Número de vítimas nos festejos de Halloween em Seul sobe para 154. Mais de 4 mil desaparecidos

O Presidente sul-coreano prometeu uma “investigação aprofundada” para apurar as causas da tragédia ocorrida este sábado, com vários jovens espezinhados, sufocados e em pânico.

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Festejos deste sábado rapidamente se tornaram numa tragédia: pelo menos 153 pessoas, incluindo 22 estrangeiros, morreram esmagadas e sufocadas, e mais de 80 ficaram feridas JEON HEON-KYUN/EPA
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Autoridades de Seul reportam mais de 4 mil desaparecidos nos festejos de Halloween YONHAP/EPA
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O pânico espalhou-se por várias artérias à volta da rua onde ocorreram muitas das mortes, perto do Hamilton Hotel, com a polícia a ter dificuldade em controlar o mar de gente. Kim Hong-ji/REUTERS
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Na noite de sábado havia um forte contingente de socorristas desesperados, a tentar ajudar os jovens Kim Hong-ji/REUTERS

Pela primeira vez em três anos, o popular bairro de Itaewon, na capital da Coreia do Sul, preparava-se para celebrar o Halloween sem as restrições da pandemia, mas a noite de festejos deste sábado rapidamente se tornou numa tragédia: pelo menos 154 pessoas, incluindo 22 estrangeiros, morreram esmagadas e sufocadas, e mais de 149 ficaram feridas, 33 destas com gravidade. Até ao momento, pelo menos 141 das 154 vítimas mortais já foram identificadas, informaram as autoridades.

As vítimas são sobretudo adolescentes e jovens adultos, a maioria mulheres (mais de 90). Segundo o jornal The New York Times, o Governo de Seul diz ter o registo de mais de 4 mil pessoas desaparecidas.

O Presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeo, já prometeu uma “investigação aprofundada” para apurar as causas desta tragédia e anunciou o início de um período de luto nacional. Esta será a maior tragédia em tempo de paz na Coreia do Sul desde o naufrágio do Sewol, que vitimou quase 500 pessoas em 2014, a maioria estudantes.

Na sexta-feira à noite, as ruas estreitas e inclinadas de Itaewon - zona conhecida pela sua movida nocturna, com vários restaurantes, bares e discotecas - começaram a encher-se de uma multidão de jovens mascarados. O cenário de ruas apinhadas de gente repetiu-se e agravou-se na noite de sábado. Não houve um evento específico a atrair multidões, segundo as autoridades sul-coreanas, mas nas redes sociais multiplicaram-se os anúncios a eventos em bares e discotecas.

Poucos minutos antes das 22h30 (14h20 em Portugal Continental), gerou-se o caos: desconhece-se o que provocou o esmagamento de mais de uma centena de pessoas, mas testemunhas dizem que o pânico se espalhou por várias artérias à volta da rua onde ocorreram muitas das mortes, perto do Hamilton Hotel, com a polícia a ter dificuldade em controlar o mar de gente.

Imagens divulgadas nas redes sociais mostram ruas apinhadas, pessoas a tentar subir as paredes dos prédios, muitas a cair no chão empurradas pela força da multidão, num efeito dominó, sendo audíveis os gritos de pânico. “Uma pessoa junto a mim caiu e quem estava atrás de mim continuou a puxar-me para a frente. Depois mais gente começou a cair e ficámos amontoados uns em cima dos outros”, contou um estudante de 20 anos de Seul à agência Reuters. “Eu gritei às pessoas: ‘não empurrem! As pessoas estão a cair!’.”

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Como um tsunami

Segundo o jornal The Guardian, algumas reportagens dos meios de comunicação locais informaram que o esmagamento aconteceu após um grande número de pessoas ter corrido para um bar de Itaewon, depois de saber que uma celebridade não identificada visitava o local.

“Chegámos por volta das 22h00 para ir a um bar e vimos pessoas a cair na rua”, contou Moon Ju-young, de 21 anos, à Reuters. “Algumas estavam cheias de sangue, outras a gritar de dor.” Um estudante francês, que pediu para não ser identificado, disse que ficou preso na multidão durante hora e meia. “Queria ir para um local seguro, mas não era possível. Estava a ser empurrado por toda a gente e não conseguia fazer nada.” Acabou por escapar, sem ferimentos graves, referindo ainda à Reuters que havia um forte contingente de socorristas desesperados, a tentar ajudar os jovens.

O esmagamento foi “tipo uma onda de um tsunami”, contou Nuhyin Ahmed, 32 anos, ao The New York Times. Às 20h de sábado, a quantidade de pessoas já era demasiada para as ruas estreitas, cheias de bares. “Quase não houve controlo do número de pessoas”, afirmou este professor indiano, que tentou juntar-se à festa nas redondezas do Hamilton Hotel, a artéria principal das celebrações, com um grupo de amigos. Desistiram passados vinte minutos, e foram para outra rua nas redondezas. Mas mesmo aí viram “apenas quatro polícias” a tentar guiar a multidão que se adensava.

