Pretensos referendos anunciados por forças pró-russas vistos como um passo em plano de anexação
Votações em quatro regiões ucranianas ocupadas por forças russas são consideradas uma escalada da parte de Moscovo por Kiev e aliados.
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Os líderes das autoridades de ocupação russas em quatro regiões ucranianas anunciaram pretensos referendos sobre uma adesão à Rússia, a serem realizados já entre os dias 23 e 27, um passo que faz lembrar a realização de um referendo na Crimeia antes da anexação do território pela Rússia, em 2014.
A situação agora é diferente porque a Rússia não controla a totalidade dos territórios em que as autoridades pró-russas anunciaram os pretensos referendos — que, como são realizados sob ocupação, não terão condições de serem livres.
As regiões onde os governos instalados pela Rússia anunciaram estas pretensas consultas foram Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporijjia – regiões que, no seu conjunto, representam 15% do território ucraniano e são, segundo a agência Reuters, sensivelmente do tamanho de Portugal.
No entanto, a Ucrânia está a avançar no terreno em Lugansk, quebrando o que era desde Julho o controlo total russo da região, ao libertar a cidade de Kreminna e a aldeia de Bilohorivka, localidades no caminho de Lisichansk, cuja queda, em Julho, depois de uma batalha sangrenta, deixou toda a região de Lugansk nas mãos da Rússia. “Os ocupantes estão claramente em pânico”, disse Volodymyr Zelensky numa entrevista televisiva na segunda-feira à noite.
A Rússia controla apenas cerca de 60% da região de Donetsk, segundo a agência Reuters. O chefe de delegação do diário britânico Financial Times em Moscovo, Max Seddon, dizia também que em Zaporijjia o referendo incluirá a cidade com o mesmo nome, controlada pela Ucrânia. Segundo Seddon, citando as autoridades locais, responsáveis eleitorais irão porta a porta acompanhados por polícias para “sugerir às pessoas que vão votar”.
De qualquer modo, o anúncio pelas autoridades pró-russas é visto como uma parte de um plano do Kremlin para anexar estas regiões.
Antes de um discurso anunciado do Presidente, Vladimir Putin (previsto para as 18h em Portugal continental mas depois adiado para o dia seguinte de manhã, segundo media russos), o seu aliado (e antigo Presidente) Dmitri Medvedev sugeriu que incorporar as duas repúblicas do Donbass na Rússia seria um passo irreversível — e que qualquer ataque seria considerado um ataque à própria Rússia.
“A invasão de território russo é um crime que permite a utilização de todas as forças de autodefesa”, declarou o político russo. “É por isso que estes referendos são tão temidos em Kiev e no Ocidente”, já que vão “mudar o vector do desenvolvimento russo nas próximas décadas”. Quanto à irreversibilidade, disse: “É importante que depois de alterações constitucionais no nosso Estado estas decisões não possam ser revertidas por nenhum futuro líder da Rússia.”
Do lado da Ucrânia, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dmitro Kuleba, declarou no Twitter: “Estes referendos fraudulentos não vão mudar nada”, acrescentando: “A Rússia tem sido e continua a ser um agressor que está a ocupar ilegalmente partes do território ucraniano. A Ucrânia tem todo o direito de libertar os seus territórios e vai continuar a libertá-los independentemente do que a Rússia diga.”
Pouco depois, o porta-voz da presidência da Ucrânia, Serhii Nikiforov, dizia que qualquer suposto referendo destruiria as poucas possibilidades de diálogo entre Moscovo e Kiev.
Antes dos anúncios dos pretensos referendos, o Parlamento russo aprovou uma lei para aumentar penas para os crimes de deserção, dano a propriedade militar e insubordinação, se forem cometidos durante mobilização militar ou em situações de combate.
A aprovação da lei não significa uma mobilização geral para a guerra — algo que o Kremlin não fez até agora porque implicaria descontentamento e mais oposição ao que descreve como “operação militar especial” —, mas levou a nova especulação sobre se poderia ser decretada esta mobilização.
Os efeitos foram sentidos nos mercados, com o rublo a registar uma nova queda, e levou a que pessoas considerassem hipóteses de saída: o correspondente do diário britânico The Guardian em Moscovo, Andrew Roth, notava no Twitter que o site de compra de bilhetes Aviasales tem uma opção “onde quer que possa ir”, o que pode ser bastante usado no dia “em que aumentou o medo de que Putin possa estar prestes a anunciar mobilização e encerramento de fronteiras”.
Dezenas de países, incluindo todos os da União Europeia e outros aliados da Ucrânia que impuseram sanções a Moscovo, impedem chegadas de voos a partir da Rússia (e todo o trânsito aéreo russo é proibido no espaço da UE). Por terra, a Finlândia é o único país da UE com fronteira com a Rússia que permite a passagem de cidadãos russos com visto.