Seca reduz calibres na fruta e faz antecipar colheitas. Os preços podem aumentar
Nem só os cereais e a batata sofreram com a seca e a onda de calor. Nas frutas e legumes, as produtividades e os calibres regrediram e, na amêndoa, as colheitas anteciparam “pelo menos duas semanas”. A Portugal Fresh alerta: “Ou actuamos já, ou vamos depender cada vez mais das importações”.
As previsões agrícolas do Instituto Nacional de Estatística (INE) reveladas esta quinta-feira “não surpreendem” a Portugal Fresh. Gonçalo Santos Andrade, presidente da Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores de Portugal, sabe que “a seca extrema que tem afectado o país de Norte a Sul veio prejudicar a produtividade e os calibres da maioria das frutas e legumes. Todas as culturas de Primavera-Verão estão com menor quantidade e dificuldade em cumprir os requisitos a nível de calibres”, garante ao PÚBLICO.
O INE apontou factos e números. Referiu que o pico de calor registado de 7 a 17 de Julho “causou escaldões nas fruteiras, principalmente nas macieiras e pereiras”, culturas onde se prevêem quebras de produtividade de, respectivamente, 15% e 30%, face à campanha anterior.
O dirigente da Portugal Fresh avisa que “é necessário criar condições de solidariedade na justa distribuição do valor na cadeia agroalimentar, com a indústria e o retalho”. É que “os produtores precisam de cobrir os custos de produção para poderem assegurar a continuidade da sua nobre actividade de produzir alimentos essenciais”.
A associação reclama “há vários anos uma estratégia de aumento da reserva de água”.
Em 2020, as exportações portuguesas do sector das frutas, legumes e flores cresceram 5% face a 2019 (de 1605 milhões para 1683 milhões de euros). Em 2021, superaram, pela primeira vez, os 1700 milhões de euros. Mas Gonçalo Andrade não tem dúvidas: “Não podemos continuar nesta angústia desassossegada que vivemos diariamente e que se está a transformar num pesadelo sem fim. Ou actuamos já, ou vamos cada vez mais depender das importações.”
Amendoal antecipa duas semanas
No amendoal, “a colheita está pelo menos duas semanas antecipada”, revela Tiago Costa, presidente da Portugal Nuts – Associação de Promoção dos Frutos Secos. “Levamos cerca de 15 a 20% já colhido, sem grandes problemas de qualidade, a não ser onde houve pouca água para regar, que foram casos mais pontuais”, explica o empresário.
Nos últimos 10 anos, Portugal aumentou em 54% a área plantada de frutos secos, de acordo com os números avançados pela associação no seu primeiro congresso, em Beja, a 3 de Maio. A área já vai em 110 mil hectares e a produção em cerca de 80 mil toneladas por ano, com a amêndoa em forte crescimento, sobretudo no Alentejo e na Beira interior. Daí que o INE anteveja para 2022 “uma produção próxima da alcançada em 2021”, em virtude da “entrada em produção de novas plantações”.
“Regadio atenua efeito da seca”
Na região irrigada pela barragem de Alqueva, no Alentejo, “as culturas de regadio estão, em geral, bem adaptadas às condições meteorológicas locais, onde são relativamente normais períodos de temperaturas altas”, refere ao PÚBLICO o presidente da EDIA - Empresa de Desenvolvimento e Infra-Estruturas do Alqueva.
José Pedro Salema faz notar que, “durante uma onda de calor, as culturas mediterrânicas diminuem os níveis de actividade, de forma a protegerem-se”, pelo que “a maturação dos frutos pode sofrer algum atraso nestes períodos”. Por outro lado, “a primavera quente e seca antecipou os crescimentos e floração”, refere o gestor, sublinhando que “as áreas beneficiadas por Alqueva, bem como todo o regadio, e ao contrário das áreas de sequeiro, claramente maioritárias, têm condições para atenuar dramaticamente os efeitos das secas e onda de calor”.
Preço da batata pode aumentar
A batata também foi afectada pela seca e as temperaturas muito elevadas, que inibiram a tuberização. Há “decréscimos de produtividade, bem como dificuldades de comercialização”, segundo o INE.
Sérgio Ferreira, presidente da Porbatata - Associação da Batata de Portugal, confirma. Em declarações ao PÚBLICO, frisa que 2022 “é um ano de produtividades mais baixas que o normal por causa da seca, sobretudo na batata de sequeiro”, regime de cultura mais frequente nas regiões Norte e do Oeste. “Uma quebra que pode atingir facilmente cerca de 15%.”
E se, na cultura de batata com recurso a regadio, “o impacto é menor”, a colheita vai regredir. Duas razões explicam esta quebra. Por um lado, “a redução das áreas plantadas por vários agricultores, devido ao aumento dos custos de produção” (combustíveis, fertilizantes, electricidade, entre outros). Por outro, “as condições climatéricas”.
Fica o alerta do presidente da Porbatata: “Os preços ao consumidor final tenderão a aumentar.”