Netanyahu protagoniza regresso vencendo eleição após dias de suspense
Bloco dos partidos que apoiaram o candidato do Likud tem a maioria graças à extrema-direita. Não é automático que esse seja o Governo.
Um dia responde em tribunal por acusações de corrupção e abuso de poder, no outro dia é eleito, de novo, primeiro-ministro de Israel: Benjamin Netanyahu conseguiu que o seu partido fosse o mais votado e que os partidos que o apoiaram ultrapassassem o número mágico de mais de 60 deputados, necessários para uma maioria no Parlamento de 120.
Depois de um suspense desde a noite de terça-feira, quando fecharam as urnas das quintas eleições legislativas em menos de quatro anos em Israel, até à tarde desta quinta-feira, quando eram contados os últimos votos por correio, tornou-se claro que Netanyahu era o vencedor e que poderá agora negociar uma coligação. O primeiro-ministro cessante, o centrista Yair Lapid, já telefonou a Netanyahu a dar-lhe os parabéns pela sua vitória, segundo o site Axios.
Com quem se coligará Netanyahu? O óbvio seria com os partidos que o apoiaram: o Sionismo Religioso, um partido de extrema-direita de Itamar Ben-Gvir, considerado kahanista (seguidor do rabino Meir Kahane, fundador do Kach, partido ilegalizado em 1994 e movimento na lista dos grupos terroristas de Israel e dos EUA), Bezalel Smotric, que se descreve como um “orgulhoso homofóbico”, e os partidos religiosos ultra-ortodoxos Shas e Judaísmo Unido da Torá (JUT).
A aliança entre Ben-Gvir e Smotrich foi uma ideia do próprio Netanyahu, para evitar desperdiçar votos da direita radical, extremista e religiosa que não fossem para o Shas ou JUT, nas eleições anteriores, já que havia o risco de ficarem abaixo dos 3,25% necessários para entrar no Parlamento. Ironicamente, a sua subida meteórica deixa Netanyahu com um problema, já que ter, como admitiu, Ben-Gvir como ministro seria um problema para a posição internacional de Israel.
Esta coligação também traria a Netanyahu a vantagem de permitir uma reforma judicial que o deixasse liberto do processo que enfrenta por corrupção. Mas o político do Likud tenta sempre ter um partido moderado como parceiro na coligação, para servir de mediador entre dois campos, escreve Anshell Pfeffer no Haaretz. Pfeffer lembra ainda que raras vezes as formações de governo de Netanyahu correm sem surpresas.
Pfeffer acha que, desta vez, Netanyahu deverá fazer mesmo uma coligação com os aliados naturais primeiro, levar a cabo a reforma judicial, e depois deixá-los cair. Um dos elementos-chave é o tempo: partindo da oposição, Netayahu quererá tomar posse depressa. Mas Pfeffer arrisca que, se o Governo com Ben-Gvir e Smotrich for em frente, a questão não será se Netanyahu os acabará por afastar (juntos ou depois de os dividir), mas quando. Desde que esteja cumprida a reforma do sistema judicial que o Sionismo Religioso apresentou em detalhe durante a campanha, que pretende diminuir o poder do Supremo Tribunal e de outros organismos judiciais.
Para a especialista em análise política Dahlia Scheindlin, “este pode ser o ponto de viragem, a machadada no sistema democrático de Israel”, disse à Foreign Policy. “É quase uma insistência protototalitária de que o sistema judicial é o inimigo do povo e que, em nome da ‘governação eficaz’, estes controlos têm de ser removidos.”
Outra especialista em política, Gayil Talshir, da Universidade Hebraica de Jerusalém, comentou à BBC que “Israel está a caminho de se tornar uma Hungria sob Orbán”, ou seja, uma autocracia com eleições.
Entre os primeiros líderes mundiais a congratular nesta quinta-feira Benjamin Netanyahu esteve o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, numa publicação no Twitter com uma fotografia mostrando um exemplar da recentemente publicada autobiografia de Netanyahu.
Quanto aos resultados eleitorais, no campo da esquerda, e dos partidos árabes israelitas, aconteceu exactamente o contrário do que com a aliança de Ben-Gvir e Smotrich: o partido de esquerda Meretz ficou fora do Parlamento, quando podia ter concorrido coligado com o Partido Trabalhista, também de esquerda, e o partido árabe Balad também ficou de fora, depois de ter recusado concorrer em conjunto com outros partidos árabes. Se tivessem entrado no Parlamento, os deputados destes partidos negariam a maioria ao bloco de Netanyahu, sublinha Amir Tibon no Haaretz.