Forças iranianas tiveram ordem para “confrontar duramente” manifestantes, diz a Amnistia Internacional
Numa província, a ordem dizia que os manifestantes deveriam ser confrontados “sem mercê, podendo até provocar mortes”, diz a organização de defesa dos direitos humanos. Pelo menos 83 pessoas morreram, mas os protestos continuam.
A organização de direitos humanos Amnistia Internacional divulgou esta sexta-feira um documento mostrando uma ordem vinda do Quartel-general das Forças Armadas, a mais alta autoridade militar do país, a 21 de Setembro, dizendo aos comandantes das várias províncias do país que “confrontassem duramente os desordeiros e anti-revolucionários”. Segundo a Amnistia Internacional, nessa noite o uso de força letal aumentou com dezenas de homens, mulheres e crianças mortos nessa noite nos protestos.
A Amnistia confirma 52 mortes e diz que há centenas de feridos na sequência da repressão brutal que foi feita com recurso aos Guardas da Revolução, à milícia Basij, à polícia anti-motim, a agentes à paisana e outras forças de segurança. A organização diz que há provas do uso generalizado de armas de fogo pelas forças de segurança iranianas, que teriam o objectivo de matar manifestantes ou deveriam ter tido noção com um grau de certeza razoável que o uso de armas de fogo iria resultar em mortes. Um grupo iraniano com sede na Noruega, Iran Human Rights, diz que morreram 83 pessoas.
Num outro documento citado pela Amnistia, de 23 de Setembro, o comandante das forças armadas na província de Mazandaran ordenou às forças militares para “confrontarem qualquer perturbação causada por desordeiros e anti-revolucionários sem mercê, podendo até provocar mortes”.
Apesar do aumento do número de mortos nos protestos e da maior repressão das autoridades, vídeos continuavam a ser divulgados nas redes sociais a mostrar manifestantes a pedir o fim do regime dos ayatollahs em Teerão, Qom, e outras cidades.
Esta sexta-feira, as autoridades anunciaram a detenção de nove estrangeiros pelo seu “papel na agitação”, dizendo que os países de origem são Alemanha, Polónia, Itália, França, Países Baixos e Suécia, entre outros. Apoiantes do regime têm dito que os protestos são apoiados pelo estrangeiro, em particular pelos Estados Unidos, e que isso é uma intervenção indevida em questões internas do Irão.
A televisão estatal disse que a polícia deteve um grande número de “desordeiros”. Na véspera, diz a BBC, os media estatais apontavam 41 mortes, incluindo de forças de segurança, e mais de 1200 detenções.
O Presidente, Ebrahim Raisi, tinha prometido no sábado “lidar com determinação com os que se opõem à segurança e tranquilidade do país”. Antes, Raisi disse que a morte de Mahsa Amini, 22 anos, tinha de ser investigada, informando que a responsabilidade pelo caso está nas mãos do sistema judicial, e que as autoridades estão a fazer o que lhes compete.
Na quarta-feira à noite, repetiu, numa entrevista na TV estatal, que não irá tolerar o “caos”, e anunciou que peritos forenses que estão a analisar as circunstâncias da morte de Amini irão apresentar um relatório nos próximos dias.
Poucos acreditam na versão oficial de que a jovem curda teve um AVC e um ataque cardíaco. Quem assistiu à sua detenção conta que os polícias que a agrediram mal a detiveram, e que chegaram a bater com a sua cabeça num dos carros da polícia. Os manifestantes passaram de pedir justiça por esta morte, para porem em causa o uso obrigatório do hijab, queimando lenços nas manifestações e cortando os cabelos, até à reivindicação do fim do regime.
As forças de segurança iranianas já esmagaram com violência outros protestos, como em 2019, após o aumento do preço dos combustíveis, ou 2009, depois da eleição fraudulenta de Mahmoud Ahmadinejad.