Por ano, há mais de 5000 mortes em Portugal causadas pela exposição a dióxido de azoto (NO2) e a partículas finas – e a mortalidade é mais elevada em zonas urbanas e costeiras –, havendo ainda 140 mortes atribuídas à exposição ao ozono (O3). O estudo com estes resultados foi publicado na revista científica Science of the Total Environment no início do ano e foi apresentado esta sexta-feira num encontro no Instituto Universitário Egas Moniz (IUEM), em Almada.
“Vale a pena investir em medidas de mitigação da exposição a estes poluentes porque estamos a falar de mortes que podem ser evitadas”, diz ao PÚBLICO um dos autores da investigação, José Brito.
Nas regiões do Porto, Lisboa e Guimarães, registaram-se taxas de mortalidade mais elevadas relacionadas com a exposição a dióxido de azoto do que nos restantes locais analisados. “É um problema sério”, diz José Brito, que é coordenador da área temática de saúde ambiental do Centro de Investigação Interdisciplinar Egas Moniz (CiiEM).
No caso das partículas finas, Estarreja e Seixal são as duas regiões mais afectadas, devido à actividade industrial; na região do Alandroal também se registam valores elevados, mas o investigador acredita que se trata da “intrusão de partículas provenientes do Norte de África”.
E os incêndios florestais também contribuem para agravar a qualidade do ar. No caso do ozono, as taxas de mortalidade são mais elevadas nos municípios rurais do interior. Em Viana do Castelo registam-se valores elevados de ozono, que podem ser consequência do transporte marítimo.
Avaliada exposição entre 2010 e 2019
O estudo foi feito utilizando a aplicação AirQ+, desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que permite estimar taxas de mortalidade por causas específicas, consoante os dados da população e do poluente em causa. Neste caso, foram avaliados os dados relativos à exposição a longo prazo destes poluentes em vários municípios de Portugal, de 2010 a 2019. Tal permite “calcular a magnitude do impacto da poluição atmosférica na saúde de uma população”, explicou José Brito durante o encontro (também transmitido online).
“A mortalidade atribuída à exposição a estes gases tem vindo a diminuir”, ressalva o investigador, dizendo que essa redução acompanha a diminuição gradual (salvo algumas excepções) de concentrações de alguns destes gases. “Em consequência, por exemplo, da introdução de catalisadores”, explica. No entanto, “há pessoas que continuam a morrer em resultado da exposição a estas partículas”. E há problemas de saúde que podem ser exacerbados pela poluição atmosférica.
Assim, é preciso dar-se primazia a “medidas de saúde pública, medidas de urbanização, medidas de gestão territorial”, vaticina José Brito. “É preciso ter em conta que a toxicidade envolve um contínuo e mesmo em valores mais baixos do que o normal já há efeitos na saúde, incluindo em termos de mortalidade”, acautelou, durante a sessão na tarde de sexta-feira.
Estatísticas oficiais sem dados
O investigador alertou ainda que “as publicações do INE [Instituto Nacional de Estatística] não reportam dados sobre mortalidade atribuída à poluição doméstica e do ar ambiente devido à escassez e irregularidade das séries de dados disponíveis”. É algo “gritante”, critica o investigador, apontando os resultados deste estudo como uma das formas de colmatar a falta de dados.
Em Novembro do ano passado, a Comissão Europeia anunciou que iria avançar com uma acção contra Portugal no Tribunal de Justiça da União Europeia devido à má qualidade do ar causada por níveis elevados de dióxido de azoto. “Portugal tem registado excedências contínuas e persistentes do valor-limite anual de dióxido de azoto em três zonas de qualidade do ar: Lisboa Norte, Porto Litoral e Entre Douro e Minho”, lia-se na nota de imprensa.
Segundo a Agência Europeia do Ambiente, cerca de 178 mil mortes poderiam ter sido evitadas se todos os Estados-membros tivessem cumprido o nível de referência da qualidade do ar. Um estudo divulgado este ano mostra que houve nove milhões de mortes prematuras no ano de 2019 que podem ser atribuídas à poluição: só a poluição atmosférica causou 6,5 milhões de mortes prematuras em termos globais e os países de baixo rendimento são os mais afectados.