IL quer abrir mercado regulado do gás natural às empresas que operam no livre
Liberais querem assegurar a sobrevivência de empresas mais pequenas do mercado liberalizado que arriscam ter que encerrar devido à transferência de clientes para a tarifa regulada.
Depois de o Governo ter permitido que, desde esta quarta-feira, boa parte dos consumidores do mercado livre do gás natural regresse às tarifas reguladas durante um ano e não veja a sua factura aumentar significativamente nos próximos meses, a Iniciativa Liberal quer que as empresas que actuam no mercado liberalizado possam também passar a comercializar no regulado.
A bancada liberal, que discordou da medida do Governo e preferia soluções que compensassem directamente os consumidores, entrega nesta sexta-feira um projecto de lei no Parlamento que visa aplicar a “todas as entidades registadas para a comercialização de gás natural”, a título temporário, o estatuto de comercializador de último recurso (CUR), que actualmente está apenas restrito aos operadores do mercado regulado.
Ou seja, coloca em pé de igualdade, temporariamente, os comercializadores do mercado livre de gás natural — que tem actualmente cerca de 1,3 milhões de clientes — e os do mercado regulado — onde estão cerca de 230 mil famílias.
“Assim, pode-se assegurar, por um lado, a sobrevivência de empresas mais pequenas do mercado liberalizado e, por outro, a possibilidade dos consumidores permanecerem nos seus actuais operadores, actualizando apenas a tarifa e, assim, simplificando todo o processo de transferência para o mercado regulado”, argumenta a Iniciativa Liberal.
Esta solução fora já defendida pelo presidente da Associação de Comercializadores de Energia no Mercado Regulado que, em declarações ao PÚBLICO há duas semanas, lamentava a fuga de milhares de clientes das empresas que operam no mercado livre (com 1,3 milhões de clientes) e admitia que a opção do Governo poderia colocar em risco “muitas empresas de menor dimensão” de fornecimento de gás natural que actuam no segmento residencial.
O Governo criou um regime excepcional e temporário que permite aos clientes finais de gás natural com consumos anuais inferiores ou iguais a 10.000 m3 aderirem ao regime de tarifa regulada depois de a EDP Comercial (a empresa com maior quota de mercado no segmento residencial) ter anunciado aumentos médios nas facturas dos clientes na casa dos 30 euros a partir de Outubro. A EDP Comercial tem metade dos clientes domésticos do mercado liberalizado do gás natural e admitia que em Janeiro do próximo ano os preços voltassem a subir significativamente.
Já no mercado regulado a ERSE prevê que a factura média total de uma família de quatro pessoas seja em Outubro de 25 euros. As cerca de 227 mil famílias que estavam aqui agora no mercado regulado deverão ter um aumento de preços que será de 3,9%, de acordo com o regulador.
A Iniciativa Liberal considera que, ao permitir a livre passagem dos clientes do mercado livre para o regulado — que ficara fechado em Dezembro de 2012 —, além de contrariar todo processo de criação de um mercado liberalizado, o Governo “compromete a viabilidade da concorrência futura no sector do gás natural, ainda fundamental para o sustento das famílias portuguesas”.
O partido defende os “benefícios de um mercado liberalizado” a nível europeu: do lado dos fornecedores, permitir o “equilíbrio dos preços do gás” e ter mais “segurança e flexibilidade na gestão de situações de escassez"; do lado dos consumidores, ofertas inovadoras e diversificadas e preços mais competitivos.
A mudança dos clientes para o mercado regulado do gás natural é possível desde esta quarta-feira, dia 7, sem que tenham qualquer despesa associada e sem precisarem de inspecção à instalação de gás. Basta aos consumidores consultarem a lista dos comercializadores (CUR) no portal da ERSE.
Com esta abertura “numa situação de pico dos preços da energia, [o Governo] desfere um golpe sem precedentes num mercado que levou décadas a construir, para o benefício dos consumidores, sem para isso apresentar garantias da eficácia ou sustentabilidade da medida”, afirma a IL. Que acrescenta que gera uma “situação de concentração de mercado” que compromete a concorrência.
Os liberais realçam que o gás natural fornecido pelos operadores do mercado regulado depende de contratos com a Nigéria, com elevados riscos de incumprimento, o que deixaria essas famílias em risco. E consideram que a visita de João Galamba àquele país já depois de anunciada a medida de abertura do mercado é um sinal de que poderão, de facto, existir problemas no fornecimento. Se isso vier a acontecer, o Governo terá que recorrer às suas reservas estratégicas de gás (e está obrigado por Bruxelas a manter armazenado o equivalente a 80% do consumo anual), ou ir ao mercado comprar aos preços actuais (e aumentando o défice tarifário).
As regras para esse estatuto deverão ser regulamentadas pelo Governo num prazo de 90 dias e esse estatuto seria apenas durante a vigência do regime excepcional de transição.