Santos Silva recusa ser parcial em relação ao Chega, mas acusa o partido de discurso de ódio
Em resposta ao projecto de censura do Chega sobre o comportamento de Santos Silva, o presidente da Assembleia da República assegura que não trata os partidos de forma diferenciada, mas relembra a obrigação de cumprir a Constituição e o Regimento.
Foram já três as vezes em que o presidente da Assembleia da República (AR), Augusto Santos Silva, não aceitou projectos de lei do Chega por violarem a Constituição e pelo menos dois os momentos em que deixou reparos ao deputado André Ventura por fazer generalizações sobre comunidades de imigrantes — a última das quais motivou os deputados a abandonarem o plenário.
O partido acabou por apresentar um projecto de “censura ao comportamento do presidente da AR” esta semana, o que lhe valeu uma reunião com Marcelo Rebelo de Sousa, que decorre em Belém esta sexta-feira. Em resposta, numa entrevista dada ao Expresso, publicada também esta sexta-feira, Augusto Santos Silva garante não ser parcial em relação ao Chega, mas recusa ignorar “afloramentos de discursos de ódio" ou violações constitucionais.
“A minha conduta como presidente da AR não tem a ver com o partido A, B, C ou D. Tem a ver com o que os senhores deputados fazem ou dizem”, assegurou o presidente da Assembleia. E questionou: “A AR sairia prestigiada se o presidente admitisse projectos de lei inconstitucionais? A AR sairia prestigiada se o Presidente passasse a não exercer as suas responsabilidades de advertência quando os discursos se tornam injuriosos e ofensivos? A conduta de um Presidente da AR que ignora a Constituição e o Regimento prestigia-a? A minha resposta é não, não a prestigia”.
Para Santos Silva, cabe ao presidente da AR fazer “cumprir a Constituição e o Regimento” e “advertir aquele ou aquela” que tenha um “discurso ofensivo ou injurioso”. É assim que justifica o facto de não ter aceitado projectos de lei do Chega, como um que defendia a prisão perpétua, e de ter deixado reparos aos deputados do Chega durante os plenários, o que garante que tem feito “em relação a vários grupos parlamentares, não apenas a um”, apenas “em casos limite”.
"O presidente da AR deve ser imparcial em relação ao debate político que ocorre no Parlamento, mas não pode ser imparcial quanto aos valores constitucionais”, explicou, acrescentando que é preciso “traçar uma linha na areia” entre o discurso político “por mais rude, violento ou agreste que seja” e “o discurso de ódio”.
No que toca ao projecto de censura do Chega, no qual o partido acusa Santos Silva de “não pautar a sua conduta institucional com a imparcialidade e a isenção exigíveis ao exercício do cargo”, e que levou o presidente da AR a pedir um parecer à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o diploma, esclareceu que não está preocupado com o seu caso particular, mas sim com “o precedente que ele cria”.
Em relação uma eventual candidatura a Belém, Santos Silva reiterou que nem confirma nem rejeita a possibilidade de se colocar na corrida para a presidência. “Não estou disposto a renunciar a nenhum dos meus direitos”, declarou.
Questionado sobre se o desafio será maior para o próximo presidente, depois dos mandatos de Marcelo, a segunda figura do Estado afirmou que “o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa aproximou de tal forma a presidência e as pessoas que facilitou muito a vida a quem lhe vier a suceder”.