INE: Pandemia prejudicou mais a cultura do que outras áreas da economia portuguesa

Quebra foi o dobro em relação às restantes actividades económicas nacionais, revelam os mais recentes dados da Conta Satélite da Cultura. Peso da cultura na economia caiu e consumo cultural das famílias decresceu 20%. Em 2018, sector representava cerca de 133 mil empregos.

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Entre 2019 e 2020, o consumo das famílias de serviços criativos, artísticos e de espectáculo caiu quase 79% Paulo Pimenta

A pandemia de covid-19 causou mais perdas para o sector da cultura do que para o resto da economia portuguesa, revelam esta quinta-feira os dados da Conta Satélite da Cultura divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). O peso da cultura na economia nacional caiu para 2,3% em 2020 e dos números relativos ao período entre 2018 e 2020 destaca-se ainda que o consumo cultural das famílias caiu 20%.

A Conta Satélite da Cultura foi criada em 2015, no governo PSD, em conjunto com o INE e permite obter, como escrevia em 2019 o ex-secretário de Estado da Cultura Jorge Barreto Xavier, “uma visão sistémica sobre o sector”. O Valor Acrescentado Bruto (VAB), ou o valor bruto da produção deduzido dos custos do processo produtivo, da cultura diminuiu 10,6% em comparação com a redução de 5,8% do conjunto das actividades económicas do país, indicam então os resultados divulgados esta quinta-feira.

Houve uma perda da importância relativa do sector cultural na economia nacional no período em análise, com a Cultura a pesar 2,4% na economia (o mesmo que a agricultura, silvicultura e pesca) para 2,3% em 2020 em termos de VAB. Existindo apenas dados actualizados em seis países da União Europeia, Portugal é aquele em que a Cultura tem menor peso na economia nacional.

Quebra nos consumos

O cenário, que afectou o planeta, é bem conhecido: em Março de 2020, com a declaração da existência de uma pandemia, as salas de espectáculo, dos teatros aos cinemas passando pelos espaços de concerto, foram encerrados, a par de outros equipamentos culturais como museus ou monumentos. As restrições à circulação nacional e internacional, bem como posteriormente ao número de utentes nos espaços reabertos, e os novos encerramentos numa fase posterior da pandemia, continuaram a afectar a actividade cultural de forma incontornável. Com a quebra de 1,1% nos rendimentos brutos disponíveis para as famílias, a situação agravou-se ainda mais.

É notório onde o efeito covid-19 foi mais sentido. Entre 2019 e 2020, o consumo das famílias de serviços criativos, artísticos e de espectáculo caiu quase 79% (de 295,1 milhões para 62,6 milhões de euros) e a sua produção quebrou 35,6%; no caso dos museus, bibliotecas ou arquivos, as famílias também reduziram em mais de 70% as suas visitas ou consumos (de 108,4 milhões de euros para 29,4 milhões em 2020).

Assinale-se que para já existem apenas dados concretos para o cenário no sector em 2018 e projecções macroeconómicas para os anos seguintes, avisa o INE, que partilha que em 2018 a Cultura gerou um VAB próximo de 4,183 mil milhões de euros e que representava cerca de 133 mil empregos — 2,8% do emprego total no país e 3,8% do emprego não remunerado (denominação que aqui representa os trabalhadores por conta própria). Ainda assim, “a remuneração média nas actividades da cultura foi superior (1,8%) à remuneração média da economia nacional”, escreve o INE no seu relatório.

É para já possível estimar que em 2019 o VAB gerado pela Cultura ascendeu aos 4,4 mil milhões de euros e que em 2020 caiu para os 3,9 mil milhões de euros. A Conta Satélite da Cultura revela ainda que entre 2019 e 2020 “o consumo das famílias de serviços de produção de filmes, vídeos, programas de televisão, gravação de som e edição de música diminuiu quase 54%”; a produção caiu 28,9% e as exportações 4,6%. No sector dos livros, a edição caiu 9,4% na produção, 17,3% no consumo das famílias e 20,6% nas exportações.

Voltando a 2018 e aos dados mais concretos que oferece, as artes do espectáculo eram o subsector mais representativo (31,1%), sendo que o audiovisual e multimédia e o interdisciplinar se destacaram “pela sua importância relativa na estrutura do VAB (24,8%) e do emprego (22,5%), respectivamente”, diz o INE. A produção e divulgação são as mais importantes ocupações na estrutura do emprego cultural (33,5%).

Nesse ano de 2018, o consumo de produtos culturais representou 2,6% do total das despesas das famílias (sobretudo livros, produtos informáticos, electrónicos ou serviços de telecomunicações) e 2,5% do consumo das administrações públicas.

Quanto à balança exportação-importação, em 2018 as exportações de bens e serviços culturais (sobretudo cinema, audiovisual e música) foram de 414 milhões de euros (0,5% do total das exportações) e as importações (sobretudo os produtos informáticos e electrónicos e depois os filmes, programas de TV e música) ascenderam a quase 1,5 mil milhões de euros, correspondendo a 1,7% do total. “Por conseguinte, o saldo do comércio externo de produtos culturais foi negativo em mais de 1,1 mil milhões de euros, contrariamente ao que se observou na economia, com saldo positivo de quase 950 milhões de euros” em 2018, sublinha o INE.

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