Não será uma decisão totalmente surpreendente, tendo em conta a idade e o historial de lesões, mas não deixa de ter um impacto tremendo no mundo do ténis, em particular, e do desporto de alta competição: Roger Federer anunciou esta quinta-feira que vai terminar a carreira. A última oportunidade para ver em acção, ao mais alto nível, uma das lendas do ténis mundial será a Laver Cup, que se realiza em Londres, entre os dias 23 e 25 deste mês.

“Como muitos de vocês sabem, os últimos três anos trouxeram-me desafios na forma de lesões e cirurgias. Trabalhei arduamente para voltar à plena forma competitiva. Mas também conheço as capacidades e os limites do meu corpo, e a sua mensagem para mim ultimamente tem sido importante. Tenho 41 anos”, explicou Federer, na rede social Instagram.

Ao longo das últimas semanas, foram subindo de tom as dúvidas em torno do regresso do suíço à competição, devido a uma lesão quase crónica no joelho direito - aparentemente, o joelho continuará a acumular líquido e em estado de inflamação. De resto, Federer tinha falhado a edição de 2021 da Laver Cup também com queixas físicas, preparando-se agora para uma despedida longe das condições ideais.

Roger Federer não tem sido um tenista particularmente atingido por lesões ao longo da duradoura carreira no circuito ATP (tem tido, sobretudo, problemas nas costas em diferentes momentos, intercalados por complicações pontuais num pé ou na virilha), mas as queixas no joelho foram-se agravando, especialmente a partir de 2020, ano em que foi submetido a duas intervenções cirúrgicas.

“Joguei mais de 1500 partidas em 24 anos. O ténis tratou-me com mais generosidade do que eu jamais teria sonhado, e agora devo reconhecer quando é hora de encerrar minha carreira”, acrescentou o detentor de 20 títulos do Grand Slam. “A Laver Cup da próxima semana em Londres será meu último evento ATP. Vou jogar mais ténis no futuro, é claro, mas não em Grand Slams ou no circuito.”

Foram 310 semanas no topo

Enquanto o adeus do suíço, que nasceu em Basileia e tem residência em Wollerau, não se tornar oficial, ou seja, enquanto não disputar o derradeiro ponto de uma incrível caminhada desportiva, muito irá escrever-se sobre a sua importância para o ténis e o legado difícil de replicar que vai deixar para trás.

Afinal de contas, não é todos os dias que se vira a página de um currículo que inclui um período de 310 semanas enquanto número um do ranking ATP, o que abarca um recorde de 237 semanas consecutivas no topo, concretamente entre 2 de Fevereiro de 2004 e 18 de Agosto de 2008.

Um ano mais tarde, ao conquistar o torneio de Roland Garros, completou um Grand Slam (venceu, pelo menos uma vez, as quatro provas mais cotadas do circuito), o que aconteceu um mês antes de quebrar o recorde do norte-americano Pete Sampras na Era Open, ao erguer o 15.º troféu de um major.

No total, foram 20 os títulos com chancela do Grand Slam, sendo apenas ultrapassado nesta contabilidade pelo sérvio Novak Djokovic (21) e pelo espanhol Rafael Nadal (22), ambos ainda em actividade: decompondo, foram seis Open da Austrália, oito torneios de Wimbledon, um de Roland Garros e cinco US Open consecutivos.

“O impacto do Roger no ténis, e o legado que construiu, são incríveis. Ao longo de 24 anos como profissional, atraiu milhões de fãs apaixonados pela modalidade. Ele liderou uma espantosa nova era de crescimento e elevou a popularidade do nosso desporto. Poucos atletas se transcenderam desta forma”, resumiu Andrea Gaudenzi, líder do ATP.

"Redefiniu a grandeza no court"

Independentemente do que vier a fazer na Laver Cup, Roger Federer já não conseguirá alcançar Jimmy Connor enquanto recordista de vitórias no tour - foram 1274 contra as actuais 1251 do suíço, que lhe permitiram levar para casa 103 troféus (que incluem 28 títulos Masters 1000).

A lista de conquistas e de proezas prossegue de forma quase interminável (entre os muitos recordes batidos e feitos alcançados, conta-se uma série de 24 triunfos consecutivos contra jogadores do top10) e estende-se aos prémios Laureus, tendo sido reconhecido cinco vezes como desportista do ano.

“Ele redefiniu a grandeza no court, com o seu espírito de campeão, cavalheirismo e estilo de jogo a alimentarem audiências durante décadas, inspirando tantos tenistas a pegarem na raqueta”, acrescentou Gaudenzi, definindo o suíço como um exemplo de comportamento e um verdadeiro embaixador da modalidade.

Por tudo isto, e pela faceta solidária (dentro e fora da classe) e humanitária que o caracterizam, Roger Federer, que atingiu o topo do ténis ainda com 22 anos, será seguramente a grande atracção da Laver Cup, uma prova ainda com pouca história (foi criada em 2017) e que, em condições normais, provavelmente não teria o mediatismo que se prepara para ter, apesar da qualidade dos participantes.

Entre as dezenas de reacções que têm chegado do mundo do ténis, uma das primeiras saiu directamente dos dedos do actual número um do ranking, o jovem espanhol Carlos Alcaraz. “O Roger tem sido um dos meus ídolos e uma fonte de inspiração. Obrigado por tudo o que fizeste pelo nosso desporto. Ainda quero jogar contigo”, escreveu no Twitter. Tendo em conta que o suíço está já em contagem decrescente, o murciano terá de encontrar uma vaga na agenda para um encontro amigável.