Bloqueios de apoiantes de Bolsonaro começam a ser desmantelados pela polícia
Presidente brasileiro mantém-se em silêncio, enquanto os ânimos de parte dos seus apoiantes se inflamam. Trabalhadores Sem Tecto convocam militantes para desmantelar bloqueios rodoviários.
O Brasil parece estar a enfrentar o infame “terceiro turno”, tal como preconizado pelo Presidente Jair Bolsonaro, que, mais de 30 horas após a derrota eleitoral, continua sem fazer qualquer comentário à situação política. O país despertou com bloqueios rodoviários em quase todos os estados e voos cancelados no principal aeroporto. Sob ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), a polícia começou a desobstruir algumas das estradas.
A tropa de choque da Polícia Militar (PM) está na rodovia Castello Branco, em São Paulo, para retirar os manifestantes e desobstruir a via #LiveCNNBrasil #CNNnasEleições pic.twitter.com/vy08yQ5ZRi
— CNN Brasil (@CNNBrasil) November 1, 2022
Milhares de apoiantes de Bolsonaro mantêm o desafio às autoridades, bloqueando estradas um pouco por todo o país, dois dias depois das eleições que ditaram a derrota do actual Presidente. Em conjunto com camionistas – uma classe que é um dos pilares de apoio social da extrema-direita brasileira – alguns automobilistas concentraram-se em auto-estradas em pelo menos 23 estados e no Distrito Federal, sobretudo nas regiões do Sul e do Centro-Oeste, onde o apoio a Bolsonaro é maior.
Ao início da manhã, a cidade de São Paulo chegou a registar 162 quilómetros de engarrafamentos em várias estradas e vias de acesso à metrópole. Pelo menos 25 voos tiveram de ser cancelados no Aeroporto Internacional de São Paulo em Guarulhos, nos arredores de São Paulo, por causa dos bloqueios na principal auto-estrada que liga a cidade ao aeroporto.
No maior estado brasileiro, o governo estadual deu ordem à Polícia Militar para enviar a tropa de choque para desbloquear as vias de acesso à cidade de São Paulo. O governador Rodrigo Garcia não descartou o recurso ao uso da força para desimpedir as estradas e fixou multas de cem mil reais (quase 20 mil euros) por hora para os automobilistas que mantenham as vias ocupadas.
Segundo a imprensa brasileira, a paralisação rodoviária terá sido organizada através de grupos de Whatsapp pró-Bolsonaro ao longo das últimas semanas como forma de pressão sobre as instituições democráticas em caso de uma derrota do actual Presidente.
O recrudescimento da situação levou o Supremo Tribunal Federal a dar ordens à Polícia Rodoviária Federal (PRF) para que avance para a desobstrução de todas as estradas ocupadas. Em vários pontos do país, as autoridades policiais conseguiram desmantelar os bloqueios rodoviários, embora os manifestantes permaneçam nas bermas em muitos destes locais. Em conferência de imprensa ao final da manhã, a PRF revelou que mais de 300 pontos foram desbloqueados.
A polícia rodoviária tem sido acusada de adoptar uma postura pouco actuante perante os bloqueios organizados pelos partidários de Bolsonaro. No dia das eleições, a PRF realizou várias operações de trânsito que atrasaram o transporte de eleitores, sobretudo em estados onde o apoio a Lula da Silva era maior. As autoridades eleitorais haviam emitido directivas para que essas operações não fossem realizadas durante o dia das eleições.
Citando a “complacência” da PRF, o Movimento dos Trabalhadores Sem Tecto (MTST) anunciou que vai enviar milhares de militantes para os pontos que se encontram bloqueados, de acordo com informações da Folha de S. Paulo. “A coordenação nacional do MTST orienta a sua militância nos estados a organizar manifestações para desbloquear as principais vias de acesso, exigindo o respeito pelo resultado eleitoral. Esperamos ser tão bem recebidos pelas forças de segurança quanto os bolsonaristas estão sendo”, lê-se na nota citada pelo jornal.
Mais de 30 horas após a confirmação dos resultados eleitorais, Bolsonaro continua sem reagir à sua derrota, aumentando o clima de incerteza e apreensão vivido no Brasil. Na segunda-feira, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, tinha avançado que o chefe de Estado iria fazer uma declaração esta terça-feira e que não iria contestar os resultados.
Bolsonaro passou o dia em reuniões com alguns membros do seu Governo e correu a notícia de que tinha pedido um encontro com os juízes do STF antes de se pronunciar. Os membros do principal tribunal brasileiro rejeitaram aceder ao pedido do Presidente antes de haver um reconhecimento público dos resultados.
Durante meses, Bolsonaro alimentou a dúvida quanto à possibilidade de vir a rejeitar uma eventual derrota contra Lula da Silva. O Presidente tem levantado dúvidas sobre a imunidade do sistema de voto electrónico a fraudes e, a poucos dias das eleições, a sua campanha apresentou uma queixa de que a sua propaganda eleitoral não estaria a ter o mesmo espaço que a do seu adversário em rádios no Nordeste. As autoridades eleitorais não deram razão às alegações de Bolsonaro.
Sem reagir à derrota, Bolsonaro abre caminho para que uma parte dos seus apoiantes, convicta de que as eleições foram ilegítimas, organize protestos violentos como os que têm acontecido nos últimos dois dias.
Enquanto Bolsonaro mantém o silêncio, praticamente todos os seus aliados, sobretudo os que foram eleitos para cargos no Congresso ou nos governos dos estados, reconheceram os resultados e pediram a pacificação do país.