Relatório alerta para a crescente violência contra migrantes nas fronteiras da UE
Expulsões ilegais de requerentes de asilo estão a tornar-se cada vez mais frequentes nas fronteiras externas da UE. Polícias fronteiriças passaram a adoptar tácticas agressivas.
A violência e as expulsões ilegais de migrantes que tentam chegar à União Europeia são tendências cada vez mais frequentes, de acordo com um relatório que documenta milhares de incidentes nas fronteiras europeias nos últimos dois anos.
A Rede de Monitorização de Violência Fronteiriça, uma rede de organizações não governamentais, juntou os relatos de 733 pessoas que tentaram entrar na UE nos últimos dois anos, em que são descritos episódios de espancamentos, assédio sexual, revistas abusivas e milhares de expulsões forçadas, conhecidas como pushbacks.
Os tratados europeus garantem o direito de qualquer pessoa poder pedir asilo, provando ser perseguida no país de origem ou estar a fugir de uma situação extrema, como uma guerra, sem receio de ser deportada.
No entanto, o que eram situações esporádicas de repressão violenta nas fronteiras da UE estão a tornar-se uma aparente política generalizada. Os requerentes de asilo têm enfrentado “um aumento de violência sem precedentes” nas fronteiras da UE, conclui o relatório.
Os testemunhos foram recolhidos em 15 países com uma fronteira externa da UE e alguns Estados fora do bloco, como a Sérvia, Albânia ou Macedónia do Norte. O relatório estima que cerca de 16 mil pessoas tenham sido afectadas por expulsões colectivas por parte das forças de segurança fronteiriças só em 2021 e 2022.
A eclosão da pandemia é um dos factores apontados para o recrudescimento da resposta das autoridades europeias. “Ninguém estava lá [nas fronteiras] para documentar o que se tornou um aumento sem precedentes da violência mais brutal contra pessoas que se deslocavam ao longo das fronteiras externas da UE”, afirma o relatório, citado pelo Guardian.
O relatório conta centenas de histórias de grupos de migrantes a quem eram retirados os telemóveis antes de serem levados para edifícios da polícia fronteiriça para serem objecto de revistas, para as quais eram obrigados a despir-se. As mulheres contam frequentemente terem sido tocadas de forma abusiva pelos guardas.
Hope Barker, uma das autoras do documento, passou quatro anos a entrevistar migrantes que dizem ter sido expulsos da Grécia e disse que a situação se tem agravado nos últimos tempos. “No início, tudo parecia muito esporádico, poucos incidentes; acabou por se tornar uma abordagem sistemática que se espalhou para todo o país”, explicou.
A prática das expulsões de requerentes de asilo tem sido gradualmente integrada nas legislações nacionais de alguns países. A tendência acelerou-se na sequência da crise migratória na fronteira da Bielorrússia com a Polónia, Letónia e Lituânia, no final do ano passado. Na altura, a UE apoiou várias medidas adoptadas por estes Estados-membros, como a generalização de pushbacks e a construção de vedações na fronteira, por considerar que o regime de Alexander Lukashenko estava empenhado em instrumentalizar os migrantes para causar instabilidade no espaço europeu.
A partir daí, a legislação que impede as expulsões de requerentes de asilo tornou-se mais flexível. No entanto, os activistas dizem que fica aberta a porta para abusos dos direitos dos migrantes consagrados em tratados internacionais. “Há tanta margem para interpretação pelos Estados-membros que isto poderá ser invocado sem limites para permitir pusbacks maciços sem que haja qualquer tipo de responsabilização”, escreve Barker.
O relatório também alerta para a crescente criminalização do trabalho dos activistas que tentam apoiar os migrantes e requerentes de asilo que chegam às fronteiras da UE. Há relatos de intimidação de pessoas que trabalham com ONG por parte dos governos de alguns países e até de campanhas públicas de difamação.