Casa da Música regressa à Alemanha e olha para o planeta Terra
Integral das sinfonias de Robert Schumann, um novo ciclo com grandes concertos virtuosos e várias estreias mundiais e nacionais na programação para 2023.
A Casa da Música vai regressar à Alemanha em 2023, com a Orquestra Sinfónica do Porto a interpretar a integral das sinfonias de Robert Schumann, o lançamento de um novo ciclo, Grandes Concertos Virtuosos, que decorrerá ao longo do ano, e a apresentação, em Setembro, de uma nova narrativa de temática ambiental, intitulada Vista do espaço, a Terra era azul.
Estas são as novidades e algumas das linhas de força da programação da instituição portuense para o próximo ano, apresentada esta terça-feira pela direcção artística encimada por António Jorge Pacheco.
O regresso ao país tema e, neste caso, ao património musical alemão – que se segue ao que foi feito já anteriormente com países como a Áustria, a França e a Itália – foi apresentado pelo director artístico da Casa como “uma questão de coerência programática” perante “uma das potências maiores da música”, que vai agora ser revisitada, oito anos depois, desde o Renascimento aos nossos dias, numa acção de aprofundamento e contextualização a partir dos dias de hoje.
É nesse sentido que é justificada a escolha do compositor e maestro Enno Poppe (n.1969) como artista em residência, “uma figura consagrada, brilhante, e que se encontra no auge da sua carreira internacional”, nota António Jorge Pacheco. No habitual contraponto nacional, João Caldas (n. 1995) será o jovem compositor em residência.
Enno Poppe, que por várias vezes se fez já ouvir na Casa do Música, estará logo no programa de abertura, Made in Germany (13 a 29 de Janeiro), dirigindo, no dia 22, o Remix na estreia portuguesa da sua peça Speicher, para grande ensemble.
No lançamento oficial do Ano Alemanha, destaque ainda para os regressos do cravista Andreas Staier, a dirigir a Orquestra Barroca e a tocar Bach e Händel (dia 14), e de Heiner Goebbels, com a Sinfónica do Porto (OSP), a fazer também a estreia nacional da sua peça A House of Call. My Imaginary Notebook (dia 21).
Quatro sinfonias de Schumann
A Sinfónica iniciará a execução das quatro sinfonias de Robert Schumann (1810-1856), logo com a n.º 1, no âmbito do ciclo Música e Mito (4 a 10 de Março), sempre sob a direcção de Christian Zacharias, que desde há dois anos é o maestro convidado principal da OSP.
Rui Pereira, adjunto da direcção artística e coordenador da Sinfónica, destacou neste ciclo, como um dos acontecimentos da temporada, a apresentação da ópera de Richard Strauss Elektra, com a soprano alemã Christiane Libor no principal papel.
Coube também a Rui Pereira fazer a apresentação do Ciclo de Piano, de que é o programador: além do “residente” Grigory Sokolov (22 de Março), a agenda de 2023 terá sete outros intérpretes, entre os quais os jovens portugueses Thiago Tortaro (10 de Janeiro), 16 anos, finalista no último Prémio Jovens Artistas; e Pedro Borges (17 de Outubro), vencedor do Concurso Jovens Talentos Ageas/Casa da Música em 2019.
Numa selecção que continua a querer “dar a ouvir no Porto artistas relevantes do circuito internacional”, Rui Pereira realçou também a estreia em Portugal da pianista chinesa Zee Zee (21 de Maio) e, pela primeira vez juntos em palco, do duo Alexei Volodin & Claire Huangci (12 de Dezembro), estes a interpretarem conhecidas suites para dois pianos de Rachmaninoff.
Outros destaques
Em Fevereiro, no Invicta.Música.Filmes (dias 7 a 11), e depois do cancelamento deste ano por motivos técnicos, deveremos finalmente poder ver em estreia portuguesa o cine-concerto A Queda da Casa de Usher (1928), de Jean Epstein, com a nova banda sonora composta pelo espanhol José Maria Sanchez-Verdú.
A 17 de Março começa o ciclo de oito Grandes Concertos Virtuosos, com o violinista Marc Coppey a dirigir a OSP e a tocar o Concerto para violoncelo e orquestra, em Lá menor, de Schumann.
Em Abril (dias 22 e 23), Stockhausen and friends, da Escola de Darmstadt, estarão no centro do Música & Revolução. A obra daquele “compositor fulgurante, radical e revolucionário, que marcou a música no pós-Segunda Guerra Mundial”, lembrou António Jorge Pacheco, será ouvida em dois concertos do Remix Ensemble.
Maio (dias 12 a 14) é o mês para ouvir os jovens intérpretes do ECHO Rising Stars, representando as principais salas de concerto da Europa.
No final do Verão, chegará então a altura de olhar o planeta Terra a partir … da música. Vista do Espaço, a Terra era azul é o nome do novo ciclo (15 a 24 de Setembro). Desde a obra setecentista de Georg-Philip Telemann, Música aquática, e de A Tempestade, de Tchaikovski, até à estreia portuguesa do poema sinfónico And God created great whales (1970), de Alan Hovhaness, e Earth dances (1986), de Harrison Birtwistle, a Casa da Música propõe-se contribuir para o alerta e para a salvaguarda das condições de vida no planeta, acrescentando a uma série de cinco concertos uma campanha de acção ambiental junto de escolas portuenses.
Para o mais antigo ciclo, À Volta do Barroco (1 a 11 de Novembro), destaque para as presenças dos consagrados violinistas Fabio Biondi e Ilya Gringolts, a interpretarem respectivamente Mozart e Ligeti; mas também, pela primeira vez na Casa, numa associação da Sinfónica com os dois Coros, a cantarem os controversos Carmina Burana, baseados num manuscrito medieval germânico.
As três formações regressarão no Natal (dia 20 de Dezembro) para interpretarem a obra maior de Bach, Magnificat.
De Luísa Sobral a Cristina Branco
Como habitualmente, a programação não-erudita da Casa da Música – tema que tem motivado alguma controvérsia pública relativamente à política da actual equipa de programação – foi apresentada muito parcialmente, devido à necessidade de esperar pela definição das agendas dos artistas e dos seus promotores. Mas estão já agendadas, entre os músicos portugueses, concertos de Carlos Alberto Moniz (14 de Fevereiro), Luísa Sobral (18 de Fevereiro), António Zambujo & Yamandu Costa (8 de Março), Samuel Úria (21 de Março) e Cristina Branco (3 de Novembro)
Numa nota prévia à apresentação do programa, e lembrando as agendas próprias do circuito musical mais comercial, António Jorge Pacheco defendeu que a Casa da Música, como “instituição co-financiada pelo Estado e com uma missão fundamentalmente cultural, não deve entrar em concorrência com os promotores privados”. O que não significa não dar atenção e não acolher as outras músicas. E socorreu-se mesmo de números relativos a 2019 – “o último ano de programação normal, antes da pandemia”, notou – para o provar: nesse ano, a Casa da Música apresentou, entre a Sala Suggia e a Sala 2, 89 concertos eruditos e 181 de outros géneros, de um total que, com os concertos no café e noutros espaços, se aproximou dos 300 espectáculos.