Países ricos, países em desenvolvimento, dívida externa, perdas e danos, China e Estados Unidos, a procura de um acordo de cooperação entre os grandes emissores de gases com efeito de estufa. Vamos ouvir falar muito destas ideias durante duas semanas na Cimeira do Clima, em Sharm el-Sheikh, no Egipto. Aqui ficam alguns protagonistas:
Acompanhe a COP27 no Azul
A Cimeira do Clima das Nações Unidas é o ponto mais alto da diplomacia em torno das alterações climáticas, onde os países discutem como travar as emissões de gases com efeito de estufa que causam o aquecimento global. Este ano é no Egipto, de 6 a 18 de Novembro. Acompanhe aqui a Cimeira do Clima.
John Kerry
Muito do que se passar em Sharm el-Sheikh será em torno do enviado especial do Presidente dos Estados Unidos para o clima. Tem para apresentar de novo o pacote legislativo norte-americano da Administração de Joe Biden com grandes incentivos para as energias renováveis. Estima-se que se posto em prática na totalidade, levaria a uma redução de 40% nas emissões dos EUA – mas isso ainda fica aquém do compromisso do país, que é de fazer um corte de 50% a 52% até 2030.
Esta cimeira ocorre num contexto geopolítico complicado, com a guerra da Rússia contra a Ucrânia, que exigirá muito da diplomacia. Mas é preciso muito esforço também na relação entre a China e os Estados Unidos que, juntos, representam perto de 40% das emissões mundiais de dióxido de carbono. No ano passado, os dois países tinham concordado em colaborar para reduzir as emissões – e muito dessa decisão se deve ao facto de Kerry e o veterano negociador chinês, Xie Zhenhua, terem uma boa relação, de que o norte-americano fala como “uma amizade de 25 anos”. Mas a tensão por causa de Taiwan suspendeu a boa-vontade.
“No entanto, este não é um assunto bilateral, nem ideológico, é multilateral, temos de juntar todas as vozes do mundo”, disse Kerry numa recente passagem pelo think tank britânico Chatham House.
Xie Zhenhua
É o representante especial da China para as alterações climáticas desde 2015 e lidera a delegação chinesa à cimeiras do clima das Nações Unidas desde 2007. A sua larga experiência na diplomacia climática pode, no entanto, não chegar para ultrapassar o enregelamento das relações entre os Estados Unidos e a China após a visita da presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, a Taiwan, num ano de tensão geopolítica por causa da guerra da Rússia contra a Ucrânia.
A China tem feito grandes progressos nas energias renováveis – em 2025 devem representar 36% do consumo de electricidade, segundo um relatório da agência de rating Standard % Poor’s. Ainda assim, a sua meta para atingir a neutralidade carbónica é apenas 2060.
Lula da Silva
O Presidente-eleito do Brasil foi convidado a ir à COP27 pelo seu homólogo egípcio, e deverá viajar para Sharm el-Sheikh enquadrado numa delegação da Amazónia, que tem tido recordes de desflorestação durante o Governo de Jair Bolsonaro. Lula prometeu pôr a protecção da floresta no coração da sua política económica.
Lula da Silva poderá ser o motor de uma aliança dos países mais ricos em florestas tropicais, juntamente com a Indonésia e a República Democrática do Congo, que enfrentam ameaças semelhantes, sugeriu em declarações à Reuters Annisa Rahmawati, líder do grupo de conservação da natureza Satya Bumi.
“Ter uma voz tão forte como a de Lula em qualquer futura aliança amplificaria e aceleraria os esforços para avançar para um desenvolvimento que não agrida o clima, e que proteja as nossas florestas”, disse Annisa Rahmawati.
Estes três países fazem parte de um grupo de 140 que no ano passado, na COP26, se comprometeu a reverter a desflorestação e degradação da terra até 2030, com o apoio de 19 mil milhões de dólares em financiamento público e privado. Este programa, no entanto, tem avançado muito lentamente.
António Guterres
O secretário-geral das Nações Unidas tem feito alertas constantes sobre as alterações climáticas, e chegou mesmo a classificar a falta de acção contra o aquecimento global como “um suicídio colectivo”. “No momento em que arranca a COP27, o nosso planeta está a enviar um sinal de sofrimento”, afirmou, no dia da abertura da Cimeira do Clima.
