Pensão de 26 mil euros de Manuel Pinho congelada e bens apreendidos

Autoridades estiveram esta quinta-feira na quinta onde o ex-ministro se encontra em prisão domiciliária, em Braga, para lhe apreenderem bens.

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A quinta de Manuel Pinho está a ser alvo de buscas Daniel Rocha

Fotografias, quadros, garrafas de vinho e uma máquina de flippers foram alguns dos objectos apreendidos esta quinta-feira numa quinta onde vive o ex-ministro Manuel Pinho, em Braga, noticiou a SIC e confirmou o PÚBLICO.

A apreensão de bens ao antigo governante, que se encontra em prisão domiciliária desde Dezembro do ano passado, foi feita a pedido de um procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), no âmbito do caso das rendas da EDP. O Ministério Público avançou entretanto com o pedido de arresto da totalidade dos 26 mil euros brutos da pensão (quase 20 mil euros líquidos) de Pinho, que já foi decretado pelo juiz Carlos Alexandre.

A defesa do ex-ministro, a cargo do advogado Ricardo Sá Fernandes, já reagiu, criticando o Ministério Público, que diz apenas querer “humilhar” Manuel Pinho. E promete reagir “de todas as formas permitidas pela lei e pela deontologia” para anular o que diz serem “actos de prepotência”.

Num comunicado assinado pelo defensor este explica que quatro fotografias e dois quadros de Noronha da Costa (um artista contemporâneo português) que estavam em casa de Pinho já tinham sido apreendidos à ordem deste processo. Mas a guarda dos mesmos estava entregue ao próprio ex-ministro, como acontece em muitos casos destes. Agora, foram removidas para um depósito do Estado, de forma a acautelar a sua eventual dissipação.

Ricardo Sá Fernandes refere que foram ainda apreendidos esta quinta-feira — “como sendo supostos instrumentos ou vantagens dos crimes alegadamente cometidos” — garrafas de vinho, entre elas algumas que o próprio advogado ofereceu a Manuel Pinho, da sua produção própria. Do rol de bens apreendidos, destaca ainda um boneco de artesanato feito em barro, uma máquina de flippers e um saco com tacos de golfe.

Esta apreensão de bens é mais uma diligência do Ministério Público para assegurar que o ex-ministro vai reembolsar o Estado das vantagens de que terá beneficiado com os seis crimes que lhe são imputados. A investigação ainda não está concluída, mas o DCIAP tem pouco mais de um mês para a finalizar, sob pena de ter de libertar o antigo governante. Quando foi pedida a prisão preventiva de Manuel Pinho em Dezembro passado, os procuradores imputaram-lhe dois crimes de corrupção passiva, um de participação económica em negócio, outro de branqueamento de capitais e dois de fraude fiscal qualificada.

Em Fevereiro passado, o juiz Carlos Alexandre mandou apreender a maior parte dos 26 mil euros da pensão de Pinho e três imóveis em nome deste e uma dezena em nome da mulher, ambos arguidos no caso. Da pensão, o ex-ministro socialista ficou apenas com o equivalente a três salários mínimos (ou seja, 2115 euros), que o Ministério Público (MP) não podia apreender. No entanto, esta medida foi revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa no mês passado, por considerar que a pensão não era produto dos crimes que estão em investigação e que terão rendido ao ex-governante e à mulher mais de cinco milhões de euros.

Agora, o Ministério Público volta ao ataque, mas, desta vez, pede o arresto total da mesma pensão. Esta figura jurídica também tem uma função de garantia, mas não exige uma ligação directa com os crimes em análise.

Ricardo Sá Fernandes destaca que o pedido do MP foi feito logo no dia seguinte à decisão da Relação de Lisboa. “Sob a veste de uma investigação destinada a apurar a prática de actos de corrupção – o que merece todo o aplauso que se investigue –, aquilo que se passou hoje [esta quinta-feira] foi uma violação de regras básicas do Estado de Direito, com vista a apoucar e quebrar a dignidade do Dr. Manuel Pinho, no que mais parece constituir uma acção de retaliação por causa do que foi decidido pela Relação de Lisboa”, afirma o advogado, na nota enviada ao PÚBLICO.

E acrescenta: “Não há qualquer justificação para levantar de casa do Dr. Manuel Pinho fotografias e quadros que lá se encontravam apreendidos à ordem do tribunal, a não ser o propósito de o humilhar, uma vez que não havia quaisquer sinais de risco de descaminho dessas obras”.

É previsível que, quando acusar formalmente os suspeitos, o MP peça que os vários milhões de que considera que o casal beneficiou com os ilícitos sejam confiscados no âmbito da chamada “recuperação de activos”. O objectivo deste instrumento é retirar aos criminosos as vantagens que obtiveram com os crimes, fazendo reverter esse montante para o Estado.​

Em Fevereiro deste ano, para sustentar a necessidade de avançar com as apreensões, os procuradores realçavam que, já depois da detenção de Pinho, foi recebida pelo DCIAP a comunicação de várias operações suspeitas de transferência internacional de fundos, algumas concretizadas há vários anos. “Os arguidos movimentaram de forma questionável e para destinos por eles controlados, maioritariamente fora do território nacional, o valor global de 2.054.929 euros”, referia então o MP, que argumentava que adoptando medidas de garantia dos bens se impediria o casal Pinho de, entretanto, dissipar os bens que ainda tem em Portugal. O dinheiro, diz-se, foi transferido tanto para contas em nome de Manuel Pinho como para contas em nome da mulher ou de familiar desta, em Espanha, Alemanha e Brasil.

O antigo ministro da Economia Manuel Pinho — que exerceu funções governativas entre 2005 e 2009 — é suspeito de ter sido corrompido pelo então presidente executivo da EDP, António Mexia. O gestor é padrinho da filha mais nova de Pinho e ambos foram executivos no Banco Espírito Santo (BES), liderado por outro arguido deste caso, Ricardo Salgado, também ele, segundo a tese do Ministério Público, corruptor activo do antigo ministro de José Sócrates.

Recorde-se que o BES tinha uma participação qualificada na EDP, empresa que, segundo relatórios externos, terá sido beneficiada em cerca de 1200 milhões de euros pelos vários arguidos do caso. A maior parte (852 milhões) terá resultado do alegado baixo preço atribuído em 2007 à extensão da concessão, sem concurso público, de 27 barragens, que continuaram a ser exploradas pela EDP, e da sobrevalorização, nessa mesma altura, do valor acordado pelo fim antecipado dos 32 Contratos de Aquisição de Energia. Estes contratos tinham sido celebrados em 1996 para atrair investimento em centrais eléctricas de que o país precisava, mas que o Estado optou por não financiar.

Ricardo Salgado é suspeito de ter ordenado pagamentos mensais de quase 15 mil euros através da Espírito Santo Enterprises, conhecida como o saco azul do grupo Espírito Santo, que começou a transferir o dinheiro para uma offshore controlada por Pinho, já este era ministro da Economia. Só durante o mandato, Pinho recebeu mais de 500 mil euros, metade do que recebeu por esta via, já que a mensalidade continuou a ser paga até Junho de 2012. Em várias offshores, Pinho terá recebido um total de 2,1 milhões de euros alegadamente para favorecer o universo empresarial Espírito Santo.

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