Votação não acaba com uso da biomassa florestal na Europa, alertam ambientalistas
Órgão da União Europeia votou alterações à Directiva das Energias Renováveis II. Até 2030, parlamento quer que 45% da energia consumida seja proveniente de renováveis.
O acesso ao subsídio europeu para a queima de madeira na produção de energia ficou dificultado depois de uma votação no Parlamento Europeu (PE), nesta quarta-feira. Mas as associações ambientalistas criticam a pouca ambição das medidas tomadas no contexto das alterações à Directiva das Energias Renováveis II.
“Os resultados alcançados são um primeiro passo, mas sem sombra de dúvida insuficientes para fazer face à crise climática, energética e alimentar”, avança a associação ambientalista Zero, num comunicado enviado às redacções.
Em 2009, a Directiva das Energias Renováveis definiu que 20% da energia usada em 2020 teria de vir de fontes renováveis. Em 2018, o documento foi revisto e passou a chamar-se Directiva das Energias Renováveis II (RED II, em inglês), com um novo objectivo: até 2030, os estados-membros teriam que obter 32% da energia consumida a partir de fontes renováveis. No Verão de 2021, essa ambição subiu para 40% e, em Maio último, já no contexto da guerra na Ucrânia e como forma de diminuir a dependência europeia do gás russo no médio prazo, a possível meta passou a ser de 45% até 2030.
Nesta quarta-feira, o PE votou a favor dessa nova meta. No entanto, no pacote aprovado também se definiu novas medidas sobre o uso de biomassa florestal para a produção energética. Até agora, a União Europeia (UE) considerava a biomassa florestal uma fonte de energia renovável, subsidiando esta indústria em 16 mil milhões de euros por ano. Ao contrário do petróleo e o carvão, as árvores cortadas e queimadas poderiam ser substituídas por novas árvores que iriam crescer, retirando o dióxido de carbono da atmosfera. Isso faria desta matéria-prima uma fonte energética renovável.
Florestas em perigo
No entanto, tanto cientistas como ambientalistas criticavam esta posição. Por um lado, a queima de árvores lança de imediato dióxido de carbono na atmosfera, enquanto o crescimento de novas árvores e a consequente retirada de dióxido de carbono demora décadas. Tendo em conta a urgência das alterações climáticas e o Acordo de Paris, a humanidade não pode esperar essas décadas, argumentam os ambientalistas.
Por outro lado, um relatório recente da Agência de Investigação Ambiental (AIA) mostrou que em países como a Roménia, a Polónia, a Eslováquia e a Bulgária, florestas em áreas protegidas estavam a ser destruídas para alimentar a indústria da queima de biomassa florestal em estados-membros como a Alemanha e a Itália. Além de haver uma ameaça de desaparecimento das últimas manchas de antigas florestas europeias, esta contínua exploração aumenta o risco de certas florestas do continente deixarem de ser um sumidouro de carbono para passarem a emissoras.
Por fim, a queima da biomassa florestal é uma das fontes de poluição atmosférica que põe em causa a saúde dos cidadãos da UE, além de ser uma fonte de despesas médicas na ordem dos 12 mil milhões de euros por ano.
Assim, as exigências da comunidade científica e dos ambientalistas eram que a biomassa florestal deixasse de contar enquanto energia renovável e não fosse subsidiada.
Resposta lenta
O texto agora votado no PE passa, de facto, a proibir o subsídio de biomassa florestal primária. No entanto, os subsídios podem continuar tanto para a biomassa secundária (como os resíduos de madeira de fábricas e a madeira pós-consumo), como para o que não foi considerada de biomassa florestal primária: a madeira florestal afectada por pragas, as florestas afectadas por catástrofes naturais e as exploradas para a prevenção de incêndios. Isto leva “a que uma grande quantidade de madeira ainda seja elegível para utilização como combustível”, alerta a Zero.
A votação estabeleceu ainda um limite máximo do uso de biomassa florestal e o abandono faseado desta matéria-prima. Mas também aqui os ambientalistas não ficaram contentes com as alterações. Em relação à definição do limite máximo, esta é feita a partir da média entre os anos de 2017 e 2022. “Como é provável que a utilização em 2022 seja muito elevada, isto irá fazer subir o ponto de partida”, argumenta a Zero.
Quanto ao abandono faseado, a associação ambientalista explica que não há uma definição da trajectória dessa redução até 2030. Para isso, terá que se esperar pela Comissão Europeia que fará uma nova avaliação, “o que provavelmente atrasará a sua implementação”, aponta.
Apesar de caracterizar as novas medidas como “um primeiro passo”, a Zero recorda que não há tempo a perder em relação a este assunto: “A UE está a perder o seu sumidouro de carbono florestal devido aos actuais níveis de abate de árvores.”