Greve climática: “Não tenho escolha, tenho de estar aqui a lutar pelo meu futuro”
O movimento Greve Climática Estudantil saiu à rua em Lisboa. “Ocupar, ocupar, ocupar!” é o mote para os protestos que se seguem.
Na Praça José Fontana, junto ao Liceu Camões, no Saldanha, ouviam-se as razões do protesto. “O clima está a aquecer e os políticos estão a ver”, acusavam os estudantes que se juntaram esta sexta-feira à greve de aulas em resposta ao apelo internacional Fridays For Future.
Os jovens exigiram o fim dos combustíveis fósseis e um plano de transição justo para alternativas renováveis. Dizem que têm sido ignorados. E, por essa razão, prometem não só mais manifestações como ameaçam ocupar escolas e universidades a partir do mês de Novembro.
O protesto da Greve Climática Estudantil de Lisboa juntou várias dezenas de jovens ("cerca de 70”, nas contas da polícia, e “centenas”, segundo a organização). A marcha começou junto à Escola Secundária de Camões e terminou no Ministério da Economia.
Os jovens reclamaram sobretudo da inacção política e denunciaram a destruição do planeta. Em frente à porta da escola, os cânticos faziam-se ouvir por toda a rua. “Estudante sai à rua, esta luta também é tua”, gritavam, ao mesmo tempo que um grupo de estudantes que pertencia à escola tentava entrar nas instalações. Foi imediatamente impedido pela polícia.
Seguindo o apelo internacional End Fossil: Occupy!, os alunos portugueses presentes no protesto disseram que vão começar a ocupar as escolas e universidades, até que as suas reivindicações sejam ouvidas. Rita Santos, 22 anos, estudante de Engenharia Física no Instituto Superior Técnico (IST), garante que a próxima manifestação será “mais desobediente” do que a desta sexta-feira.
Para além de resposta para os problemas de saúde mental dos alunos do IST, a jovem estudante tem outras reivindicações. “Queremos medidas específicas como painéis solares, um melhor isolamento dos edifícios. Queremos mais refeições veganas e refeições com menor pegada de carbono.”
A luta contra o aquecimento global também passa pela educação e, por isso, os estudantes pedem “um compromisso por parte da universidade” em adoptar mais acções que ajudem a salvar o ambiente. “Depois o resto do país deve seguir as medidas.”
Elvira Neto, 79 anos, juntou-se ao protesto. De punhos erguidos exigiu justiça climática para os mais novos. Ao PÚBLICO, explicou que o planeta já não é como quando era criança. “Chovia desde Outubro até Janeiro” e agora “já não temos água para agricultura”.
Educada durante o Estado Novo, Elvira incentivava os jovens: façam greve. Ela não o pôde fazer quando era mais nova. “A juventude deve lutar pelos seus direitos, porque eles são o futuro deste país e a força da vida.”
Escalar o conflito para evitar “uma disrupção na sociedade"
E é isso que Matilde Ventura, 18 anos, porta-voz da manifestação, pretende fazer. Com a pandemia o activismo ambiental perdeu alguma força, agora “é o momento de lutar com mais força”. A jovem acha que as manifestações não são “suficientes” e, portanto, defende que é preciso “escalar o conflito e a resposta” para que a sociedade se junte ao combate.
“Se continuarmos exactamente como estamos, é o colapso civilizacional. A realidade como nós a conhecemos vai mudar completamente. Tudo o que vemos de catástrofes naturais, guerra e escassez, vai piorar. Não são cenários apocalípticos: é muito real. E esse é o horizonte da minha geração se não nos mobilizarmos e não fizermos nada.”
Matilde Ventura diz que a ideia de que terá um futuro semelhante ao dos pais ou dos avós “é completamente ilusória”. “Não tenho escolha, tenho de estar aqui a lutar pelo meu futuro e pelo futuro das outras pessoas.”
Como exemplo do que vai ser o futuro dos jovens fala das temperaturas extremas que foram sentidas no país durante o Verão e das cheias que atingiram o Paquistão. “Temos até 2030 para cortar um terço das emissões a nível nacional.”
Patrícia Silva, doutoranda em Geofísica, esteve na manifestação como uma das representantes do movimento Scientist Rebellion. E defendeu que para evitar uma disrupção na sociedade devido à crise climática, é necessário causar um conflito ainda maior. Ocupar as escolas, acredita, é uma via. “O tempo está a acabar e precisamos de mudanças dramáticas na sociedade, nomeadamente na transição justa de energia e acabar com os combustíveis fósseis.”
Ainda a caminho para o Ministério da Economia, vestida a rigor com uma bandeira a apelar o fim ao combustível fóssil, Sílvia Carreira, 56 anos, antiga professora de desenho e história de arte, prevê um futuro difícil para as gerações mais novas. “Temos que mudar a forma como vivemos e reduzir o nosso consumo.” Para a antiga professora o combate só poderá ser feito com mais formação, sensibilização e com “uma vida mais resguardada”, consumindo apenas o necessário.
Ao chegar ao Chiado, impedidos de avançar até à porta do Ministério da Economia por um cordão policial, Matilde Ventura agarrou no microfone para lamentar a inacção do Governo, lembrou que o actual ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva, foi presidente da Partex Oil and Gas e incentivou empresas a apresentarem novos projectos de exploração de gás.