Reservas da Biosfera: faróis rumo à resiliência e preservação da biodiversidade
Os impactos associados às alterações climáticas e à perda de biodiversidade evidenciam a necessidade de um modelo de desenvolvimento diferente do que se tem vindo a seguir nas últimas décadas. As crescentes vulnerabilidades da comunidade global, face à finitude e deterioração das condições naturais e da capacidade de regeneração do planeta, impõem uma urgência que parece não ter ainda merecido reconhecimento adequado.
No que se refere à componente da biodiversidade e ecossistemas, em particular, ignora-se olimpicamente o facto de cada espécie que se extingue ser um evento único e irrepetível, uma construção genética e funcional única que, desaparecendo, não é passível de substituição. Ao contrário de uma molécula de dióxido de carbono que é igual esteja onde estiver, cada espécie é única e irrepetível, uma perda irreparável e não compensável.
Conservar a natureza e a biodiversidade não pode continuar a ser visto como um luxo, capricho ou “apenas” um imperativo ético ou moral. A natureza é fundamental para o desenvolvimento - seja este entendido na perspectiva mais difusa da sustentabilidade, seja na versão mais simplista do crescimento económico. A biodiversidade é um pilar do desenvolvimento e do crescimento económico, e o investimento na sua conservação e utilização sustentável é fundamental para a qualidade de vida, segurança e bem-estar da espécie humana.
Há mais de cinquenta anos que as Reservas da Biosfera da UNESCO têm vindo a apelar à necessidade de integrar a conservação da natureza e biodiversidade nos modelos de desenvolvimento à escala local, associando também a identidade paisagística, cultural, patrimonial e histórica destes territórios, o conhecimento científico, a educação e, não menos importante, a participação.
Actualmente, integram na rede Mundial de Reservas da Biosfera da UNESCO, 738 territórios em 134 países, incluindo 22 Reservas da Biosfera transfronteiriças. Trata-se da maior rede mundial de espaços classificados que, a nível nacional, incluem áreas protegidas e áreas de desenvolvimento socioeconómico. Mais de 270 milhões de pessoas vivem em Reservas da Biosfera da UNESCO. A importância e visibilidade crescente destes sítios mereceram o reconhecimento, em 2021, com a dedicação do dia 3 de Novembro como o dia Internacional das Reservas da Biosfera da UNESCO, cuja primeira comemoração ocorreu este ano.
Estes locais estão sob jurisdição nacional, mas cooperam entre si na partilha de ideias, experiências, projectos e acções, a nível regional, nacional e internacional. As Reservas da Biosfera, de acordo com o quadro estatutário do Programa O Homem e a Biosfera, obrigam-se a promover a conservação da natureza e do património histórico e cultural, o conhecimento e o desenvolvimento socioeconómico. O diálogo e concertação em torno destas funções são imperativos e transformam estes territórios em laboratórios vivos de debate e experimentação de abordagens inovadoras, à escala local, do desenvolvimento sustentável. Os sucessos e fracassos são partilhados entre Reservas da Biosfera, no seio das redes geográficas e temáticas como são os casos das Rede Iberoamericana e Europeia de Reservas da Biosfera que permitem a transferência de conhecimento entre realidades distintas e distantes.
Em Portugal, 12 Reservas da Biosfera da UNESCO dão expressão a este compromisso que se estende a outas 12 reservas espalhadas por diferentes países da CPLP e que, recentemente, se reuniram em torno da nova rede de Reservas da Biosfera da CPLP e que, juntamente com a CPLP, entidades governativas locais e nacionais, universidades e organizações da sociedade civil, se comprometem a continuar a procurar soluções, caminhos alternativos, capazes de ajudar a reconciliação entre a espécie humana e o planeta e, com isso, olhar o futuro com esperança e responsabilidade.
Enquanto territórios guardiões de uma importante biodiversidade e onde vivem pessoas conscientes e comprometidas com a sustentabilidade, as Reservas da Biosfera da UNESCO assumem-se como faróis de uma navegação colectiva rumo a um mundo mais digno das gerações vindouras e da própria história maravilhosa da espécie humana.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico.