“Simplesmente perdi a cabeça”, diz Will Smith a Trevor Noah sobre o estalo dos Óscares
Primeira ida a um programa de late night foi uma espécie de confessionário para o actor que tem agora de promover o seu novo filme, Emancipation, prestes a estrear-se na Apple TV+.
“Simplesmente perdi a cabeça”, disse Will Smith sobre a bofetada desferida contra o comediante Chris Rock no palco dos Óscares no final de Março. O actor norte-americano Will Smith voltou segunda-feira às entrevistas de grande visibilidade no programa Daily Show With Trevor Noah, um dos comentadores/humoristas que se mostrara mais compreensivo sobre o caso na altura. “Pessoas magoadas magoam pessoas”, disse ainda Smith, que está a cumprir a difícil tarefa de promover o seu novo filme, Emancipation.
É o primeiro projecto de relevo do actor caído em desgraça após “o estalo”, como ficou conhecida a agressão cometida em directo para milhões de espectadores, e é uma das primeiras vezes que Smith fala na televisão sobre o tema. Falou ao canal Fox 5 no mesmo dia, manifestando esperança de que a sua nova reputação não manche a do filme e “penalize” a sua equipa.
No programa da Comedy Central, o actor descreveu “uma noite horrenda” e continuou: “[Há] muitas nuances e complexidades envolvidas, sabes, mas no fim de contas, eu simplesmente, perdi a cabeça, sabes”, disse o actor ao humorista sul-africano. “Acho que se pode dizer que nunca se sabe o que se está a passar com alguém.”
Emancipation estreia-se a 9 de Dezembro no serviço de streaming Apple TV+ e é um trabalho de Antoine Fuqua envolto em grandes expectativas de Óscares — nomeadamente para Smith, visto que interpreta o papel de um escravo foragido, Peter, que se junta ao Exército da União e cuja imagem das suas costas e das marcas da escravatura nelas, profundas cicatrizes e escarificações, acabou por se tornar no símbolo da tomada de consciência da América quanto à barbárie cometida pelos esclavagistas e seus capatazes.
Escolher a data de estreia do filme e promovê-lo deixou de ser uma tarefa meramente de estratégia de distribuição, exibição e promoção com vista à elegibilidade para os Óscares e sim uma operação feita com pinças dado que o tema da agressão seria um obstáculo intransponível na conversa sobre Emancipation. Mais: na esteira da indignação mundial em torno da bofetada, Smith afastou-se da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood e esta, no âmbito de um processo disciplinar, baniu-o de estar presente em qualquer evento por ela promovido, nomeadamente os Óscares.
O que não significa que o actor não possa ser premiado, mas a conversa (ainda) não é essa. Will Smith foi confessar-se a Trevor Noah, no fundo, visto que noutras (escassas) entrevistas sobre o filme, como a dada à revista Vanity Fair, não respondeu a questões sobre o incidente com Chris Rock. E disse: “Pergunta-me o que aprendi? Foi que temos de ser simpáticos uns para os outros”; “É difícil”; “O que foi mais doloroso para mim é que peguei no meu ‘difícil’ e tornei-o ‘difícil’ para outras pessoas”; “compreendi a ideia de que pessoas magoadas magoam pessoas”.
“Muitas coisas [estiveram envolvidas]. Foi o rapazinho que viu o pai bater na mãe, é o que conheces, sabes, e tudo isso veio ao de cima naquele momento. Não é quem eu quero ser.” Will Smith cresceu num lar marcado pela violência doméstica, algo que já tinha sido tornado público e que consta até da sua recente autobiografia.
Sem detalhar, Will Smith diz que estava a ter um problema nessa noite, mas que tal “não justifica de todo” o seu comportamento. “Sempre quis ser o Super-Homem”, diz a certa altura sobre a sua reflexão sobre o que significa ser humano e não um homem cheio de ideais de força e superação. “Sempre quis entrar e salvar a donzela em apuros. E tive de me tornar humilde, e perceber que sou um humano com falhas e que ainda tenho a oportunidade de contribuir com algo [bom] para o mundo de uma forma que preencha o meu coração e que, espero, ajude outras pessoas.”
Antoine Fuqua disse à Vanity Fair que a estreia do filme nunca esteve em causa e que o plano sempre foi avançar. A conversa nunca foi “sobre o filme não sair”, explicou, mas sim sobre a “avaliação de tudo” e “do que as pessoas estão a dizer”, gerindo as expectativas e o sentimento geral do público e da indústria quanto ao actor.
Will Smith esbofeteou Chris Rock em palco na madrugada de 28 de Março deste ano após uma piada espontânea do humorista sobre a cabeça rapada de Jada Pinkett Smith, mulher do actor. A actriz sofre de alopecia, uma doença auto-imune que provoca a perda de cabelo, e Will Smith levantou-se repentinamente de um dos lugares frente ao palco — era nomeado para o Óscar de Melhor Actor por King Richard: Para Além do Jogo. Agrediu Rock, num momento que deixou a audiência incrédula, e o espectáculo continuou. Minutos mais tarde, Smith subia ao mesmo palco para receber o Óscar de Melhor Actor e fez um discurso emocionado em que pediu desculpas a muita gente, mas não a Rock.
Fá-lo-ia um dia mais tarde, em vídeo, no início de cerca de duas semanas em que o acto era uma das questões mais discutidas mundo fora.