Depois de “ataque maciço” no mar Negro, Rússia sai do acordo de exportação de cereais
Frota russa do mar Negro foi atacada no porto de Sebastopol, na Crimeia. Está suspenso o acordo que permitia o escoamento dos cereais ucranianos para os mercados internacionais.
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A Rússia decidiu suspender a sua participação no acordo de exportação de cereais da Ucrânia depois de responsabilizar “o regime de Kiev” por um “ataque terrorista” contra a sua frota naval estacionada no mar Negro.
O Ministério russo da Defesa diz que os ucranianos lançaram um ataque com drones aéreos e marítimos na madrugada deste sábado contra navios militares e civis que se encontravam ao largo de Sebastopol, na Crimeia anexada, incluindo cargueiros envolvidos na execução do acordo. Afirma ainda, num comunicado citado pela agência Tass, que “o acto terrorista e o treino de pessoal militar (…) foram feitos sob orientação de especialistas britânicos”.
“Tendo em conta o acto de terrorismo cometido pelo regime de Kiev com a participação de especialistas britânicos”, acrescenta outro comunicado do ministério, “a Rússia suspende a sua participação na implementação dos acordos sobre exportações de produtos agrícolas a partir dos portos ucranianos”.
A decisão surgiu poucas horas depois de o secretário-geral da ONU ter sublinhado a “urgência” de renovar o acordo, que expira a 19 de Novembro. “Se a comida e os fertilizantes não chegarem agora aos mercados globais, os agricultores não terão fertilizantes no momento certo e a um preço que possam pagar na época de plantações, pondo em perigo as colheitas em todas as zonas do globo em 2023 e 2024, com um efeito dramático na produção alimentar e nos seus preços”, dissera António Guterres através de um comunicado do seu porta-voz.
O mesmo porta-voz, a meio da tarde de sábado, veio garantir que as Nações Unidas estão em contacto com as autoridades russas. “É vital que todas as partes se abstenham de qualquer acção que ponha em perigo a Iniciativa de Cereais do Mar Negro, que é um esforço humanitário essencial e que está claramente a ter um impacto positivo no acesso aos alimentos para milhões de pessoas em todo o mundo”, disse Stephane Dujarric à Reuters.
A Rússia, no entanto, não perdeu tempo. A Reuters diz ter tido acesso à carta que já seguiu para António Guterres e, segundo a qual, “a partir de hoje” está suspenso o acordo “por tempo indeterminado”.
A Ucrânia é um dos maiores produtores mundiais de milho, cevada e óleo de girassol, sendo ainda responsável, conjuntamente com a Rússia, por 30% da produção mundial de trigo. Segundo a ONU, o acordo assinado no fim de Julho e posto em prática em Agosto permitiu até agora escoar mais de nove milhões de toneladas de cereais, das cerca de 20 milhões que estavam retidas no país. A retoma das exportações evitou “que cerca de 100 milhões de pessoas caíssem numa situação de pobreza extrema”, sublinhou Guterres.
“Ataque maciço”
Ainda não é certo o que aconteceu realmente em Sebastopol. O Ministério da Defesa russo afirma que foram usados nove veículos aéreos não tripulados e sete veículos marítimos não tripulados num ataque que visou navios da Marinha “responsáveis por assegurar a segurança do corredor de cereais” e embarcações comerciais.
“Hoje assistimos ao ataque mais maciço de aeronaves não tripuladas e de drones de superfície controlados remotamente nas águas da baía de Sebastopol da história [da guerra]”, disse à agência Tass o governador da cidade, Mikhail Razvojaev. A Rússia afirma que destruiu todos os veículos aéreos antes de estes atingirem os seus alvos e que o ataque terminou com apenas pequenos danos num dos seus navios de guerra.
Como tem acontecido sempre que há ataques na Crimeia, o lado ucraniano não reivindicou a acção. Nas redes sociais circulam vídeos e fotografias alegadamente captadas por um dos veículos aquáticos na sua aproximação a um navio de guerra. Especialistas em análise de informações de fontes abertas (open source intelligence, ou OSINT) dizem que esse veículo se assemelha a um que foi encontrado numa praia de Sebastopol em Setembro, que até então nunca tinha sido visto e que, provavelmente, era operado pela Ucrânia.
Apesar do silêncio sobre o ataque propriamente dito, os responsáveis políticos ucranianos comentaram a decisão russa sobre o acordo de cereais. O ministro dos Negócios Estrangeiros, Dmitro Kuleba, disse que não passava de “um falso pretexto” e acusou a Rússia de fazer “jogos da fome”. Já o chefe de gabinete de Volodymyr Zelensky foi um pouco mais longe, acusando o inimigo de levar a cabo “ataques terroristas fictícios nas suas próprias instalações” e de fazer “chantagem” com o mundo.