Tenho bens que ficaram danificados com as inundações. E agora?

Caso tenha seguro com cobertura contra inundações, é recomendado que entre em contacto com a empresa para iniciar o processo de indemnização. Senão, terá de aguardar pelas autarquias ou pelo Governo.

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Guillermo Vidal

O mau tempo que assolou o país nos últimos dias causou prejuízos que já chegam aos milhões de euros, segundo os cálculos das autarquias. Quem tiver apólices de seguro com cobertura contra inundações deve contactar as respectivas empresas para garantir a agilização dos processos, mas poucos estão protegidos para situações deste tipo.

Tenho bens que ficaram danificados com as inundações. E agora?

Seja a casa, o carro ou outros bens, como electrodomésticos, o primeiro passo será sempre o de perceber se a apólice contratada tem cobertura para este tipo de situações. Se não tiver, não há nada a fazer. E a maioria das pessoas não tem estas cláusulas no contrato, diz ao PÚBLICO Diogo Martins, da Deco – Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor.

“Este tipo de situações não são coberturas obrigatórias, nem são coberturas-base, e, por isso, a maior parte das pessoas não as tem. Muitas porque não têm capacidade económica, outras porque decidiram mesmo não ir por aí – e também depende da zona em que se vive”, explica o advogado.

O cenário é aplicável a habitação, automóveis ou outros bens, como electrodomésticos ou mobiliário que esteja coberto por algum tipo de seguro. Caso contrário, o consumidor “não se pode agarrar a nada”, tendo de esperar por eventuais medidas das autarquias ou do Governo – já lá vamos.

Para ter protecção face a desastres naturais, é preciso que o seguro contratado inclua explicitamente os fenómenos – “tempestades”, “aluimento de terras”, inundações”, por exemplo.

Mesmo tendo subscrito um seguro multirriscos, Diogo Martins alerta que não existe, normalmente, uma “cobertura singular” que englobe todas estas catástrofes: “Existe uma para tempestade, uma para aluimentos, ou seja, tem de se contratar separadamente para se fazer um pacote inteiro.”

O meu seguro protege-me contra a situação. Como devo proceder?

Sabendo que o seguro contratado cobre a situação que enfrentou, a Deco recomenda a recolha imediata do “máximo de provas possível”. Tendo em conta a urgência da situação, que difere de casos mais habituais como infiltrações, é importante registar de imediato os danos provocados pela água que inundou a habitação, por exemplo.

“Para se precaver, tendo em conta que infelizmente as seguradoras, muitas vezes, são avessas a esse tipo de alegações por parte dos consumidores, convém logo tirar fotografias para se perceber como é que está a situação àquela data. Filmar, reunir facturas, nomes de testemunhas”, enumera Diogo Martins.

Na quarta-feira, a Associação Portuguesa de Seguradores (APS) já dava conta de “milhares de ocorrências participadas e valores significativos de indemnizações a processar”. E recomendou de imediato que os tomadores de seguro “contactem as respectivas empresas” e que “registem – através de fotografia, por exemplo – todos os danos materiais causados sobre os seus bens, para que sejam um complemento ao processo de regularização do sinistro”.

Diogo Martins vai mais longe e recomenda, caso haja essa possibilidade, o envio de um email à seguradora – mesmo que tenha feito um primeiro contacto telefónico ou presencial – para garantir uma “prova escrita de como se expôs a situação”. “É bom para analisar a situação, caso o desfecho não seja o desejado”, explica.

Em relação a estabelecimentos de comércio, na prática, os procedimentos no accionamento do seguro são os mesmos. Normalmente, assemelham-se a um seguro do recheio da casa: os objectos protegidos estão discriminados – com registo do tipo de bens, seu valor e ano de compra – e a avaliação passa por ter uma indemnização pelos danos sofridos, conforme a avaliação da seguradora.

A cobertura é garantida?

No caso de inundações, a Deco refere que estão cobertos danos provocados por “chuvas torrenciais, rebentamentos de diques e barragens e pelo transbordamento do leito de cursos de água”. Isto apenas se a chuva tiver atingido, no mínimo, dez milímetros em dez minutos – neste caso, dada a gravidade da situação e o facto de ter sido um dos dias mais chuvosos da memória recente, não será necessário apresentar provas disso.

No entanto, a associação sublinha que ficam excluídos da cobertura “estragos causados pelo mar e pela entrada das chuvas nos telhados, portas, janelas e terraços”, a não ser que tal aconteça por danos às estruturas provocados pelo temporal. Por outras palavras, se deixar uma janela aberta e a chuva estragar algo no interior de casa, o seguro pode não pagar.

No caso do automóvel, a situação é idêntica. Caso a seguradora verifique que os estragos foram provocados em situações irregulares – circulação numa via cortada, estacionamento indevido ou negligência –, pode isentar-se de responsabilidade.

Tenho direito a apoios municipais ou do Estado?

A resposta varia de município para município, consoante a capacidade de resposta das autarquias. Diogo Martins refere que as câmaras municipais se têm “chegado à frente”, mas sublinha que nem todas têm “a mesma capacidade financeira” para auxiliar a população. O advogado acrescenta que esta é “uma luta antiga” da Deco, tendo em conta o facto de muitas pessoas não terem cobertura para estas situações “por não terem capacidade”.

“Não pode recair tudo sobre o consumidor, as câmaras têm as suas responsabilidades”,observa. Reforça ser importante “um fundo de catástrofe a nível nacional”, para além da necessidade de garantir que as autarquias fazem as obras necessárias para evitar a repetição deste tipo de catástrofes.

O Governo já anunciou que está a preparar um “fundo de apoio ao comércio”, tendo também referido que vai aprovar apoios a nível nacional assim que as autarquias tenham concluído o levantamento dos prejuízos provocados pelas inundações. Os municípios também já têm accionado planos de emergência e procurado agilizar procedimentos para agilizar o registo dos danos sofridos.

Para quem ficou “desamparado” com os estragos causados pelo mau tempo desta semana, resta por isso esperar. É uma situação que Diogo Martins descreve como “angustiante”: “As pessoas não sabem o que fazer, quando é que os apoios vão ser atribuídos, de que tipo… E não podem ficar dependentes disso.”

A situação poderia ser agilizada com o tal fundo de catástrofe, destinado a danos causados pelo clima – uma ideia já defendida anteriormente pela Deco –, para que as populações “não dependam da boa vontade das autarquias”.

Na quarta-feira, o primeiro-ministro, António Costa, admitiu que Portugal poderá accionar o Fundo de Solidariedade da União Europeia (UE), que permite à União Europeia apoiar um Estado-membro em caso de catástrofes naturais de grandes dimensões.

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