De vez em quando, como aconteceu recentemente, descobrem-se casos terríveis de imigrantes isolados, espoliados e tratados como escravos nos campos onde o trabalho sazonal é assegurado exclusivamente por um exército de trabalhadores reduzidos a pouco mais do que à sua “vida nua”. Nestas histórias sinistras cujo enredo segue um modelo narrativo com poucas variações, há uma topologia recorrente: em Portugal, são os olivais intensivos do distrito de Beja e as estufas no litoral alentejano; em Itália, são os campos de tomate, no sul, mantendo-se aí uma tradição – as mãos poderosas da mafia na economia agrária desta região – que atravessa gerações. No entanto, nem o azeite português nem o pomodoro italiano estão sujeitos a regras comerciais de precaução ética e ecológica, para que a boa consciência dos consumidores não sofra ofensas, como aquelas que estão estampadas nas embalagens do café Sical (Nestlé Portugal) e começam a estender-se a produtos vindos de lugares longínquos e suspeitos: “Promovemos um cultivo responsável e sustentável. Incentivamos o respeito pelas pessoas que o cultivam, pelas comunidades e pelo planeta”. O azeite – está escrito nos rótulos e ninguém duvida – é virgem, ou mesmo extra-virgem, e o pomodoro tem a cor e o sabor do orgulho italiano, da sua civilização.
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