Estamos a emitir 200 vezes mais CO2 que as grandes erupções que varreram a vida do planeta

O alerta vem de um estudo científico feito às erupções supervulcânicas de Kerguelen, no Índico.

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As inóspitas ilhas Kerguelen, um território ultramarino francês Francois LOCHON/Gamma-Rapho via Getty Images

Um enorme corpo de lava com três vezes o tamanho da França no sul do Oceano Índico parece demonstrar que os níveis de dióxido de carbono são fundamentais para evitar catástrofes climáticas que podem levar à extinção de grande parte das espécies do planeta. De acordo com um novo estudo publicado na revista PNAS-Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, a humanidade está a emitir dióxido a uma velocidade 200 vezes maior que as super-erupções pré-históricas que causaram extinções em massa.

“A terra tem mecanismos através dos quais o dióxido carbono é retirado da nossa atmosfera e oceanos e armazenado em rochas e no solo, mas estes processos são graduais ao longo de centenas de milhares de anos e só funcionam quando o nível de emissões é moderado”, afirma o líder da equipa de investigação, Qiang Jiang, da School of Earth and Planetary Sciences da Curtin University, na Austrália, citado pelo site da universidade.

“No entanto, assustadoramente, os nossos cálculos mostram que estamos actualmente a emitir dióxido de carbono 200 vezes mais rápido que nessas erupções super-vulcânicas que causaram as mais graves extinções em massa”, alertou

Ao estudar as erupções de Kerguelen, que em termos de área e volume são as segundas maiores desde que a vida complexa começou no planeta há 540 milhões anos, os cientistas descobriram que a velocidade e o volume de dióxido de carbono emitido teve influência no impacto que esses fenómenos tiveram no planeta.

Terá sido aparentemente por causa da quantidade de dióxido de carbono emitido que Kerguelen não provocou extinções em massa como outras actividades vulcânicas gigantescas, que libertaram emissões gigantescas de CO2 e de outros gases de efeito de estufa, e de uma maneira tão rápida, que fizeram o clima do planeta passar o seu ponto de inflexão, acidificando os oceanos e fazendo subir as temperaturas para níveis mortais.

“Apesar dos enormes volumes de lava libertados”, explica Qiang Jiang, o super-vulcão de Kerguelen “não se acreditava ter estado associado com nenhuma catástrofe ambiental”.

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Foi aliás por isso que a equipa de cientistas escolheu estudar o arquipélago de Kerguelen, actualmente um território ultramarino francês, parte das suas Terras Austrais e Antárcticas, e que é usado apenas como base científica. Lugar inóspito de 7215 km2 no meio do mar a perder de vista, cuja terra mais próxima, a Reunião, fica a mais de 3 mil km.

De acordo com Fred Jourdan, director do Western Australia Argon Isotope Facility da Curtin University, co-autor do estudo, a investigação revelou, através da análise a “uma série de rochas basálticas negras perfuradas no fundo do mar”, que Kerguelen esteve ligado a um fenómeno anóxico nos oceanos relativamente menor, isso numa altura em que à maioria dos nossos oceanos faltava oxigénio.

“Os novos dados de datação revelaram que as erupções de Kerguelen estavam, de facto, activas em todo o evento anóxico global de há 120 milhões de anos”, explicou o cientista ao site da universidade, mas, embora possam ter “degradado rapidamente o ambiente para os organismos marinhos, isso não levou a uma extinção em massa.”

“Estudámos partículas de magma presentes em cristais na lava para investigar a quantidade de CO2 libertado dos super-vulcões de Kerguelen e descobrimos que emitiram pelo menos cinco vezes menos CO2 e a um ritmo 30 vezes mais lento que as erupções vulcânicas que exterminaram formas de vidas por completo”, disse Hugo Olierook, outro dos co-autores do estudo, ao site da universidade.

Para termos uma extinção em massa pelo menos 75% das espécies tem de morrer num curto espaço de tempo em termos geológicos: uns poucos milhões de anos. Na história da terra, há cinco catástrofes do género, algumas varreram da face do planeta 90% das espécies. Com Kerguelen, apesar de uma erupção que durou 32 milhões de anos, isso não aconteceu.

Segundo um estudo publicado no jornal de Geologia há dois anos, a de Kerguelen foi mesmo a mais longa erupção super-vulcânica ininterrupta da história do planeta. E por muito, já que este tipo de erupções dura habitualmente 1 a 5 milhões de anos. A lava emitida criou um planalto enorme (do tamanho de Angola) que se manteve acima de água durante 80 milhões de anos, antes de começar a afundar há 20 milhões, estando actualmente a 1000 a 2000 metros abaixo do nível do mar.