Tem apelado a que seja imposta uma taxa sobre os lucros inesperados às empresas de combustíveis fósseis, cujos rendimentos devido à crise energética com origem na invasão da Ucrânia pela Rússia, e as sanções que se seguiram. O dinheiro obtido dessa forma deveria ser distribuído aos países mais pobres e vulneráveis às alterações climáticas, que estão já a sofrer “perdas e danos” com os seus efeitos, como cheias, secas e grandes tempestades.
Guterres tem sido uma voz de defesa dos países em desenvolvimento, mas o seu poder face a grandes potências, como a Rússia, é limitado.
Sameh Shoukry
O ministro dos Negócios Estrangeiros egípcio e presidente da COP27 será responsável por liderar as negociações diplomáticas na cimeira, para tentar obter acordos – o Egipto quer que esta seja a cimeira “da implementação”, que daqui saiam medidas concretas.
Shoukry é um diplomata de carreira, desde 1984, que já foi embaixador nos Estados Unidos, de 2008 a 2012, e é ministro desde 2014. O Egipto, que tem um registo muito mau de direitos humanos – 60 mil presos políticos, e um blogger que foi uma figura da Primavera Árabe, Alaa Abd el-Fattah, a fazer greve de fome na prisão e já muito enfraquecido – está a apostar fortemente em obter sucesso diplomático com esta Cimeira do Clima.
Ursula von der Leyen, Charles Michel e Frans Timmermans
A União Europeia tem uma forte representação na COP27. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, vão falar no dia 8, no período dedicado aos discursos dos chefes de Estado e de Governo. Vão fazer um apelo à acção urgente para limitar as emissões de gases com efeito de estufa.
O bloco europeu tem tido as mais avançadas metas climáticas, mesmo durante os anos em que os Estados Unidos se afastaram do compromisso da redução de emissões. Mas a invasão da Ucrânia pela Rússia expôs a dependência energética europeia, e gerou uma corrida a combustíveis fósseis de fornecedores alternativos, e até mesmo a reabertura de algumas centrais a carvão este Inverno – embora essas emissões não reduzam as ambições climáticas da UE.
A equipa de negociação será liderada pelo vice-presidente executivo da Comissão Europeia, Frans Timmermans. A União Europeia apoiou a inclusão do tema das “perdas e danos” na agenda oficial da COP27, embora isso não queira dizer que esteja disposta a pagar indemnizações por desastres naturais. Apoia, sim, as negociações.
A UE é também favorável a duplicar o financiamento destinado a adaptação às alterações climáticas até 2025, tendo como referência os valores de 2019.
Simon Stiell
O novo secretário-executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas era ministro do Ambiente do Estado-ilha Granada, nas Caraíbas. Vem de um dos países que podem ser mais afectados pelas alterações do clima.
Diz ter três linhas de acção para a COP27. “A primeira é dar um impulso transformador para que seja de facto aplicado o Acordo de Paris e as negociações se centrem em acções concretas”, disse, na sessão inaugural. “A segunda é cimentar o progresso obtido nas áreas da mitigação, adaptação, finanças e ‘perdas e danos’, sendo que é necessário melhorar muito o financiamento para enfrentar os impactos das alterações climáticas”, enumerou.
O terceiro, finalmente, é garantir que os princípios da transparência e responsabilização atravessam todo o processo negocial das Nações Unidas sobre as alterações climáticas.
Mia Mottley
A primeira-ministra de Barbados apresentou uma proposta para reformar as instituições financeiras internacionais, nomeadamente o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, conhecida como Bridgetown Agenda.
O objectivo é reformar estas instituições de forma a lidar de forma mais eficiente com as crises gémeas do clima e da dívida externa, que pesam sobre os países mais vulneráveis às alterações climáticas.
O projecto foi apresentado inicialmente na Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, em Setembro, e desde então Mia Mottley tem andado a procurar apoios para a sua agenda. A COP27 é um dos locais onde esta discussão terá lugar.