Câmara de Lisboa impotente para resolver problema do ruído causado pelos ajuntamentos nocturnos

Autarquia respondeu a queixas dos moradores, afirmando que nas normas estabelecidas “confiou-se no cumprimento da norma escrita, esquecendo-se as dinâmicas sociais e económicas”. Lembra ainda que “o quadro constitucional vigente proíbe medidas de restrição da circulação fora dos estados de excepção”.

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O Cais do Sodré é uma das zonas afectadas Ricardo Lopes

A Câmara Municipal de Lisboa (CML) manifestou-se impotente para resolver o problema de ruído nocturno provocado por ajuntamentos de pessoas que, após o encerramento dos bares (às 23h em alguns bairros), continuam nas ruas madrugada dentro, causando incómodo aos moradores.

O problema tem vários anos e afecta alguns bairros da capital, bem como os de outras cidades, mas tem uma especial incidência nas zonas do Cais do Sodré e Bairro Alto, por aqui existirem vários espaços de diversão nocturna.

Um grupo de cidadãos moradores no Cais do Sodré, denominado Aqui Mora Gente, tem apresentado várias queixas à CML e obteve agora resposta do gabinete do vereador Ângelo Pereira (PSD), que tem, entre outras, a responsabilidade pelo Ruído. O autarca, manifesta a impotência da autarquia para resolver o problema e explica porquê.

“A dinâmica social adquirida nos locais de diversão nocturna, em que se associa a função residencial com a função comercial, com milhares de pessoas a afluir aos estabelecimentos e a dimensão destes, torna muito difícil a concreta aplicação de medidas de controlo de multidão, nomeadamente quanto a questões de ruído”, começa por explicar o gabinete de Ângelo Pereira numa resposta enviada aos cidadãos que o PÚBLICO confirmou ser verdadeira.

O vereador afirma ainda que “a única solução efectiva seria uma redução generalizada de horários”, algo que, acrescenta, “iria afectar economicamente todo o tecido comercial”. “Seria a única forma de retirar milhares de pessoas da via pública”, sublinha.

A resposta aos moradores lembra ainda que se permitiu “o estabelecimento de zonas de diversão nocturna assentes na exploração de estabelecimentos de bebidas de muito reduzida dimensão”, com “o encerramento de ruas, ou redução e reordenamento do tráfego e confiou-se no cumprimento da norma escrita, esquecendo-se as dinâmicas sociais e económicas”.

“Acreditar que é possível conjugar uma zona residencial com uma zona de diversão nocturna revela uma certa desadequação do processo de decisão. De igual forma, acreditar no esforço repressivo como instrumento sanador, no contexto específico da realidade que descrevemos, revela desconhecimento da dinâmica sociológica no que respeita à aplicação da lei em sociedades abertas”, é ainda salientado.

Para a autarquia lisboeta, “os custos políticos, decorrentes da intervenção em dinâmicas sociais estabelecidas, têm de ser equacionados e ainda assim interessa perceber que uma aplicação efectiva de medidas de restrição implicaria um policiamento de grande dimensão, com controlo porta a porta dos estabelecimentos, assim bem como um esforço de repressão da circulação na via pública, impossível de articular e de legalidade questionável, nomeadamente quanto a quaisquer medidas de restrição de circulação”.

Por isso, acrescenta, “apenas transformando os locais de diversão nocturna num microcosmos daquilo que é um estado policial, com um emprego maciço de meios (situação que requereria uma tal quantidade de recursos humanos que apenas como hipótese académica pode ser formulada) se conseguiria conjugar o funcionamento dos estabelecimentos depois da 20h com a aplicação de medidas de respeito pelo Regulamento do Ruído por parte daqueles que na via pública a estes se dirigem, destes provêem ou simplesmente permanecem na via pública na proximidade dos espaços de diversão. Não é simplesmente exequível”.

Por fim, salienta que “como o quadro constitucional vigente proíbe medidas de restrição da circulação fora dos estados de excepção, nada pode efectivamente obstar a que as pessoas circulem na via pública”.

Quem não gostou da resposta foram os cidadãos do Aqui Mora Gente. Numa publicação do grupo na sua página no Facebook, datada de 15 de Agosto, junto a uma foto tirada, aparentemente, na madrugada em que se vêem dezenas de jovens espalhados pela rua de São Paulo (Cais do Sodré), pelas 00h45, é afirmado que “as multidões” se mantêm pelas ruas “noite dentro”,

“A vida dos moradores destes prédios foi totalmente devassada com a abertura destes bares nos últimos meses, e as pessoas já estão a sofrer problemas de saúde graves”.

Nessa publicação dão ainda conta da resposta do vereador Ângelo Pereira, considerando que ela “é escandalosa pela incompetência demonstrada e total demissão de responsabilidades”.

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