Projecto de 1,5 milhões de euros visa mitigar contaminação de fármacos no ambiente
Com uma bolsa do Conselho Europeu de Investigação, investigadores da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto estudarão as moléculas de um grupo específico de fármacos para produzir medicamentos mais seguros para o ambiente.
Investigadores da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) receberam um financiamento de 1,5 milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação para tentarem mitigar, durante os próximos cinco anos, a contaminação dos resíduos de fármacos nos ecossistemas ambientais.
“Estes fármacos chegam às estações de tratamento de águas residuais (ETAR) em concentrações pequenas e muitos acabam por ser degradados, mas há sempre uma fracção que chega às águas superficiais”, salienta, em declarações à agência Lusa, Ana Rita Lado, investigadora do Laboratório de Processos de Separação e Reacção (LSRE) do Departamento de Engenharia Química (DEQ) da FEUP.
Apesar de os compostos estarem presentes em concentrações baixas, os “efeitos colaterais” dos vários fármacos nos ecossistemas ainda não são totalmente conhecidos. “Se pensarmos no caso dos antibióticos, temos um problema adicional, que é a resistência a antibióticos pelas bactérias”, aponta Ana Rita Lado.
Nesse sentido, os investigadores vão, ao longo dos próximos cinco anos, debruçar-se sobre um grupo específico de fármacos quirais (presentes no ambiente em quantidades residuais), cujas moléculas, os enantiómeros, são “tridimensionalmente assimétricas” e apresentam duas configurações distintas.
“Se olharmos para um par de enantiómeros, podemos compará-lo com as nossas mãos direita e esquerda: um será a imagem do espelho do outro e os dois não são sobreponíveis”, esclarece.
De acordo com a investigadora, esta diferença faz com que os enantiómeros interajam de forma diferente com os “sectores biológicos”, podendo um desempenhar efeitos benéficos e outro efeitos prejudiciais.
“Se conseguirmos perceber qual das configurações de enantiómeros farmacologicamente activos tem menos efeitos ecotoxicológicos e é mais facilmente biodegradada no ambiente, aí estaremos no caminho de conseguir propor fármacos mais seguros”, salienta, dizendo que esse fim pode ser conseguido através da “diminuição ou eliminação” de uma das configurações.
O objectivo da investigação é, por isso, perceber qual das configurações “se degrada melhor” e “tem menos possibilidade de desenvolver resistência aos antibióticos”. “A ideia é perceber como é que estes fenómenos se desenvolvem, em particular nas ETAR”, indica.
Ana Rita Lado afirma que um dos desafios que se coloca à investigação são as concentrações destes fármacos, maioritariamente na área dos nanogramas por litro, mas também o facto de se tratar de amostras ambientais, que representam uma “matriz complexa e muito variável”.
Os resultados do projecto, que envolve o Instituto Federal de Hidrologia da Alemanha — e que tem como título oficial “Uma nova ERA para a avaliação de risco ambiental: a quiralidade como uma ferramenta para promover fármacos ambientalmente seguros” —, serão úteis para prevenir o desenvolvimento da resistência a antibióticos, ao criar “directrizes de avaliação de risco ambiental dos antibióticos quirais” e “despertar o interesse da indústria farmacêutica na procura de medicamentos mais seguros para o meio ambiente”.
“Queremos desenvolver futuras guidelines para avaliação de risco ambiental que ainda não inclui a quiralidade [propriedade geométrica presente em moléculas tridimensionais e assimétricas] e, por outro lado, tentar evitar que se desenvolvam estes antibióticos de resistência, criando orientações para que a indústria farmacêutica possa seleccionar melhor os fármacos quirais”, acrescenta.
Esta é a 17.ª bolsa do Conselho Europeu de Investigação atribuída a investigadores da Universidade do Porto desde que estes apoios foram lançados, em 2007, pela União Europeia.