Veja em directo os mergulhos de um robô no mar dos Açores. A partir deste domingo

Todos vamos poder seguir em tempo real, durante várias horas, os mergulhos de um robô dos Estados Unidos na região dos Açores e da Dorsal Média-Atlântica. A portuguesa Joana Xavier, que é uma das coordenadoras científicas desta campanha oceanográfica, vai estar a narrar os mergulhos – não só para os colegas cientistas, como para todos nós.

Veja em directo

Se tem curiosidade em saber como é o mergulho de um robô submarino até ao fundo do mar, agora é o momento para descobrir. A partir deste domingo, qualquer um de nós pode assistir online aos mergulhos do robô Deep Discoverer na região dos Açores e da Dorsal Média-Atlântica, a grande cordilheira submarina que corta o Atlântico de norte a sul, como se estivéssemos ao lado dos cientistas na sala de controlo do veículo. Poderemos ver as mesmas imagens de vídeo a que os cientistas estarão atentos nos ecrãs na sala de controlo à distância do veículo e ouvir a narração que fazem dessas imagens que chegam do fundo do mar e até as conversas e troca de opiniões científicas entre eles e entre os pilotos do veículo.

Os próximos sete mergulhos do Deep Discoverer – de 7 a 13 de Agosto – serão todos em águas açorianas, enquanto os restantes de um total de 21 mergulhos, até 28 de Agosto, decorrerão já em águas fora da zona económica exclusiva (ZEE) portuguesa.

E agora convidamo-lo a recostar-se e a maravilhar-se com oito horas diárias de transmissão submarina em directo. Começa por volta das 11h30 e vai até às 19h30 de Portugal continental (nos Açores é menos uma hora).

O espectáculo é transmitido em três câmaras. Na principal, estaremos a ver o que a câmara do Deep Discoverer, comandado à distância do navio Okeanos Explorer, estará a filmar mesmo à sua frente. Numa segunda câmara vemos o próprio Deep Discoverer, que está a ser filmado por outro veículo mais pequeno, o Seirios, a navegar a alguns metros dele. E na terceira câmara surgirá a sala de controlo no navio onde se comandam os dois veículos operados remotamente (ROV), com os painéis de controlo e diversa informação do mergulho em curso.

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O veículo Deep Discoverer a 1466 metros no monte submarino do Cachalote, nos Açores Programa Ocean Exploration/NOAA

Uma portuguesa a bordo

A bióloga Joana Xavier, do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (Ciimar) da Universidade do Porto, é uma das coordenadoras científicas desta etapa da campanha e vai estar na sala de controlo dos ROV a bordo do Okeanos Explorer, um navio da NOAA, a agência norte-americana para a atmosfera e o oceano.

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Scott France (o biólogo que co-chefiou a segunda etapa da campanha oceanográfica) e Arvind Shantharam (responsável pela recolha de amostras) na sala de controlo do navio Okeanos Explorer Programa Ocean Exploration/NOAA

Quando lhe telefonámos há uns dias, interrompeu o que fazia para contar como ia ser a sua aventura a bordo do Okeanos Explorer. Naquele instante, a especialista em ecossistemas marinhos vulneráveis e taxonomista de esponjas marinhas já participava, ainda que à distância, em terra, na campanha oceanográfica. Observava em tempo real, em imagens online transmitidas do navio via satélite, o mergulho que então decorria já em águas açorianas e, ligada a uma sala de chat, comentava com outros investigadores em vários locais do mundo o que iam vendo. Iam também falando com os coordenadores científicos daquela etapa da expedição, eles, sim, a bordo do Okeanos Explorer.

“Identificamos o que está a ser observado, solicitamos a recolha de determinadas amostras e dados adicionais”, acrescenta a bióloga portuguesa sobre o seu papel e o dos outros cientistas que trabalham em telepresença na campanha oceanográfica.

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O robô Deep Discoverer recolhe uma esponja a 1199 metros de profundidade no oitavo mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022 Programa Ocean Exploration/NOAA

“Estávamos a ver uma zona muito rochosa que terá muitos corais negros e esponjas de vidro. Parece uma comunidade bastante diversa”, especifica a bióloga que se encontrava no Ciimar, em Matosinhos, depois de avisar os colegas na sala de chat que ia fazer uma paragem.

E onde é isso? “É ao largo do monte submarino do Gigante, já dentro da ZEE dos Açores”, responde, referindo-se a um monte submarino entre as ilhas das Flores e do Faial onde em 2018 uma expedição portuguesa tinha descoberto, a 570 metros de profundidade, um novo um campo hidrotermal – local de fluidos quentes, gases e minerais vindos do interior da Terra e onde geralmente se encontram ecossistemas e formas de vida particulares.

A nova visita às redondezas do Gigante destinou-se a inventariar, na plataforma dos Açores, esponjas e corais de águas profundas. “A plataforma dos Açores é o ponto topográfico mais alto a nordeste da Dorsal Média-Atlântica e, antes deste mergulho, pouca ou nenhuma exploração in situ foi realizada abaixo dos mil metros”, lê-se no site da NOAA dedicado à campanha.

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Colónia de corais a 2570 metros de profundidade, observada no quarto mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022 Programa Ocean Exploration/NOAA

No dia em que falámos com Joana Xavier aquele era o último mergulho do robô submarino antes de uma curta paragem nos Açores, na cidade da Horta, para depois se iniciar a terceira e última etapa desta campanha, a Voyage to the Ridge 2022, aí já com a bióloga a bordo. Nesta etapa, que já saiu da Horta no sábado, a portuguesa partilha a coordenação científica da expedição com outra investigadora. Enquanto coordena a área da biologia, sendo a única portuguesa a bordo da equipa científica, a Deb Glickson cabe a coordenação na área da geologia (e a coordenação da expedição é de Kasey Cantwell, chefe de operações da Divisão de Expedições e Exploração da NOAA).

