Países Baixos desclassificam o mapa de um “tesouro” enterrado pelos nazis

Arquivos Nacionais neerlandeses tornaram público documentos secretos relativos a um saque de jóias, ouro, diamantes e relógios ocorrido em 1944. Os bens valerão milhares de milhões de euros.

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O mapa, em exposição nos arquivos nacionais neerlandeses SEM VAN DER WAL/EPA

Um mapa que mostra onde os nazis enterraram milhares de milhões de euros em jóias, diamantes, ouro e relógios foi tornado público esta semana pelos Arquivos Nacionais dos Países Baixos. O documento, exposto desde terça-feira nas instalações da instituição, em Haia, está a despertar muita atenção, mas também alguma desconfiança. A imprensa internacional descreve-o como “um tesouro” que nunca havia sido encontrado.

Anualmente, a instituição neerlandesa revela documentos da sua colecção até então apenas passíveis de consulta mediante autorização e sob fortes medidas de segurança, ou mesmo classificados como secretos. Era o caso deste mapa, desenhado à mão, que indica a região onde terá sido enterrado o tesouro resultante da pilhagem de uma filial do Banco de Roterdão (segundo o diário espanhol El País, pertencente actualmente ao banco ABN Amro) em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial.

Os arquivos nacionais neerlandeses puseram à disposição do público cerca de 1100 páginas de informação, entre as quais o mapa, bem como outros documentos que indicam a localização do espólio: a região de Betuwe, na província de Gelderland. Mais precisamente perto da localidade de Ommeren — que ao longo dos anos já foi alvo de buscas três vezes, detalha o mesmo diário espanhol. Infrutíferas.

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Os arquivos nacionais neerlandeses puseram à disposição do público cerca de 1100 páginas de informação SEM VAN DER WAL/EPA

A história começa em Agosto de 1944, quando um raide de bombardeamentos alemães atingiu a sucursal do Banco de Roterdão em Arnhem (a cerca de 40 quilómetros de Ommeren), explica Anne Waalkens, assessora do Arquivo Nacional dos Países Baixos. “Durante a defesa de Arnhem houve uma explosão numa sucursal do Banco de Roterdão na [avenida] Velperweg. Pelo menos três oficiais alemães que estavam no local esconderam o saque nos casacos”, detalha a publicação local Omroep Gelderland, citando Anne Waalkens. Os militares nazis aproveitaram o facto de as bombas terem rebentado os cofres do banco e dispersado os valores pela rua.

O saque descrito “vale muitos milhões”, diz Waalkens, detalhando que os bens subtraídos pelos oficiais (jóias, diamantes, ouro e outros valores) terão depois sido guardados em quatro caixotes de munições e escondidos num vagão de um comboio, contou a assessora dos Arquivos Nacionais dos Países Baixos ao El País. “Pensamos que o enterraram em 1945, um par de semanas antes da libertação da zona pelos Aliados, num local em Ommeren”, acrescenta.

Segundo os documentos agora tornados públicos, os autores do roubo terão sido o sargento major Kastel, o sargento Brauer Bibelot e o soldado Biebert, membros do regimento de pára-quedistas Witzig, um dos mais valorizados pelas forças armadas da Alemanha nazi. Um soldado, identificado apenas como Helmut, foi encarregado de vigiar o momento em que enterravam as caixas com os valores, disse Anne Waalkens ao El País. Este cúmplice só foi identificado porque correram rumores do caso no rescaldo do armistício, e uma missão neerlandesa em Berlim seguiu depois a pista até ele. Estava então em Baden-Baden e testemunhou — e, crucialmente, forneceu o mapa que estava na sua posse.

Waalkens disse ainda ao diário espanhol que dois dos três militares envolvidos no caso morreram durante a guerra e que não se conseguiu localizar o terceiro.

À época, o diário nacional neerlandês Telegraaf chegou a noticiar o caso depois dessa denúncia, diz a Fox News. Foram feitas tentativas de encontrar o “tesouro”, tendo-se mesmo recorrido a um oficial nazi, trazido da Alemanha após o final da Segunda Guerra Mundial, e a detectores de metais. Nada foi encontrado, resume a publicação local neerlandesa Omroep Gelderland.

O mapa e a documentação foram então classificados para evitar uma vaga de caçadores de tesouros no local, diz Waalkens ao El País. O apelo do “ouro nazi” é forte e há profissionais que se dedicam a buscas sempre que surge uma destas histórias.

Tanto a assessora da instituição quanto o historiador neerlandês Joost Rosendaal, ouvido pelo Omroep Gelderland, acreditam que os valores podem ter sido encontrados logo depois de terem sido enterrados, mas a funcionária dos arquivos arrisca que talvez tenham sido levados ilicitamente por alguém do instituto neerlandês que na altura ficou encarregue das buscas, por algum cidadão da região ou até por algum soldado das forças aliadas. Ou que o mapa e a história sejam uma invenção do soldado Helmut.

A questão da veracidade do mapa e da história é posta em causa de forma mais veemente por Joost Rosendaal, da Universidade de Radboud, que numa conversa com o El País frisa que a data dos bombardeamentos em Arnhem não coincide com a que consta dos documentos nem com os danos em bancos na região — algo que sucedeu apenas mais tarde. Mas Waalkens argumenta que no pós-guerra se verificou que havia várias peças em falta no inventário do banco em causa, e que este fora mesmo bombardeado. Quanto à vinculação dos militares ao regimento Witzig, o historiador diz que este só chegou aos Países Baixos em Fevereiro de 1945.

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