times, os valores recomendados podem ser mais ou menos restritos.

Mas na União Europeia, os níveis máximos permitidos das partículas PM 2,5 no ar são de 25 microgramas por m3 – bem longe do objectivo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de apenas cinco microgramas por m3, estabelecido em 2021.

Num pacote de propostas apresentadas em Outubro pela Comissão Europeia para pôr a UE na trajectória para atingir a poluição zero em 2050, estava uma revisão da Directiva de Qualidade Ar que fazia a aposta de diminuir em 75%, ao longo de dez anos, o número de mortes devido ao principal poluente atmosférico, as partículas PM 2,5. Esperava-se fazer uma avaliação intermédia em 2030, quando os níveis máximos permitidos das partículas PM 2,5 deverão ter descido para dez microgramas por m3.

A inalação das partículas PM 2,5 está associada a um aumento do risco de morte prematura com doenças cardiovasculares, respiratórias, cancro do pulmão e infecções respiratórias baixas.

O valor esperado para 2030 pela UE é aquele que os Estados Unidos estão a propor agora que entre em vigor, actualizando os valores de referência que datam de 2012. Embora não seja líquido que a proposta da Administração Biden avance nos moldes em que foi apresentada. Lobbies económicos estão já a mobilizar-se para tentar travá-la ou atenuá-la, diz o New York Times.

“Embora seja importante continuar a fazer progressos, reduzir ainda mais os padrões das partículas PM 2,5 pode levar a consequências imprevistas e prejudicar a nossa capacidade de construção de infra-estruturas muito necessárias. Num período de inflação alta e perturbações nas cadeias de abastecimento, a economia dos EUA não pode sofrer mais perturbações”, disse Chad Whiteman, vice-presidente do Instituto de Energia Global da Câmara de Comércio dos Estados Unidos, citado pelo diário norte-americano.

"Falta de ambição da UE"

Quanto à Europa, em Outubro, quando a Comissão Europeia apresentou as suas propostas, a organização ambientalista Zero lamentava “a falta de ambição da proposta de revisão da Directiva de Qualidade do Ar”, que define normas e objectivos para diversos poluentes atmosféricos.

A mais recente actualização desta directiva data de 2008, e “os valores aí estabelecidos encontram-se completamente obsoletos em relação às recomendações da OMS para os limites destes poluentes [cinco microgramas por m3]”, dizia a Zero, em comunicado. “A actualização da directiva continua a não respeitar os limites recomendados pela OMS, apesar destes serem considerados como os limites máximos para prevenir a morte prematura de milhares de europeus."

Só a poluição atmosférica provocou 238 mil mortes no ano de 2020 na União Europeia, diz a Comissão, e é responsável pela morte prematura de cerca de seis mil pessoas por ano em Portugal. Os números portugueses foram confirmados por um estudo publicado no início de 2022 na revista científica Science of the Total Environment e apresentado num encontro no Instituto Universitário Egas Moniz (IUEM), em Almada: por ano, há mais de 5000 mortes em Portugal causadas pela exposição a dióxido de azoto e a partículas finas (PM 2,5) – e a mortalidade é mais elevada em zonas urbanas e costeiras –, havendo ainda 140 mortes atribuídas à exposição ao ozono.

Nos Estados Unidos, a Administração Biden espera que a redução dos limites máximos das partículas PM 2,5 na atmosfera possa evitar 4200 mortes prematuras anualmente, bem como 270 mil dias de trabalho perdidos anuais, diz o New York Times.

Esta revisão dos limites das partículas PM 2,5 é central nos esforços para garantir a justiça ambiental da Administração Biden, disse Michael Regan, o administrador da EPA. Há estudos científicos que comprovam que são as populações mais pobres e de minorias – como a comunidade afro-americana – que estão mais expostas, de forma desproporcional, a este e outros tipos de poluição, porque vivem frequentemente junto a auto-estradas, centrais eléctricas e outras instalações industriais.