O velho mercado do Porto vestiu-se de futuro: Bolhão reabre esta quinta-feira

Mais de quatro anos depois do encerramento para profundas obras de reabilitação, Rui Moreira vai reabrir o Bolhão. A origem, lutas e conquistas de um mercado que se fez símbolo da cidade

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Mercado do Bolhão abriu em 1914 Nelson Garrido
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Obras eram pedidas desde os anos 80 Nelson Garrido
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Mercado foi reabilitado pelo arquitecto Nuno Valentim Nelson Garrido

Chegou o dia há muito ansiado. Esta quinta-feira, 15 de Setembro, o mercado do Bolhão reabre após profundas obras de reabilitação. A inauguração, às oito da manhã e com um simbólico toque de sino, cabe a Rui Moreira, a quem já ninguém tira um lugar nos livros de História do Porto: é ele o presidente da câmara que cumpriu uma reivindicação com quase 40 anos – devolver o Bolhão à cidade.

O histórico mercado retoma a sua função original, com os frescos como marca identitária (algo que se temeu perder-se), mas num edifício moderno e com comerciantes novos a juntarem-se aos históricos.

O edifício, reabilitado pelo arquitecto Nuno Valentim, reabre com 79 comerciantes, um número que fica aquém do desejo de Rui Moreira, que queria um regresso em pleno. Alguns restaurantes e lojas do exterior não conseguiram, no entanto, terminar as obras dos seus espaços e vão adiar o seu retorno a casa.

Além das renovadas bancas de legumes, frutas e flores, das peixarias e dos talhos, haverá agora espaço para artesanato, cafés e também novos produtos como cogumelos, algas, massas, temperos e especiarias.

A reabilitação do Bolhão foi promessa eleitoral de Rui Moreira em 2013. Nesse ano, porém, o candidato independente apoiado pelo CDS sugeria uma concessão a privados e a criação de um espaço que, mantendo a sua vocação de mercado de frescos, integrasse também áreas de lazer e cultura e ainda uma residência para estudantes. Poderia estar pronto em 2015.

Já como presidente da autarquia, Rui Moreira mudava de ideias. O modelo de reabilitação seria público e as boas contas de 2014 permitiam até à autarquia avançar sem fundos comunitários.

A empreitada, com um custo de 22,3 milhões, arrancou em Maio de 2018, com uma duração prevista de dois anos. Os comerciantes foram transferidos para a cave de um centro comercial a poucos minutos.

Entretanto, no quarteirão onde em 1838 nasceu uma feira ao ar livre, num lameiro atravessado por um riacho que formava uma bolha de água (daí o nome Bolhão), os trabalhos revelavam-se mais complexos do que o previsto. No final de 2019, Moreira admitia: a sua “obra de relojoaria” estava atrasada. Só em Maio de 2021, ainda durante o seu segundo mandato, estaria concluída.

A previsão falhou, de novo. E não apenas por uma vez. A data de reabertura foi sendo adiada, reajustada. Esta quinta-feira, quatro anos e quatro meses depois do início dos trabalhos, o Bolhão reabre. Com gestão municipal.

Obras pedidas desde 1984

O diagnóstico de um mercado a precisar de obras remonta a 1984. Uma inspecção feita nesse ano revelava patologias construtivas graves nos pavimentos e dava origem a algumas correcções. Insuficientes. Uma análise dos técnicos camarários concluía, pouco depois, que a intervenção necessária era de fundo.

Só em 1992 surge um projecto aprovado pela autarquia, após um concurso público internacional. O autor é o arquitecto Joaquim Massena – que até hoje contesta o desfecho do processo. Em 1996, são adjudicadas as obras do projecto, entretanto reformulado para integrar uma estação de metro. Mas nada acontece. Em 1998, há uma nova reformulação, aprovada pela câmara e pelo actual IGESPAR.

Os anos passam-se sem que o projecto de Joaquim Massena avance. E há quem comece a adjectivá-lo de obsoleto.

Entretanto, o Bolhão – inaugurado em 1914, com projecto do arquitecto Correia da Silva – estava em risco de ruína. Havia andaimes a suportar a estrutura. Mas os comerciantes recusavam sair.

Em 2006, com Rui Rio à frente da Câmara do Porto, é lançado novo concurso internacional para obras e exploração do Bolhão ao qual concorrem o Grupo Amorim e a empresa holandesa Tramcorne. A proposta da segunda convence a Assembleia Municipal (ou parte dela, já que a votação foi renhida: 27 contra 26 votos), no início de 2008.

Os holandeses admitem as suas intenções. “A demolição de todo o interior do Mercado do Bolhão é uma inevitabilidade”, declaravam, falando ainda na “construção de um hipermercado, shopping center e habitações de luxo”, ficando “uns meros 3% (…) reservados a mercado tradicional”.

A cidade não gosta. Um movimento cívico contesta a opção, uma petição com mais de 50 mil assinaturas chega à Assembleia da República.

Por “incumprimento”, segundo Rui Rio, autarquia e holandeses rasgam contrato. E o autarca do Porto aceita reabilitar o ícone da cidade em parceria com o Ministério da Cultura. No final de 2011, no entanto, Rio argumentava que só com fundos comunitários poderia avançar com um projecto de 20 milhões.

Em 2013, já os candidatos à sucessão de Rui Rio se apresentavam, “um dos espaços colectivos mais emblemáticos da cidade” é classificado como Monumento de Interesse Público pelo Governo, que destaca o “valor arquitectónico do edifício”, um “bom exemplo da aplicação nacional do estilo ecléctico Beaux Arts”.

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