Foi o Vitória quem descobriu o antídoto para o Benfica
O “novo Benfica”, inventado por Roger Schmidt, tinha vencido os 13 jogos desta temporada. Em Guimarães, os “encarnados” fizeram apenas um remate à baliza no jogo todo, pelo que a perda de pontos está longe de ser uma surpresa.
Há, afinal, uma forma de contrariar o “veneno” do Benfica na temporada 2022/23. Foi o Vitória de Guimarães quem descobriu neste sábado a “solução química” desse antídoto, tornando-se a primeira de 14 equipas a não perder com os “encarnados” nesta época.
Nos primeiros pontos perdidos por Roger Schmidt desde que chegou a Portugal, o Benfica registou em Guimarães um empate (0-0), resultado que mantém a equipa lisboeta na liderança do campeonato, com três pontos de vantagem para FC Porto e Sp. Braga. Já o Vitória mantém a nona posição, com 11 pontos, a quatro dos lugares europeus.
Num jogo globalmente pobre no prisma ofensivo, um detalhe que permite ilustrar o que se passou no Minho é o perfil dos destaques individuais (ver caixa): todos eles jogadores defensivos, porque foi de defesa que se fez este jogo.
O funil de Moreno
É comum usar-se o conceito “teia” para ilustrar o que muitas equipas procuram fazer quando querem fechar os caminhos para a sua baliza, mas, no Vitória-Benfica, os minhotos fizeram algo um pouco diferente: chamemos-lhe “funil”.
O 5x4x1 (que utiliza desde a derrota com o Sp. Braga) desenhou quase sempre um “funil” perfeito no relvado: uma linha de cinco bem larga, uma de quatro um pouco mais estreita e um único jogador na frente, com Anderson como ponta do “funil”.
A ideia de Moreno, cuja equipa é das que menos remates permitem na I Liga, foi retirar todas as possibilidades para o Benfica explorar o jogo interior, já que a sobrepovoação dessa zona permitia “abafar” logo os criativos “encarnados” que tentavam jogar entre linhas. E o Benfica fez, assim, uma das piores – ou mesmo a pior – primeira parte da temporada.
Tendo menos um jogador na frente e um a mais na defesa, o Vitória nunca teve pudor em “oferecer” ao Benfica a primeira fase de construção, sem pressão especialmente agressiva – e muito menos alta –, o que obrigava o Benfica a uma dinâmica maior para contrariar a grande inferioridade numérica que tinha no ataque.
A solução seria Ramos “arrastar” um dos centrais e deixar espaço livre para Rafa ou Neres. Isto não poderia ser em apoios frontais, porque com tantos jogadores na zona central os centrais minhotos não iriam atrás e deixariam isso para os médios, pelo que só mesmo com movimentos em profundidade e largura é que o Benfica poderia abrir o tal “funil”.
Problema: os movimentos foram sempre muito padronizados, com insistência inútil no jogo entre linhas, pelo que os movimentos com profundidade ou largura só aconteceram aos 22’ e aos 41’, em duas bolas longas mal definidas por João Mário e Rafa. De resto, o Benfica foi um quase um zero, com apenas um remate na primeira parte.
Sendo certo que o Vitória não foi muito perigoso, a verdade é que rematou mais – quase sempre aproveitando o balanceamento ofensivo do Benfica, equipa que sofre sempre em momentos de transição defensiva.
Tudo isto resultou numa primeira parte quase sem balizas e com muitas faltas – algo que já é habitual na muito faltosa equipa vitoriana, a terceira mais agressiva da I Liga.
Benfica “tremeu” com penálti
Na segunda parte pouco mudou. O jogo continuou com muita luta e pouca baliza, com as dificuldades do Benfica com bola a manterem-se inalteradas. Ainda assim, só aos 70’ houve alterações de Schmidt, com Aursnes, Draxler e Musa a serem lançados em trocas directas: saíram Florentino, Neres e Ramos.
Pouco depois houve um penálti assinalado a favor do Vitória, mas o VAR ajudou Rui Costa a mudar a decisão para simulação de Safira, que tinha sido lançado em profundidade. E respirou de alívio o Benfica, que poderia ganhar nesse momento do jogo uma montanha ainda maior para escalar.
Se a primeira parte já tinha sido pobre, a segunda não foi diferente. O espaço entre linhas até chegou a ser maior em alguns momentos do jogo, mas o desgaste que levava o Vitória a cobrir menos bem o espaço também existia no Benfica, cujo aproveitamento desses momentos era sempre pouco feliz – Rafa, pouco inspirado tecnicamente, pareceu também menos sagaz a escolher as zonas para pedir entre linhas do que é habitual (o único lance “à Rafa” aconteceu aos 85’, com má definição do português depois da condução veloz).
Com o passar dos minutos, dada a presença de um avançado como Musa na frente e de um extremo como Diogo Gonçalves na ala, o Benfica começou a ceder à tentação de explorar mais jogo directo e cruzamentos – o que, não sendo impressionante na qualidade do futebol, até nem parecia ser uma má ideia, tais eram as dificuldades para criar por outras vias.
Prova disso é que até o “gigante” John Brooks chegou a entrar para o lugar de Rafa, jogando como ponta-de-lança, pelo que o “chuveirinho” foi assumido sem vergonha a partir dos 90+1’. Sem sucesso.