Advogados pedem prisão da deputada bolsonarista Carla Zambelli
O pedido dirigido ao Supremo Tribunal Federal do Brasil surge na sequência do incidente em que a deputada bolsonarista perseguiu, de arma em punho, um homem negro no centro de São Paulo.
O Grupo Prerrogativas, colectivo formado por advogados, mas também professores e artistas, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil para formalizar a emissão de um mandato de prisão para Carla Zambelli. Este sábado, nas vésperas das eleições presidenciais, a deputada federal foi filmada a perseguir, de arma em punho, um homem negro pelas ruas de São Paulo, o jornalista Luan Araújo.
Segundo o jornal Folha de S.Paulo, o grupo de advogados quer que seja instaurado um inquérito policial à deputada do Partido Liberal, apoiante de Jair Bolsonaro, pelos alegados crimes de disparo de arma de fogo, ameaça e eventual lesão corporal. Pedem também a apreensão das armas de Zambelli e da sua equipa para perícia e suspensão do porte das respectivas armas – inclusive a do segurança da deputada, que disparou durante a perseguição, em plena rua.
A Polícia Civil comprovou que o segurança, ainda não identificado, disparou a arma, informa o jornal. Contudo, acabou por ser libertado, depois de ter pago uma fiança no valor do salário mínimo brasileiro (1212 reais, o que corresponde a 229 euros). De acordo com a própria Carla Zambelli, o segurança é um polícia militar que a costuma acompanhar.
No documento apresentado ao STF, o Grupo Prerrogativas defende que a deputada cometeu uma ilegalidade: a legislação eleitoral deixa claro que o porte de arma e de munição é proibido nas 24 horas que antecedem e sucedem os dias de votação. Segundo um decreto do Tribunal Superior Eleitoral aprovado em Setembro, o incumprimento desta regra pode levar a prisão em flagrante delito por porte ilegal.
Zambelli “constrangeu, ameaçou e humilhou um eleitor de candidato diverso”, afirmam ainda os advogados. “Tais condutas colocam em risco não só a vida e integridade de pessoas que apoiam candidaturas adversárias, mas o próprio processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito.” Nesse sentido, acrescentam, “a liberdade de Carla Zambelli coloca em risco a ordem pública e reforça a necessidade da decretação de sua prisão em flagrante”.
Após o incidente, à saída da esquadra, a deputada federal disse orgulhosamente que a sua arma não tinha sido apreendida e que este domingo a levaria quando fosse votar, por ter direito a porte federal. Afirmou também que usaria um colete de protecção e que está preparada para se proteger de eventuais ataques.
Zambelli argumenta que foi insultada e agredida por Luan Araújo, um jornalista de 32 anos, num restaurante onde almoçava com o filho. “Me empurraram no chão, um homem negro. Eles usaram um negro para vir para cima de mim”, disse. No entanto, os vídeos divulgados nas redes sociais e nos meios de comunicação social mostram que a deputada bolsonarista se desequilibra e cai sozinha, sem qualquer interacção física com Luan Araújo – que estava, aliás, a afastar-se de Zambelli e da sua comitiva no momento da queda. Por outro lado, os vídeos não deixam dúvidas de que o jornalista é perseguido e agredido, tendo já registado queixa por ameaça.
O presidente estadual da juventude socialista do Partido Democrático Trabalhista, João Guilherme Desenzi, testemunhou a perseguição e disse à Folha de S.Paulo que Zambelli também lhe apontou a arma. “Na hora que ela aponta a arma para ele [Luan Araújo], ela aponta para a minha cara também. Eu estava usando uma camiseta [com os números] 12+1”, contou Desenzi. “E depois voltou a apontar a arma para o homem.”
Este domingo Lula da Silva descreveu o comportamento de Carla Zambelli como “degradante”.
“Estamos lutando para ter um país civilizado e uma pessoa surge com uma arma atrás de um cidadão. Isso não é civilizado. A justiça proíbe qualquer um de andar armado, muito menos uma deputada”, acrescentou o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) às presidenciais brasileiras.
Este é o mais recente incidente a marcar aquela que foi uma das mais tensas e violentas campanhas eleitorais no Brasil. Na sexta-feira, um político do PT, Reginaldo Camilo dos Santos, conhecido como ‘Zezinho do PT’, foi morto a tiro também no estado de São Paulo.
Alguns comentadores brasileiros dizem que este episódio representa “mais um tiro no pé da campanha bolsonarista” e entra em total contradição com as supostas intenções de Bolsonaro em tornar o Brasil num país mais seguro, com menos violência nas ruas.
“O episódio em que a deputada Carla Zambelli persegue um homem desarmado pela rua em São Paulo (…) foi mais um tiro no pé da campanha bolsonarista. Assim como o atentado do ex-deputado Roberto Jefferson contra policiais no Rio, expôs a truculência perigosa dos apoiadores do Presidente e desarmou o discurso armamentista que baseou todo o governo Bolsonaro”, escreveu Marcos Strecker no site da revista IstoÉ.