Na primeira parte da campanha, o navio partiu em meados de Maio de Newport (Rhode Island, EUA) e dirigiu-se até à Terra Nova. Fez o mapeamento da morfologia do fundo do mar em alta resolução, em particular na zona da fractura de Charlie-Gibbs, uma fractura na crosta terrestre que se estende desde o nordeste da Terra Nova ao sudoeste da Irlanda, numa faixa entre a Islândia e os Açores.

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Vida a 1749 metros de profundidade no sexto mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022 Programa Ocean Exploration/NOAA

Na segunda etapa é que entraram em acção o ROV Deep Discoverer e seu pequeno companheiro Seirios, para um total de dez mergulhos, na Dorsal Média-Atlântica e já na plataforma dos Açores. Esta dezena de mergulhos ficou completa com uma visita ao monte submarino do Cachalote (a 28 de Julho) e outra na zona do Gigante (29 de Julho).

Foi no monte do Cachalote que, além de comunidades de corais e esponjas, os cientistas se depararam com uns buracos de origem ainda inexplicável no fundo do mar. “Fizemos vários avistamentos de buracos misteriosos que já tínhamos visto no início da expedição”, lê-se no site da NOAA.

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A bióloga Joana Xavier junto ao navio Okeanos Explorer, da agência norte-americana para a atmosfera e o oceano DR

A colecção de imagens já reunidas da campanha mostra-nos um mundo tão desconhecido quanto deslumbrante e espicaça a curiosidade para o que nos poderá esperar na expedição que agora se inicia, com 21 mergulhos previstos. Por isso deixamos aqui algumas dessas imagens.

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Pepino-do-mar observado a 1920 metros, no décimo mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022, já em águas açorianas, perto do monte submarino do Gigante Programa Ocean Exploration/NOAA

Calendário dos mergulhos

Vamos às datas dos mergulhos, geralmente um por dia, e que todos podemos acompanhar por inteiro, em tempo real, no site da campanha. Nos dois primeiros o Deep Discoverer descerá até ao fundo do mar: na Crista João Valadão (7 de Agosto), uma estrutura geológica entre as ilhas Terceira e São Miguel; e a leste das Formigas (8 de Agosto). No terceiro (9 de Agosto) manter-se-á na coluna de água para observar o que aí existe, enquanto nos restantes quatro mergulhos ainda dentro da ZEE dos Açores voltará a ir até ao fundo do oceano. Assim, a 10 de Agosto é a vez de ir à Crista Ilha Azul, depois mergulhar-se-á a sul do Faial (11 de Agosto) e de seguida nos montes submarinos Cavala Beta (12 de Agosto) e Sarda Monte Alto (13 de Agosto).

A partir daqui a expedição dirigir-se-á para sul dos Açores e nos próximos 14 mergulhos estaremos já fora da ZEE portuguesa. Excepto a 17 de Agosto, dia de trânsito do navio, haverá sempre mergulhos. Entre eles, está uma visita ao campo hidrotermal Lost City (19 de Agosto) ou a procura de corais e esponjas (nos mergulhos a 20 e 21 de Agosto). Os últimos três mergulhos (entre 26 e 28 de Agosto) serão na zona de fractura Kane, na Dorsal Média-Atlântica, e a expedição desembarca a 2 de Setembro no Porto Rico.

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Peixe ósseo a 1495 metros observado no nono mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022, já em águas açorianas Ocean Exploration/NOAA

“Por eu ser portuguesa, vou alternar a narração dos mergulhos entre inglês e português”, antecipa Joana Xavier, dizendo que noutras campanhas do Okeanos Explorer costuma ser em inglês. “E vai ouvir-se a nossa conversa com os pilotos do ROV ou a comentarmos aquilo que a equipa em terra estiver a colocar no chat”. É como se as pessoas estivessem na sala de controlo do ROV.”

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Esponja de vidro a 2606 metros de profundidade vista no quarto mergulho da campanha Voyage to the Ridge 2022 Programa Ocean Exploration/NOAA

Para Joana Xavier, além da maior parte da equipa científica estar em terra em telepresença – o centro Okeanos da Universidade dos Açores até montou uma sala para reunir os seus investigadores ligados ao chat –, outro dos aspectos distintivos desta campanha foi ter sido planeada com os contributos da comunidade científica internacional, que começou por ser desafiada em 2018 a propor locais de grande interesse para a exploração científica, desde a biologia e geografia até à arqueologia. “Percebeu-se que havia muito interesse em toda a região da Dorsal Média-Atlântica e da plataforma dos Açores.”

E, por isso, aqui se está neste momento, para conhecer melhor a geologia e os ecossistemas, alguns bastante vulneráveis, desta região do planeta.

Por fim, a investigadora portuguesa destaca que os dados e amostras da campanha vão ser todos partilhados, em plataformas e repositórios públicos de acesso livre, 90 dias após a recolha. “Toda a comunidade científica pode solicitar os dados para fazer os seus trabalhos. É muito interessante, porque normalmente os dados pertencem à instituição que faz a campanha e vão sendo partilhados gradualmente, às vezes ao longo de vários anos.

E, agora, todos preparados para nos sintonizarmos em directo com o fundo do mar? Um, dois, três – splash.