Taliban proíbem entrada de mulheres nos jardins e parques de diversões

Decisão afasta as crianças afegãs, principalmente as meninas, dos poucos espaços de entretenimento e sociabilização que mantinham no Afeganistão dos taliban.

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Em Kandahar, a UNICEF financia aulas de literacia para raparigas numa escola improvisada EPA

Desde que os taliban regressaram ao poder, em Agosto do ano passado, as mulheres foram afastadas de muitas profissões, passaram a ter de cobrir o cabelo ou o rosto e foram impedidas de viajar sem um acompanhante masculino, até para percorrer distâncias relativamente curtas. Mas na maioria das províncias, continuavam autorizadas a entrar nos parques públicos, jardins e parques de diversões, mesmo que apenas em alguns dias da semana. A partir desta semana estão completamente banidas destes espaços públicos, uma medida que vai afastar as crianças afegãs (principalmente as meninas) de um dos poucos escapes à sua disposição.

“Durante os últimos 15 meses, tentámos o nosso melhor para tentar resolver e gerir isto – experimentámos até dias específicos”, disse Mohammad Akif Sadeq Mohajir, porta-voz do Ministério da Prevenção do Vício e da Promoção da Virtude, em declarações à agência de notícias AFP. “Mas ainda assim, em alguns lugares – de facto, em muitos lugares –, as regras eram violadas”, justificou. “Havia mistura [de homens e mulheres], [a regra] o hijab [lenço islâmico] não era cumprida, foi por isso que esta decisão foi tomada, por agora”, acrescentou.

“Por agora” é uma expressão frequentemente usada pelos radicais islâmicos quando anunciam alguma decisão sobre o que podem ou não podem fazer as mulheres e as raparigas afegãs. As alunas do secundário não foram oficialmente proibidas de ir à escola, essa questão foi sempre apresentada como não tendo ainda sido resolvida, como não tendo ainda sido possível “reunir as condições” para o seu regresso às aulas. Mas a verdade é que há 15 meses que as afegãs a partir da adolescência não têm aulas na maioria das regiões do país (para algumas, as escolas clandestinas são a alternativa).

“Não há escolas, não há trabalho… devíamos pelo menos ter um sítio onde nos pudéssemos divertir”, disse à AFP uma mãe, que pediu para ser identificada só como Wahida, sentada num restaurante de Cabul a ver os filhos brincar num parque através da janela. “Estávamos tão entusiasmadas… estamos cansadas de estar em casa”, afirmou Raihana, sentada na mesa ao lado, depois de ter ficado à porta do parque, onde tencionava passar o dia com as suas irmãs. “Obviamente, no islão, é permitido sair e visitar parques. Quando não temos nenhuma liberdade no nosso país, o que é que significa viver aqui?”, questionou a jovem de 22 anos, que estuda Direito Islâmico na universidade.

Em Agosto, a propósito do relatório Ponto de ruptura: As vidas das crianças depois de um ano sob domínio dos taliban, publicado pela Save the Children, Sacha Myers dizia ao PÚBLICO que a ONG estava “extremamente” preocupada com os efeitos do fim da maioria das actividades de entretenimento e sociabilização nas crianças afegãs. Aos parques e jardins já iam pouco, notou a responsável de media da ONG, devido “à confusão sobre o que é e não é autorizado às mulheres”. Ao mesmo tempo, afirmou, “como as famílias não têm dinheiro, deixaram de se convidar umas às outras para as refeições” ou de fazer “festas de casamento”, por exemplo.

Segundo dados desta organização não-governamental, 97% das famílias já enfrentavam dificuldades para dar aos filhos comida suficiente e quase 80% das crianças ouvidas para o relatório contavam ter ido deitar-se com fome nos 30 dias anteriores. As meninas tinham quase o dobro das probabilidades de irem frequentemente para a cama com fome, tal como são elas as que acabam por passar mais tempo fechadas em casa, sem possibilidade de brincar e de conviver com outras crianças.

Em Agosto, a UNICEF estimava que cinco milhões de crianças precisariam de apoio de saúde mental no país, mas o trabalho de campo da Save the Children levava Myers a afirmar que o número real seria “muito maior”. Mais de um quarto dos pais ouvidos pela ONG descrevia sinais de depressão e de ansiedade nas filhas.

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