Livro de BD apresenta aos jovens o ex-líbris do Porto: os Clérigos

Aproximar os mais novos da história da cidade ajuda a preservá-la, acredita o autor Germano Silva. Clérigos — História do ex-líbris da cidade do Porto é apresentado nesta sexta-feira, no Porto.

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A Torre dos Clérigos era o edifício mais alto de Portugal no século XVIII Nelson Garrido

A ideia foi de D. Américo Aguiar. O bispo auxiliar de Lisboa, na altura presidente da Irmandade dos Clérigos, queria contar aos mais jovens – e levar às escolas – a história dos Clérigos, o ex-líbris do Porto. A missão foi atribuída a Germano Silva, jornalista e investigador da história da cidade. Mas não só. Para conduzir a narrativa, recuperaram Tripinhas, uma personagem inventada há uns anos por D. Américo Aguiar, quando pediu, também a Germano, que tornasse a história da Santa Casa da Misericórdia acessível aos mais jovens.

A pandemia atrasou o projecto, mas não o cancelou. Clérigos – História do ex-líbris da cidade do Porto é apresentado nesta sexta-feira, às 16h00, na Igreja dos Clérigos. Além dos autores – Germano e o ilustrador Pedro Pires –, estarão presentes D. Américo Aguiar, o padre Manuel Fernando, actual presidente da Irmandade, e o também jornalista Pedro Olavo Simões, que terá honras de apresentação.

Germano Silva conhece de cor a história dos Clérigos – tem, aliás, um guia publicado sobre a torre e o conjunto arquitectónico da Irmandade, que começou a ser construído no início do século XVIII. Mas escrever para os mais novos tornava a incumbência mais complexa. Linguagem mais simples, enorme poder de síntese. “É diferente. Acaba por ser mais difícil”, graceja o homem com dezenas de obras sobre a cidade publicadas.

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Germano Silva tem dezenas de obras publicadas sobre o Porto Paulo Pimenta

O livro em banda desenhada obrigou ainda a um trabalho conjunto com Pedro Pires, ilustrador dos primeiros livros juvenis de Germano, sobre a Santa Casa da Misericórdia (contada em quatro volumes). O autor mais jovem não podia esquecer pormenores importantes. “Tem de dar a ideia de que uma Nossa Senhora do século XVIII não é Nossa Senhora de Fátima, saber que os paramentos dos padres eram diferentes naquela altura.”

Levar aos mais jovens a história do Porto é um caminho para a preservação da identidade da cidade. Nos seus passeios pela urbe, Germano Silva aumenta o seu optimismo. “Aparece muita gente nova.” Guias turísticos, estudantes, curiosos. Nas visitas, o jornalista, que completou 91 anos no mês passado, faz questão de ter um “sentido pedagógico”. E nota que conhecer a história da rua onde se vive, de uma casa ou de uma igreja cria laços importantes. “Passam a ter mais cuidado.”

As primeiras visitas de Germano Silva à Torre dos Clérigos foram por diversão e para tirar fotografias. Mas também motivadas por um policial dos anos 1930, da autoria de Campos Monteiro. A Sombra da Torre, obra raríssima hoje em dia, conta a “história mirabolante” de um sacristão que tinha morrido e do sino que continuou a tocar após a sua partida. Com a curiosidade aguçada pela narrativa, Germano fez questão de subir os 225 degraus do edifício projectado por Nicolau Nasoni – o arquitecto italiano que chegou ao Porto não para construir os Clérigos, mas para pintar a Sé.

A ideia de construir aquele que seria o ex-líbris do Porto surge ainda no século XVII, quando três confrarias da cidade se juntam para ajudar os clérigos mais desamparados. Naquele tempo, conta Germano, quem adoecia e não tinha dinheiro não tinha onde ser tratado. O hospital dos pobres, um dos mais bem apetrechados à época, funcionou durante 74 anos e só fechou portas porque surgiram alternativas como o Hospital de Santo António. O espaço, hoje museu, serviu posteriormente de casa para clérigos com actividade no Porto.

A igreja foi a primeira peça a ser construída. Na noite de 1 para 2 de Julho de 1732, as casas do Porto iluminaram-se e os sinos tocaram toda a noite. Da Rua das Flores, onde a Irmandade tinha sede, foi transportada a primeira pedra para a construção da igreja, no Campo das Malvas, um terreno doado.

A primeira missa celebrada na nova Igreja dos Clérigos decorreu a 28 de Julho de 1748 – embora os trabalhos ainda decorressem. E, conta o Tripinhas no livro, houve atrasos na empreitada devido a um suborno do pedreiro por parte de um abade que não queria concorrência.

Com 75,6 metros, a Torre dos Clérigos era o edifício mais alto de Portugal no século XVII. E isso tornou-a um atractivo. “Era avistada do alto-mar – não havia o casario nem as árvores da Cordoaria – e os navios orientavam-se por ela para entrar na barra”, conta Germano. A torre foi usada como telégrafo, anunciava o meio-dia com uma explosão de pólvora e foi até cenário para fazer publicidade a umas bolachas.

Estas e outras histórias são contadas por Tripinhas no livro (há versão em inglês também), com edição própria da Irmandade e à venda na loja dos Clérigos.

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