Nuhyin Ahmed e os amigos acabaram por voltar à rua principal dos festejos, e foi lá que sentiu que “a multidão parecia uma onda”, “com forças” a empurrarem-no para trás e para a frente. “Não conseguia perceber de onde vinham: se da frente, se de trás, se do meio. Era como se fosse uma onda de tsunami”, acrescentando que, no meio da multidão, dos gritos e da música aos berros, era difícil perceber a real gravidade do que se estava a passar.

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EPA/JEON HEON-KYUN

Corpos empilhados

Vídeos partilhados nas redes sociais mostram vários socorristas a realizarem reanimação cardiorrespiratória (RCP) em pessoas deitadas nas ruas e corpos empilhados junto a prédios, aparentemente inconscientes. Moon Ju-young disse que quem não foi apanhado no meio do caos também “contribuiu para a confusão”, ao tentar ultrapassar a barreira policial na esperança de socorrer os amigos. “Essas pessoas foram arrastadas pela polícia.”

As autoridades da capital da Coreia do Sul tinham previsões de que 100 mil pessoas iriam juntar-se aos festejos de Halloween, mas quem lá esteve diz não ter visto “polícias suficientes” face à quantidade de pessoas presentes. “São muitas as pessoas que costumam juntar-se todos os anos no Halloween, mas a última noite foi incomparável. Havia muito mais gente do que antes da covid-19. Não consegui identificar quem era polícia e quem estava ou não estava no meio da multidão”, disse uma jovem na casa dos 20 anos. “Consegui escapar, mas, se lá tivesse ficado mais uns minutos, não teria sobrevivido.”

As críticas às autoridades começam a multiplicar-se. Segundo um testemunho recolhido pelo The New York Times, uma adolescente de 14 anos ligou à polícia por duas vezes, antes de o cenário começar a agravar-se, mas a ajuda não chegou. Seo Na-yeon afirmou que, pelas 18h, a rua onde ocorreu a maioria das mortes já estava “completamente cheia de gente”.

Desde a manhã deste domingo que o Hannam Community Center, um centro comunitário em Seul, tem tentado ajudar familiares e amigos a localizarem jovens que estiveram no local da tragédia. Foi para lá que correram os pais de Shin Su-Bin. Por volta das 22h de sábado ligaram à filha, mal souberam do que se estava a passar em Itaewon. O telefone tocou durante horas. A jovem de 25 anos não dava sinais de vida.

“Por volta das cinco da manhã, um polícia atendeu o telefone da Su-Bin”, contou o primo ao The New York Times. O mesmo polícia, que encontrou o telefone no meio da rua, a tocar, aconselhou os pais da jovem a dirigirem-se ao Hannam Community Center para tentar obter informações sobre o paradeiro da filha. O seu nome não estava na lista inicial de vítimas, mas acabou por surgir na última contagem, quando as autoridades revelaram a subida do número de mortes.

Polícia procura respostas

Esta segunda-feira, os investigadores sul-coreanos começaram a vasculhar imagens de videovigilância das ruas da cidade e de várias habitações, bem como imagens e vídeos publicados nas redes sociais.

“Estamos a analisar imagens das câmaras de segurança para descobrir a causa exacta do acidente”, disse o investigador-chefe da polícia, Nam Gu-jun, aos jornalistas. “Continuaremos a interrogar mais testemunhas, incluindo funcionários de lojas próximas ao local ao acidente”.

Os moradores do bairro de Itaewon começaram a colocar crisântemos brancos, bebidas e velas num pequeno altar improvisado numa das saídas da estação de metro.

Jung Si-hoon colocou uma cruz de madeira no altar e disse que nada poderia ser feito para trazer de volta todos os jovens que tinham morrido. “Estas pobres pessoas, todas com idades semelhantes à dos meus netos... O que mais devemos dizer? Devemos orar por eles e desejar que descansem em paz”, disse à agência Reuters.

O primeiro-ministro, António Costa, transmitiu já uma mensagem de solidariedade: “Portugal está solidário com a Coreia do Sul e todos aqueles que foram afectados pelo incidente trágico ocorrido em Seul. As nossas sinceras condolências a todas as famílias que estão de luto pela perda dos seus entes queridos”, escreveu António Costa em português e em inglês na sua conta na rede social Twitter. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, enviou também ao chefe de Estado sul-coreano uma mensagem de condolências e solidariedade pela tragédia ocorrida nos festejos do Halloween.

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