Partidos espanhóis queixam-se de prejuízos e querem reduzir envio de água do Douro para Portugal

Em apenas 20 anos o regadio na região espanhola passou dos 3000 para os 100.000 hectares. As forças políticas da região espanhola de Castela e Leão defendem a construção de mais barragens, a renegociação da Convenção de Albufeira, que rege as relações entre os países ibéricos nos rios que partilham, e reclamam que o governo deveria ter invocado a cláusula de excepção por causa da seca.

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Barragem de Almendra, rio Tormes, afluente do rio Douro, em Espanha Tiago Lopes

O Partido Popular (PP) anunciou esta semana que pretende apresentar uma proposta de lei nas Cortes de Castela e Leão (o órgão legislativo da comunidade autónoma) para exigir ao Governo espanhol que “reconsidere” o acordo que tem com Portugal no âmbito da Convenção de Albufeira.

O documento, que foi aprovado em 1998 e, posteriormente, alterado com o Protocolo de Revisão do Regime de Caudais, em 2008, estabelece que das barragens de Almendra e de Ricobayo, de onde foi descarregado o maior volume de água no passado mês de Setembro, terão de ser enviados para Portugal 650 hectómetros cúbicos (hm3). O PP pretende que este volume de afluências seja reduzido.

Além das alterações ao acordo ibérico, Raúl de la Hoz porta-voz do PP nas Cortes de Castela e Leão exige ainda que sejam “mitigadas as perdas” causadas pela falta de água sobretudo no sector agrícola e nos empreendimentos turísticos “que vivem dos recursos oferecidos pelas albufeiras” afectadas. Um comunicado da União do Povo Leonês (UPL) descreve o panorama actual: Riaño ficou reduzida a 31%, Santa Teresa a 40%, Porma a 30%, Irueña a 36% e Ricobayo a 18%. E conclui que a transferência de água para Portugal “violou os interesses da região leonesa”.

A denúncia da UPL é reforçada com o envio ao senado da Junta Regional de Castela e Leão de um conjunto de questões onde esta força política reflecte a sua leitura dos últimos acontecimentos: “o Governo poderia ter violado o Protocolo Adicional ao Acordo de Albufeira”, acentua, fundamentando esta interpretação nos critérios que o regime de caudais estabelece. E de entre os parâmetros considerados para a gestão da água em circunstâncias críticas ou excepcionais, a UPL destaca “as características hidrológicas ou climáticas de cada bacia hidrográfica, as necessidades de água para garantir o bom estado das águas de acordo com as suas características ecológicas, ou as necessidades de água para garantir os usos actuais adequados ao uso sustentável dos recursos hídricos de cada bacia”.

Desta forma, prossegue o comunicado divulgado pela UPL, consideram que Espanha “poderia ter invocado o artigo 3º do Protocolo Adicional à Convenção, que reconhece períodos de excepção relacionados precisamente com a falta de chuvas” para não satisfazer os fluxos normais estabelecidos na convenção para a bacia do Douro.

Portugal e Espanha divulgaram no final de Setembro uma “declaração conjunta” que confirmava o travão das transferências das águas do Douro que estavam previstas no cumprimento da Convenção de Albufeira, que rege as relações entre os países ibéricos nos rios que partilham.

As reduções das descargas previstas abrangiam barragens que têm produção hidroeléctrica na zona de Salamanca e Zamora. A decisão acordada entre os dois países avançou perante a evidência de que Espanha não conseguirá cumprir totalmente este ano, em relação ao Douro, o que está estipulado na Convenção de Albufeira.

Prejuízos e compensações

A decisão de transferir caudais para Portugal veio “colocar em risco o abastecimento de água potável a mais de uma centena de concelhos de Salamanca e Zamora, registando-se nesta albufeira centenas de peixes mortos por falta de oxigénio”. O excesso de matéria orgânica na água das albufeiras causa uma grande diminuição na concentração de oxigénio.

Raúl de la Hoz explica a contradição maior do acordo que foi assinado em 1998: “As coisas mudaram muito”, tanto em relação à actual situação de seca como em relação ao crescimento dos hectares irrigados, que “passaram de 3000 no final da década de 90 para os 100.000 que existem hoje”.

O porta-voz do PP regional realçou a repercussão que teve a transferência de água para Portugal. “Muitas empresas de turismo e municípios que sustentam sua actividade graças aos recursos oferecidos pelas albufeiras foram gravemente afectados”. E, nalguns casos foram obrigados “a encerrar ou desistir das actividades” que mantinham.

Ao governo central o PP exige que “alivie as perdas, tanto dos agricultores como das empresas de turismo, nos meses de Julho e Agosto porque não terem conseguido irrigar as suas plantações por falta de água ou porque não conseguiram manter as suas actividades ligadas à água”.

Perante o quadro de carência hídrica que é estrutural, o PP diz que “não basta apenas renegociar o acordo com Portugal, é preciso repensar o Plano Hidrológico Nacional e a bacia do Douro” e investir em infra-estruturas (novas barragens) que permitam a “acumulação de água face às crises de seca” que são cada vez mais frequentes, observam os populares.